Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




sexta-feira, 23 de novembro de 2012

ESCOLA BÁSICA PROFESSORA ADRIANA WEINGARTNER - OMISSÃO DO MUNICÍPIO DE PALHOÇA - RISCO AOS SEUS ALUNOS E PROFISSIONAIS PELA GRAVE SITUAÇÃO DA ESCOLA - AJUIZADA AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDOS DE COMINAÇÃO DE MULTAS PESSOAIS AO PREFEITO E À SECRETÁRIA DE EDUCAÇÃO E DE BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS, NO CASO DE DESCUMPRIMENTO DA LIMINAR




Segue a íntegra da petição inicial da Ação Civil Pública.

EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAMÍLIA, ÓRFÃOS, SUCESSÕES, INFÂNCIA E JUVENTUDE DE PALHOÇA/SC.   

URGENTE

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por intermédio de seu Órgão de Execução, com fundamento nos artigos 6º, 127, caput, 129, incisos II e III, 205, 206, inciso VII, 211, § 2º, e 227, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; nos artigos 3º, 4º, 53, 148, inciso IV, 201, incisos V e VIII, 209, 210, inciso I, e 213, todos da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente); na Lei n. 9.394/96 e demais dispositivos pertinentes, vem propor a presente


AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE LIMINAR,


em desfavor do MUNICÍPIO DE PALHOÇA, pessoa jurídica de direito público, CNPJ 82.892.316/0001-08, com endereço na Avenida Hilza Terezinha Pagani, n. 289, Parque Residencial Pagani, Palhoça/SC, por seu representante legal, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:


I - DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO:

Extrai-se da Lei n. 8.069/90 que é competente o Juízo da Infância e Juventude para julgar ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, conforme se depreende da leitura do artigo 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Infere-se ainda da lei antes mencionada que as ações relacionadas à criança e ao adolescente serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo Juízo terá competência absoluta para processar a causa (artigo 209 da Lei n. 8.069/90).

Paralelamente, o Código de Processo Civil (art. 100, inciso IV, alínea 'd'), dispõe taxativamente que é competente o foro do lugar onde a obrigação deve ser satisfeita para a ação em que se lhe exigir o cumprimento.

Portanto, como a presente Ação Civil Pública tem por escopo salvaguardar o direito à educação de crianças e adolescentes residentes neste Município de Palhoça/SC, a fixação da competência deve ocorrer neste foro judicial.


II – DA LEGITIMIDADE ATIVA:

Da legislação constitucional e infraconstitucional deflui a legitimação do Ministério Público para a propositura da ação civil pública na defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos.

O artigo 127, caput, da Constituição Federal prescreve que: 

"O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis". 

Ademais, o artigo 129, incisos II e III, da Constituição de 1988 dispõe:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: 
[...] 
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

E no tocante à legitimidade do Ministério Público em ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais, coletivos ou difusos de crianças e adolescentes, claro é o artigo 201 da Lei n. 8.069/90, que enuncia:

Art. 201. Compete ao Ministério Público: 
[...]
V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal; 
[...]
VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis.

Não se olvida, ainda, que a Lei n. 7.347/85, em seu art. 5º, autoriza o Ministério Público a propor ações destinadas à tutela desses interesses em juízo. 

Acerca da legitimidade do Ministério Público, Hugo Nigro Mazzilli leciona que:

[...] Diz o art. 127, caput, da Constituição que o Ministério Público está encarregado da defesa dos interesses sociais e dos individuais indisponíveis. Daí se infere que, quanto aos interesses de caráter social, o Ministério Público os defende todos, e, quanto aos individuais, apenas se indisponíveis. À primeira vista, poderíamos ser tentados a crer que o Ministério Público não poderia defender interesses individuais homogêneos, quando disponíveis; assim, vez ou outra se vê na jurisprudência algum julgado a dizer que o Ministério Público só poderia defender interesses individuais homogêneos se indisponíveis. Essa, porém, é leitura apressada do dispositivo constitucional. Sem dúvida, há absoluta compatibilidade em que o Ministério Público defenda interesses individuais homogêneos, quando indisponíveis. Mas quanto aos interesses individuais homogêneos disponíveis, o Ministério Público também os poderá defender, quando tenham suficiente expressão ou abrangência social, o que lhes conferirá a natureza de interesse social [...] (A defesa dos interesses difusos em juízo. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 107/108).

De mais a mais, sobre o tema, já se decidiu:

CONSTITUCIONAL - REEXAME NECESSÁRIO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA AFORADA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO EM DEFESA DE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL - TRANSPORTE ESCOLAR GRATUITO - INSTRUMENTO ASSECURATÓRIO DO ENSINO FUNDAMENTAL - NECESSIDADE DE MELHORIA DA ESTRADA QUE DÁ ACESSO DOS MENORES À ESCOLA - DEVER DO MUNICÍPIO DE PRESTAR O ACESSO À EDUCAÇÃO - MULTA DIÁRIA - VALOR ADEQUADO.
"'Ex vi' do art. 201, V, do Estatuto da Criança e do Adolescente, o Ministério Público possui legitimidade para promover ação civil pública em defesa de interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência. É que 'tratando-se de interesses indisponíveis de crianças ou adolescentes (ainda que individuais), e mesmo de interesses coletivos ou difusos relacionados com a infância e a juventude - sua defesa sempre convirá à coletividade como um todo' (MAZZILLI, Hugo de Nigro)" (Rel. Des. Francisco Oliveira Filho).
O direito à educação é um dos mais sagrados direitos sociais, porquanto a própria Constituição lhe confere o status de direito público subjetivo, impondo à Administração Pública o encargo de propiciar, com políticas sociais concretas e efetivas, o amplo acesso aos estabelecimentos de ensino.
É obrigação governamental realizar a melhoria do trajeto da estrada que dá acesso às escolas frequentadas pelos menores que necessitam de transporte escolar gratuito, para que, então, possa ser oferecido de forma eficaz e segura o transporte escolar às respectivas crianças e adolescentes e, assegurar, desta forma, o direito à educação.
O valor da multa aplicada na sentença para o caso de não cumprimento da decisão deve ser fixado de maneira a que "o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixado pelo juiz" (Nelson Nery Júnior), sem todavia servir como instrumento de enriquecimento desarrazoado da parte contrária. (TJSC - Processo: 2011.099343-1 (Acórdão). Relator: Jaime Ramos. Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. Julgado em: 31/05/2012. Classe: Reexame Necessário) (sem grifo no original).

Assim, denota-se que o Ministério Público detém legitimidade para propor esta ação.


III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA:

Por outro lado, inegável que o Município de Palhoça possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda.

Extrai-se do § 2º do artigo 211 da Constituição Federal que:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. 
[...]
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

Ademais, a Lei n. 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) dispõe que:

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. 

Logo, conclui-se que o Município aludido possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente Ação Civil Pública, inclusive porque a Escola Básica Professora Adriana Weingartner, objeto dessa demanda, é municipal.


IV - DOS FATOS:

Este Órgão de Execução do Ministério Público instaurou o Inquérito Civil Público n. 06.2011.004381-0, destinado a apurar irregularidades na Escola Básica Professora Adriana Weingartner, localizada na Rua Germano Spricigo, s/n., Bairro Caminho Novo, Palhoça/SC (Portaria - fls. 2/3).

No escopo de elucidar os fatos, requisitou-se vistoria ao Corpo de Bombeiros Militar, à Vigilância Sanitária e ao Conselho Municipal de Educação, todos deste Município (fls. 8/13 e 20/25).

Em seguida, aportou neste feito o Ofício n. 90/SAT/2ª/10ºBBM, oriundo do Corpo de Bombeiros Militar de Palhoça, instruído com relatório de indeferimento de vistoria, uma vez que a escola acima mencionada encontra-se em situação irregular por não possuir projeto preventivo contra incêndio, atestado para habite-se e alvará de funcionamento do Corpo de Bombeiros (fls. 28/30).

Ademais, extrai-se da vistoria do Corpo de Bombeiros que o estabelecimento de ensino do caso em tela precisa, para funcionar adequadamente e com segurança providenciar projeto preventivo contra incêndio, atestado para habite-se e alvará de funcionamento; instalar 10 (dez) extintores do tipo PQS 4kg (distribuídos nos cinco blocos); providenciar sinalização para os extintores, contendo seta vermelha com bordas amarelas sobre os extintores e círculo com as inscrições "Proibido depositar materiais" sob os extintores; providenciar adequação e manutenção da central de gás central canalizado (estrado de madeira); providenciar a instalação de aberturas de ventilação permanentes nas dependências que possuem aparelhos de queima; substituir a mangueira de GLP; instalar sistema preventivo por extintores; instalar sinalização para abandono do local; instalar sistema de iluminação de emergência; substituir o madeiramento da escola, eliminando os cupins, fixando corretamente as telhas e eliminando as goteiras e providenciar que o portão que dá acesso ao estabelecimento de ensino abra no sentido do fluxo das crianças.

Na sequência, juntou-se nos autos o Ofício n. 028/2011, proveniente do Conselho Municipal de Educação (COMED), noticiando que a escola acima referida atende alunos entre cinco e quatorze anos de idade e encontra-se em estado precário (fls. 48/51).

Registre-se que o expediente do COMED foi instruído com as fotos de fls. 52/93, evidenciando que a escola aludida encontra-se completamente deteriorada.

De mais a mais, infere-se do ofício do COMED que o Município deve providenciar várias melhorias no colégio do vertente caso, como eliminar os cupins do teto e eliminar as rachaduras das paredes da cozinha, substituir ou consertar o fogão enferrujado, providenciar armários, com portas, para alocar os utensílios da cozinha, bem como adquirir pratos, canecas e talheres em quantidade suficiente para os alunos, adquirir liquidificador para a escola, eliminar as infiltrações da cozinha, providenciar que a cozinha possua ventilação adequada, consertar a janela da sala dos professores e garantir a segurança desta por meio da colocação de grades, substituir o piso, eliminar os buracos das paredes e consertar o teto da escola, suprimindo as goteiras, adquirir cadeiras próprias para a sala de informática, consertar a parte elétrica da escola, providenciar que as salas da escola tenham ventilação e luminosidade adequadas, adquirir mobiliário novo para as salas de aula (cadeiras e mesas para os alunos e professores), colocar fechaduras em todas as portas, colocar vidros em todas as janelas, providenciar a limpeza constante do pátio da escola, reparar as paredes da biblioteca e adquirir mobiliário adequado para esta, adquirir livros e mapas novos para o uso dos alunos, providenciar armários, mesas e cadeiras para a sala de música, adquirir lousas novas, colocar calhas de chuva na escola, reparar todos os banheiros, suprimindo os vazamentos, adquirindo vasos sanitários novos e substituindo o piso e colocar piso antiderrapante no ambiente escolar.  

Após, a Vigilância Sanitária de Palhoça encaminhou sua vistoria, por meio do Ofício n. 024/2012, da qual se extrai que o estabelecimento de ensino deste feito atende duzentos alunos e encontra-se irregular, pois não possui alvará sanitário (fls. 94/98).

Aliás, os fiscais da Vigilância em Saúde informaram que para o correto funcionamento da escola deve ser providenciado alvará sanitário, a colocação de telas nas aberturas da cozinha, lavatório exclusivo para os manipuladores de alimentos, bem como deve o Município substituir a fiação, suprimindo a fiação exposta, e providenciar iluminação adequada, providenciar ralos adequados, colocar porta na cozinha, a fim de que as crianças não tenham acesso à área de manipulação de alimentos, substituir os azulejos deteriorados das paredes e eliminar as goteiras do teto da cozinha, adquirir mesa e armários para a cozinha, construir espaço adequado destinado ao refeitório, consertar as descargas dos banheiros, providenciar o funcionamento de todos os banheiros, suprimindo o mau cheiro e os vazamentos, substituir os ralos quebrados dos banheiros, adquirir saco coletor para as lixeiras, providenciar papel toalha e sabonete líquido para os banheiros, substituir as torneiras quebradas, providenciar a colocação de piso íntegro, lavável, contínuo e antiderrapante em todo o colégio, reparar todas as paredes e o teto do estabelecimento de ensino, substituir as portas deterioradas por portas novas com maçanetas, substituir as janelas deterioradas, providenciar iluminação adequada em todo o ambiente escolar, reparar a fossa do estabelecimento e retirar todo o entulho do pátio do colégio, adquirir mobiliário novo para as salas de aula, reparar as paredes e o teto das salas de aula, eliminando os vazamentos e as infiltrações, construir rampas de acesso às salas de aula adequadas, reparar a fiação das salas de aula e adquirir quadros novos, providenciar espaço adequado para funcionamento de biblioteca, providenciar cadeiras adequadas e em perfeitas condições de uso para a sala de vídeo, providenciar climatização adequada para a sala dos computadores, providenciar a colocação de telas nas aberturas do depósito de alimentos, eliminar a ferrugem das prateleiras do depósito de alimentos, adquirir mais um freezer para o correto acondicionamento dos alimentos, providenciar cobertura adequada para a área de recreação interna, consertar o portão do estabelecimento, reparar a quadra de esportes, eliminando a vegetação desta e consertar o corrimão da escada que dá acesso à quadra de esportes.

Logo, dos laudos técnicos acima, denota-se que a Escola Básica Professora Adriana Weingartner apresenta-se sucateada, haja vista possuir  estrutura física precária e em péssima condição, necessitando de uma reforma geral e de ampliação, a fim de se adequar às normas do Corpo de Bombeiros Militar e da Vigilância Sanitária, garantindo-se, assim, salubridade e segurança às crianças, adolescentes e aos profissionais de tal estabelecimento educacional.

Sobreleva ressaltar que a reforma e a ampliação imprescindíveis para fornecer aos estudantes palhocenses ensino de qualidade está prevista no cronograma do Município de Palhoça para este ano de 2012, conforme retira-se do documento de fl. 105, encaminhado pela Secretária Municipal de Educação e Cultura de Palhoça a esta Promotoria de Justiça. Porém, tal reforma não ocorreu, apesar da vinculação de recursos para esse desiderato.

E atente-se que neste mês de novembro de 2012, aportou neste Órgão de Execução do Ministério Público outro ofício da Vigilância Sanitária de Palhoça, noticiando que foi realizada nova diligência no colégio em tela, na qual se observou que as mesmas e precárias instalações encontram-se inalteradas, não apresentando a Escola Adriana Weingartner condições mínimas para funcionamento, o que convergiu na autuação do estabelecimento de ensino, por meio do Auto de Intimação n. 008312 (fls. 106/113).

Em razão da precária situação acima registrada, que expõe os alunos, professores e demais funcionários a constante situação de risco, este Órgão de Execução propôs a celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), tendo como compromissário o Município de Palhoça (fls. 114/128).

Todavia, na data aprazada para a celebração do ajuste, os representantes do Município de Palhoça informaram que não possuíam condições de celebrar o acordo extrajudicial (Termo de Audiência – fl. 129). 

Assim, percebe-se o evidente descaso do Município de Palhoça no que se refere à educação das crianças e dos adolescentes residentes nesta Comarca e que estudam na escola referida.

Portanto, os infantes palhocenses estão tendo seus direitos, constitucionalmente assegurados, violados diariamente, e o Município de Palhoça, ao não fornecer estrutura adequada na Escola Básica Adriana Weingartner está prejudicando, dia a dia, a vida dessas pessoas em desenvolvimento.

Dessa forma, diante da não celebração do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC), este Órgão de Execução não tem outra alternativa senão a de buscar a tutela jurisdicional para salvaguardar os interesses dos estudantes residentes em Palhoça e que necessitam, com urgência, de educação de qualidade em ambiente adequado e seguro.

Ressalte-se que os estudantes, professores e demais funcionários estão diariamente expostos à situações de risco devida a falta de estrutura e de segurança no estabelecimento de ensino referido, haja vista as condições físicas precárias e irregulares das edificações no tocante à ausência de reparos e ampliações na estrutura física, ausência de sistema preventivo de incêndio e ausência de adequação do ambiente às normas de acessibilidade e sanitárias. 

Isso decorre da letargia do Município de Palhoça na manutenção da Escola Básica Professora Adriana Weingartner. Logo, muitas crianças, adolescentes e funcionários estão sofrendo prejuízos incalculáveis, inseridos em uma UTI da exclusão social, o que pode repercutir pelo resto de suas vidas e que obviamente vem de encontro aos ditames da legislação de garantias em vigência.

É oportuno destacar que são estas crianças e adolescentes que a própria Constituição Federal denomina "sujeito de direitos". São eles a "prioridade absoluta constitucional", que estão sendo vítimas da omissão do Município demandado.

Destarte, é irrefutável que o Município requerido deve reestruturar a Escola Básica Professora Adriana Weingartner, a fim de promover um ambiente propício de educação apto a amparar estas pessoas em desenvolvimento.

É essencial mencionar que o Ministério Público procurou incessantemente o acordo extrajudicial, com o intuito de sensibilizar e estimular o Município acerca de sua obrigação.

Porém, o Município efetivamente não demonstrou interesse no comprometimento com as centenas de crianças e adolescentes que não estão recebendo educação de qualidade.

E nem se alegue que o Município demandado não detém numerário para custear a obra do estabelecimento de ensino do vertente caso, pois é notório que destinou enorme quantia para financiar eventos de grande porte nesta Comarca, bem como destina valores para asfaltar ruas e para publicidade, por exemplo.

Assim, se possui verba para custear as despesas acima, não há dúvida de que também possui numerário para fins de contemplar os interesses da infância e juventude, que são de prioridade absoluta, por força de comando constitucional. 

Portanto, imprescindível que haja previsão orçamentária específica e suficiente para o atendimento dos estudantes desta urbe, devendo ser, em último caso, ajustada a destinação dos valores eventualmente previstos para outros serviços ou obras para a reforma e ampliação da escola deste caso, tudo em reverência ao princípio da prioridade absoluta.

Atente-se ainda que com políticas públicas que não priorizam o ensino não estamos comprometendo tão somente o desenvolvimento de nossas crianças e futuros cidadãos, o que já seria suficiente para ensejar medidas urgentes nesse campo, mas podendo atingir toda uma estrutura familiar, contribuindo para o aumento da pobreza e dificultando cada vez mais a pretendida erradicação do trabalho e da mendicância infantil, entre outros efeitos nocivos. Tais constatações, aliás, não demandam muitos esforços para serem percebidas dia a dia nesse Juízo da Infância e Juventude, diante do crescente número de processos envolvendo tais situações de vulnerabilidade de crianças e adolescentes.

A omissão, portanto, é cristalina e não deve prosperar.

Por tais razões, não restam alternativas senão a de buscar a tutela jurisdicional, com o intuito de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais, obrigando o Município de Palhoça a agir no sentido de afastar os estudantes palhocenses da grave situação de risco vivenciada e de prestar a eles ensino de qualidade.


V - DO DIREITO:

A Constituição da República Federativa de 1988 estabelece em seu art. 6º que:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Ademais, a fim de promover a educação, a Lei Maior assevera que:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. 

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
VII - garantia de padrão de qualidade.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

De mais a mais, a redação do art. 211, § 2º, da Constituição Federal é clara ao dispor que:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. 
[...]
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente afirma:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
[...]
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; 
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho [...].

Aliás, a Lei n. 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) dispõe que:

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
IX - garantia de padrão de qualidade;

Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:
[...]
IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
[...]
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.

Logo, denota-se que o Brasil possui uma avançada legislação relacionada às crianças, aos adolescentes e à educação, pois existem os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta, mas que, em situações como a do vertente caso são lamentavelmente menosprezados.

E, acerca da legislação acima citada, insta transcrever o entendimento de Válter Kenji Ishida:

"Pode-se falar conforme acima aludido na existência da doutrina da proteção integral. Para assegurar a mesma, formularam-se princípios menoristas, destacando-se o da prioridade absoluta, o do melhor interesse e o da municipalização [...] o princípio da prioridade absoluta possui o status constitucional, com a previsão no art. 227 da Carta Magna. A prioridade absoluta significa primazia, destaque em todas as esferas de interesse, incluindo a esfera judicial, extrajudicial ou administrativa". (Estatuto da Criança e do Adolescente. 12. Ed. São Paulo: Atlas, 2010. págs. 6/7)

Nesse diapasão, necessário se faz também mencionar as lições de Munir Cury, et al, acerca dos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente:

"Não se trata, neste caso, de palavras inúteis, como às vezes se diz das solenes declarações constitucionais. As regras ali enunciadas colocam também algumas normas de caráter imediatamente preceptivo, isto é, às quais todos devem imediata obediência, pois são suficientemente precisas; mas têm importância decisiva também por seu aspecto programático, isto é, aquele que se refere às normas concretas para implementação do programa". (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 10. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. pág. 35) 

Ademais, no que se refere ao direito à educação, previsto na Magna Carta e no Estatuto da Criança e do Adolescente, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, et al, aduz:

"Conceitua-se a educação como sendo o processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social. 
O processo educacional visa a integral formação da criança e do adolescente, buscando seu desenvolvimento, seu preparo para o pleno exercício da cidadania e para ingresso no mercado de trabalho (art. 205, CF).
É direito fundamental que permite a instrumentalização dos demais, pois sem conhecimento não há o implemento universal dos direitos fundamentais. A ignorância leva a uma passividade generalizada que impede questionamentos, assegura a manutenção de velhos sistemas violadores das normas que valorizam o ser humano e impede o crescimento do ser humano e o consequente amadurecimento da nação".  (Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 49). 

Dessa forma, verifica-se que no sistema legal brasileiro estabeleceu-se a primazia em favor das crianças e adolescentes em todas as esferas de interesses.

E como a previsão de absoluta prioridade decorre da Constituição e da Lei Infraconstitucional, não há espaço para ponderações, devendo ser assegurados aos infantes todos os seus direitos elencados na legislação pátria, levando-se em consideração a condição de pessoas em desenvolvimento.

Torna-se claro, assim, o caráter preventivo da doutrina da proteção integral, a qual deve ser efetivada para salvaguardar as crianças e os adolescentes. Do contrário, o texto legal será letra morta.

Consequentemente, caso o Município não observe esses direitos fundamentais, como ocorre no presente caso, torna-se violador dos direitos preconizados tanto na Constituição, como no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Cabe destacar que direitos fundamentais são direitos para os quais não se pode admitir desculpas, como dificuldades financeiras. Eles devem ser resguardados independente de qualquer situação.

Deste modo, é dever e obrigação do Município de Palhoça cumprir os direitos fundamentais dos estudantes palhocenses. 

E não se alegue que o estabelecimento de políticas sociais derivadas de normas programáticas situa-se no âmbito do poder discricionário do administrador público, sendo vedado ao Poder Judiciário interferir nos critérios de conveniência e oportunidade.

A autuação do Poder Judiciário nestes casos não interfere de modo algum na independência dos poderes, levando-se em conta a questão dos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente.

Ademais, sabe-se que, na ocorrência de omissão por parte do Poder Público no cumprimento de norma constitucional elevada à categoria de norma fundamental, compete sim ao Poder Judiciário aplicar o direito ao caso concreto.

Diante desse contexto, não há que se falar em desrespeito à autonomia do Poder Executivo por parte do Judiciário. Comungar de tal raciocínio significa simplesmente negar a existência de uma função estatal em face da outra, o que é de todo descabido.

Muito pelo contrário, a espécie em análise não consagra qualquer tipo de desrespeito às autonomias, mas afirma a função jurisdicional em relação a função executiva mal exercida ou não exercida, o que é absolutamente corriqueiro em um Estado Democrático de Direito.

Sobre isso, o Supremo Tribunal Federal decidiu:

[...] DEVER DE PROTEÇÃO INTEGRAL À INFÂNCIA E À JUVENTUDE. OBRIGAÇÃO  CONSTITUCIONAL QUE SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO [...] CONFIGURAÇÃO, NO CASO, DE TÍPICA HIPÓTESE DE OMISSÃO INCONSTITUCIONAL IMPUTÁVEL AO MUNICÍPIO. DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO PROVOCADO POR INÉRCIA ESTATAL (RTJ 183/818-819). COMPORTAMENTO QUE TRANSGRIDE A AUTORIDADE DA LEI FUNDAMENTAL (RTJ 185/794-796). IMPOSSIBILIDADE DE INVOCAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DA CLÁUSULA DA RESERVA DO POSSÍVEL SEMPRE QUE PUDER RESULTAR, DE SUA APLICAÇÃO, COMPROMETIMENTO DO NÚCLEO BÁSICO QUE QUALIFICA O MÍNIMO EXISTENCIAL (RTJ 200/191- -197). CARÁTER COGENTE E VINCULANTE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, INCLUSIVE DAQUELAS DE CONTEÚDO PROGRAMÁTICO, QUE VEICULAM DIRETRIZES DE POLÍTICAS PÚBLICAS. PLENA LEGITIMIDADE JURÍDICA DO CONTROLE DAS OMISSÕES ESTATAIS PELO PODER JUDICIÁRIO. A COLMATAÇÃO DE OMISSÕES INCONSTITUCIONAIS COMO NECESSIDADE INSTITUCIONAL FUNDADA EM COMPORTAMENTO AFIRMATIVO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS E DE QUE RESULTA UMA POSITIVA CRIAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO DIREITO. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DELINEADAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (RTJ 174/687 – RTJ  175/1212-1213 – RTJ 199/1219- -1220). RECURSO EXTRAORDINÁRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL CONHECIDO E PROVIDO. (STF - RE 482611 / SC - SANTA CATARINA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 23/03/2010) (sem grifo no original)

E, conforme afirmado alhures, é possível deduzir do caso em tela que não deve a omissão do administrador prosperar, devendo o Município cumprir a legislação protetiva, no intuito de evitar prejuízo aos sujeitos do futuro do nosso país.

E, no tocante à educação, é a judiciosa jurisprudência:

"[...] A Constituição da República destaca a educação como direito social (art. 6º), cujos meios de acesso devem ser assegurados indistintamente a todos pelo estado (arts. 23, V, e 205). Também determina a Carta Magna que seja garantido um "padrão de qualidade" no cumprimento desse dever (art. 206, VII; repetido no art. 3º, IX, da Lei 9.394/96), e que o não-oferecimento do ensino obrigatório - direito público subjetivo - pelo poder público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade da autoridade competente (art. 208, §§ 1º e 2º; reiterado no art. 54, §§ 1º e 2º, da Lei 8.069/90). Ainda impõe, no caput de seu art. 227, o dever à família, à sociedade e ao estado de resguardar uma gama de direitos fundamentais à criança, ao adolescente e ao jovem, entre os quais a educação, "com absoluta prioridade" (conforme também consta no art. 4º do ECA).
Portanto, não está ao alvedrio da conveniência e oportunidade do administrador eleger eventuais metas estatais secundárias em detrimento da oferta a contento de ensino público obrigatório aos cidadãos, notadamente àqueles em idade escolar, cabendo ao Judiciário, se instado a tanto e caso constatadas flagrantes irregularidades e/ou uma ineficiência injustificável nesse âmbito, extirpar concretamente as manifestas violações à ordem jurídica, inclusive mediante atos de coerção [...] " (TJSC -Processo: 2008.036149-0 (Acórdão). Relator: Rodrigo Collaço. Orgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. Julgado em: 10/11/2011) (sem grifo no original).

Assim, conclui-se que caso o gestor público seja relapso e atue com descaso no que se refere aos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente, não só permite-se, como também impõe-se a pronta atuação deste Órgão do Ministério Público, assim como do Poder Judiciário, no objetivo de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais.


VI – DA NECESSIDADE DA LIMINAR:

A omissão do Município demandado no que tange às condições da Escola Básica Adriana Weingartner deve cessar imediatamente, exigindo que esta pretensão seja deferida desde o recebimento da presente inicial.

De outro modo, a postergação do problema vilipendia diariamente os direitos de 200 (duzentos) estudantes desta Comarca.

Atente-se que não só a Lei n. 7.347/85, em seu artigo 12, caput, como também o artigo 213, § 1º, da Lei n. 8.069/90, autorizam, mediante a relevância do fundamento da demanda e do justificado receio da ineficácia do provimento final, a concessão de liminar para conceder previamente o direito que se pretende resguardar, senão veja-se:

Do artigo 12, caput, da Lei n. 7.347/85, tem-se que "poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo."

E do artigo 213, insculpido na Lei n. 8.069/90, retira-se que:

Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. 
§ 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citando o réu. 
§ 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito. 

Sobreleva ressaltar que a verossimilhança, requisito necessário à outorga da decisão liminar, encontra respaldo fático nos próprios fundamentos já narrados, vez que o direito pátrio impõe o direito à educação como fundamental e necessário para a instrumentalização dos demais direitos.

De mais a mais, é por meio da educação que a criança e o adolescente são preparados para o pleno exercício da cidadania.

Ademais, extrai-se da documentação juntada nesta exordial que o estabelecimento de ensino deste caso "encontra-se em situação irregular" (fl. 29) e não apresenta "condições mínimas para funcionamento" (fl. 106).

Registre-se que o justificado receio de ineficácia do provimento final é decorrente não só das perdas irreparáveis acarretadas pela má qualidade do ensino ministrado, haja vista a ausência de estrutura adequada, mas, também, da possibilidade de que um dos alunos tenha comprometida a sua integridade física, uma vez que o teto ou uma parede do estabelecimento de ensino pode cair, haja vista a presença de infiltrações, rachaduras e cupins, ou mesmo a escola pode incendiar e não ter como controlar o fogo por não possuir no estabelecimento os equipamentos preventivos de incêndio necessários para eliminar eventual sinistro, ou, ainda, eventual estudante pode adquirir moléstia em razão do contato com alimentos ou diante do uso de materiais que são manipulados em desacordo com as normas da vigilância sanitária.

Fica assim demonstrada a plausibilidade do direito invocado e o fundado receio de ineficácia do provimento final, motivo pelo qual a concessão da liminar é medida que se impõe.

E, como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que seja cominada multa diária para o caso do Município não providenciar a reforma e a ampliação da escola deste caso.


VII – DO "CONTEMPT OF COURT" E O BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS:

Sabe-se que o agente do Estado atua em nome do ente público e é diretamente responsável pela administração.

É sabido também que o ente estatal em si não possui vida, uma vez que é dirigido por gestores.

Assim, o Município possui comandante que assume a responsabilidade, no período do mandato, de administrar nos termos das leis e de respeitar eventual decisão judicial prolatada em desfavor do ente público. 

Todavia, não raras vezes aquele que ocupa o cargo público, mesmo conhecedor da existência de multa fixada contra o ente público para o caso de descumprimento de decisão judicial, age com irresponsável descaso frente à liminar concedida, pois sabe que os valores sairão dos cofres públicos, ou seja, recai sobre os cidadãos, já que o administrador público não se sensibiliza com o prejuízo e continua a agir ilegalmente.

A imposição de multa para pagamento ao Município é medida legal, que visa ao cumprimento da decisão. Contudo, como o valor da multa não é suportado pelo agente público, mas sim pelo ente municipal, esta circunstância tem gerado o desrespeito das decisões judiciais, além de duplo prejuízo para a população: primeiro porque o agente público não cumpre com suas obrigações; segundo porque o pagamento da multa é feito com dinheiro público.

Diante do descaso referido, o legislador pretendendo dar plena efetividade aos provimentos judiciais relativos às obrigações de fazer, fez constar no § 5º do artigo 461 do Código de Processo Civil que:

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

A partir daí novo entendimento doutrinário e jurisprudencial tem sido aplicado e tem permitido melhores resultados, com maior respeito às decisões proferidas.

Inúmeras decisões continuam a fixar a multa, com a diferença de que a mesma deve ser suportada pelo próprio agente público, pois é totalmente descabido ver a multa recair sobre a pessoa jurídica, quando esta depende da manifestação de vontade da pessoa física que exerce a função pública.

Nesse sentido, necessário se faz mencionar o entendimento de Luiz Guilherme Marioni, que leciona:

“Se a pessoa jurídica exterioriza a sua vontade por meio da autoridade pública, é lógico que a multa somente pode lograr o seu objetivo se for imposta diretamente a agente capaz de dar atendimento à decisão jurisdicional”.
"Não há procedência no argumento de que a autoridade pública não pode ser obrigada a pagar a multa derivada de ação em que foi parte apenas a pessoa jurídica. É que essa multa somente poderá ser imposta se a autoridade pública, que exterioriza a vontade da pessoa jurídica, não der atendimento à decisão. Note-se que a multa somente pode ser exigida da própria autoridade que tinha capacidade para atender à decisão – e não a cumpriu. A tese que sustenta que a multa não pode recair sobre a autoridade somente poderia ser aceita se partisse da premissa – completamente absurda – de que o Poder Público pode descumprir decisão jurisdicional em nome do interesse público." (Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: RT, 2004, p. 661-662)

Ademais, no dizer de Ada Pelegrini Grinover, “Contempt of Court” significa:

 “a prática de qualquer ato que tenda a ofender um juiz ou tribunal na administração da justiça, ou a diminuir sua autoridade ou dignidade, incluindo a desobediência a uma ordem” (GRINOVER, Ada Pelegrini, Abuso do processo e resistência às ordens judiciárias: o contempt of court, Marcha, pp 62/69, especialmente, p. 68, ano 2000).

Portanto, objetivando a credibilidade do Poder Judiciário, este instituto deve ser aplicado sempre que decisões judiciais forem desrespeitadas.

Acerca da aplicação da multa em desfavor do gestor, o egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em decisão recente, assim decidiu:

[...] é válido ressaltar que a aplicação de multa no caso de descumprimento da determinação judicial é cabível, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público:
[...]
MULTA DIÁRIA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO FIXADA NA SENTENÇA - FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. As astreintes podem ser fixadas pelo juiz de ofício, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público (Fazenda Estadual), que ficará obrigada a suportá-las casos não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado (Resp. n. 201.378, Min. Fernando Gonçalves). (TJSC - AP n. 2006.000886-0, de Mafra, Rel.
Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. em 11/09/2007). 
Com efeito, considerando a gravidade que pode gerar o descumprimento da decisão agravada, a multa fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), sendo R$ 500,00 (quinhentos reais) para cada secretário é razoável. (TJSC - 2012.015293-5   Agravo de Instrumento. Órgão Julgador CÂMARA CIVIL ESPECIAL) (grifo nosso).  

É essencial aqui a responsabilização pessoal do gestor, pela omissão, porque o problema relacionado à falta de estrutura de escola fere direito fundamental.

Assim, como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que ao ser cominada multa diária ao Município de Palhoça, seja a mesma cobrada pessoalmente do Prefeito Municipal de Palhoça, Ronério Heiderscheidt, e da Secretária Municipal de Educação e Cultura, Jocelete Isaltina da Silveira dos Santos, diretamente de suas folhas de pagamento, para o caso de descumprimento da liminar.

Ademais, o Ministério Público requer ainda, no caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas públicas do Município de Palhoça no valor de R$ 155.000,00 (cento e cinquenta e cinco mil reais) necessárias para reforma e ampliação da escola, por meio do Bacenjud, para garantia da educação (fl. 105).  

O bloqueio de valores é perfeitamente cabível se o ente público se opõe a cumprir determinação judicial, ainda que não transitada em julgado, como meio de suprir necessidade urgente.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AGRAVO RETIDO. ECA. EDUCAÇÃO. VAGA EM ESTABELECIMENTO DE EDUCAÇÃO INFANTIL. DIREITO FUNDAMENTAL DA CRIANÇA À EDUCAÇÃO. A Constituição Federal, em seu art. 208, IV, garante ao infante de até cinco anos o direito à educação, assegurando-lhe o atendimento em creche ou pré-escola. A Lei 9394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação, em seu art. 11, V, atribuiu aos Municípios a competência para garantir a educação infantil. Uma vez negado ou dificultado o acesso à educação infantil, violando, assim direito fundamental subjetivo ao ensino, cabível a intervenção jurisdicional, a fim de garantir a efetividade dos preceitos legais e constitucionais. Alegação de superlotação nas creches e pré-escolas e de incapacidade orçamentária que não restaram comprovadas nos autos. Descabe condenar o Município a pagar honorários ao FADEP, já que o custeio do serviço público prestado pela Defensoria Pública é ônus do Estado. Possível o bloqueio de verbas públicas, ao fim de dar efetividade à ordem judicial de atendimento de vagas na educação infantil. Medida que não se mostra gravosa à sociedade e que garante aos menores o direito fundamental à educação. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70040907354, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/03/2011)

Desta forma, as medidas postuladas anteriormente (multa pessoal ao Prefeito e à Secretária Municipal de Educação e Cultura, bem como o bloqueio de verbas municipais) têm o condão de garantir a efetividade do provimento jurisdicional.

Por fim, cabe destacar que caso haja descumprimento do preceito judicial, eventual multa aplicada deverá ser destinada ao Fundo Municipal da Infância e Adolescência (FIA).


VIII – DOS REQUERIMENTOS:

Ante todo o exposto, o Ministério Público requer:

A. O recebimento da inicial; 

B. A concessão de liminar inaudita altera pars consistente em ordem judicial de obrigação de fazer, ou seja, que o Município de Palhoça efetue reforma geral e amplie a Escola Básica Professora Adriana Weingartner, localizada na Rua Germano Spricigo, Bairro Caminho Novo, Palhoça, até o dia 31 de dezembro de 2012, nos termos do cronograma apresentado pelo próprio demandado (fl. 105), atendendo todas as exigências do Corpo de Bombeiros Militar, da Vigilância Sanitária e do Conselho Municipal de Educação, sempre de acordo com a legislação vigente, para:

* No que se refere à vistoria do Corpo de Bombeiros Militar (fls. 28/30):

1. Providenciar projeto preventivo contra incêndio;

2. Providenciar atestado para habite-se e alvará de funcionamento;

3. Instalar 10 (dez) extintores do tipo PQS 4kg (distribuídos nos cinco blocos);

4. Providenciar sinalização para os extintores, contendo seta vermelha com bordas amarelas sobre os extintores e círculo com as inscrições "Proibido depositar materiais" sob os extintores;

5. Providenciar adequação e manutenção da central de gás central canalizado (estrado de madeira);

6. Providenciar a instalação de aberturas de ventilação permanentes nas dependências que possuem aparelhos de queima; 

7. Substituir a mangueira de GLP;

8. Instalar sistema preventivo por extintores;

9. Instalar sinalização para abandono do local;

10. Instalar sistema de iluminação de emergência;  

11. Substituir o madeiramento da escola, eliminando os cupins, fixando corretamente as telhas e eliminando as goteiras;

12. Providenciar que o portão que dá acesso ao estabelecimento de ensino abra no sentido do fluxo das crianças.

* No tocante à vistoria do Conselho Municipal de Educação (COMED – fls. 48/93):

13. Eliminar os cupins do teto e eliminar as rachaduras das paredes da cozinha;

14. Substituir ou consertar o fogão enferrujado;

15. Providenciar armários, com portas, para alocar os utensílios da cozinha, bem como adquirir pratos, canecas e talheres em quantidade suficiente para os alunos;

16. Adquirir liquidificador para a escola;

17. Eliminar as infiltrações da cozinha;

18. Providenciar que a cozinha possua ventilação adequada;

19. Consertar a janela da sala dos professores e garantir a segurança desta por meio da colocação de grades;

20. Substituir o piso, eliminar os buracos das paredes e consertar o teto da escola, suprimindo as goteiras;

21. Adquirir cadeiras próprias para a sala de informática; 

22. Consertar a parte elétrica da escola;

23. Providenciar que as salas da escola tenham ventilação e luminosidade adequadas;

24. Adquirir mobiliário novo para as salas de aula (cadeiras e mesas para os alunos e professores);

25. Colocar fechaduras em todas as portas;

26. Colocar vidros em todas as janelas;

27. Providenciar a limpeza constante do pátio da escola;

28. Reparar as paredes da biblioteca e adquirir mobiliário adequado para esta; 

29. Adquirir livros e mapas novos para o uso dos alunos;

30. Providenciar armários, mesas e cadeiras para a sala de música;

31. Adquirir lousas novas;

32. Colocar calhas de chuva na escola;

33. Reparar todos os banheiros, suprimindo os vazamentos, adquirindo vasos sanitários novos e substituindo o piso;

34. Colocar piso antiderrapante na escola;  

* No que tange ao relatório de vistoria da Vigilância Sanitária (fls. 94/98):

35. Providenciar alvará sanitário; 

36. Providenciar a colocação de telas nas aberturas da cozinha;  

37. Providenciar lavatório exclusivo para os manipuladores de alimentos;

38. Substituir a fiação, suprimindo a fiação exposta, e providenciar iluminação adequada;

39. Providenciar ralos adequados;

40. Colocar porta na cozinha, a fim de que as crianças não tenham acesso à área de manipulação de alimentos;

41. Substituir os azulejos deteriorados das paredes e eliminar as goteiras do teto da cozinha;

42. Adquirir mesa e armários para a cozinha; 

43. Construir espaço adequado destinado ao refeitório;

44. Consertar as descargas dos banheiros;

45. Providenciar o funcionamento de todos os banheiros, suprimindo o mau cheiro e os vazamentos;

46. Substituir os ralos quebrados dos banheiros;

47. Adquirir saco coletor para as lixeiras;

48. Providenciar papel toalha e sabonete líquido para os banheiros; 

49. Substituir as torneiras quebradas;

50. Providenciar a colocação de piso íntegro, lavável, contínuo e antiderrapante em todo o colégio;

51. Reparar todas as paredes e o teto do estabelecimento de ensino;

52. Substituir as portas deterioradas por portas novas com maçanetas;

53. Substituir as janelas deterioradas;

54. Providenciar iluminação adequada em todo o ambiente escolar;

55. Reparar a fossa do estabelecimento e retirar todo o entulho do pátio do colégio;

56. Adquirir mobiliário novo para as salas de aula;

57. Reparar as paredes e o teto das salas de aula, eliminando os vazamentos e as infiltrações;

58. Construir rampas de acesso às salas de aula adequadas;

59. Reparar a fiação das salas de aula e adquirir quadros novos;

60. Providenciar espaço adequado para funcionamento de biblioteca;

61. Providenciar cadeiras adequadas e em perfeitas condições de uso para a sala de vídeo; 

62. Providenciar climatização adequada para a sala dos computadores;

63. Providenciar a colocação de telas nas aberturas do depósito de alimentos;

64. Eliminar a ferrugem das prateleiras do depósito de alimentos;  

65. Adquirir mais um freezer para o correto acondicionamento dos alimentos;

66. Providenciar cobertura adequada para a área de recreação interna;

67. Consertar o portão do estabelecimento;   

68. Reparar a quadra de esportes, eliminando a vegetação desta;

69. Consertar o corrimão da escada que dá acesso à quadra de esportes.

C. A fixação, em caso de não cumprimento da liminar, de multa diária equivalente a R$ 1.000,00 (mil reais), descontando-se R$ 500,00 (quinhentos reais) diretamente da folha de pagamento do Prefeito Municipal, Ronério Heiderscheidt, e R$ 500,00 (quinhentos reais) diretamente da folha de pagamento da Secretária Municipal de Educação e Cultura, Jocelete Isaltina da Silveira dos Santos, revertendo a quantia total em favor do Fundo da Infância e Juventude de Palhoça, independentemente das sanções cíveis e penais correspondentes;

D. No caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas do Município de Palhoça no valor de R$ 155.000,00 (cento e cinquenta e cinco mil reais) necessárias para reforma e ampliação da escola, por meio do Bacenjud, para garantia da educação (fl. 105);

E. A citação do requerido para que conteste a ação, na pessoa de seu representante legal; 

F. A notificação do Prefeito de Palhoça e da Secretária Municipal de Educação e Cultura de Palhoça;

G. A produção de todas as provas em direito admitidas, documental, pericial e testemunhal, por intermédio da inquirição das pessoas adiante arroladas;

H. Seja julgado procedente o pedido ao final, mantendo-se a liminar concedida. 

Dá-se à causa, para efeitos fiscais, o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Palhoça, 23 de novembro de 2012.


AURÉLIO GIACOMELLI DA SILVA
PROMOTOR DE JUSTIÇA


ROL DE TESTEMUNHAS:

1. Rosilaine da Rosa – Gerente de Vigilância Sanitária de Palhoça (fl. 106);

2. Marcos Antídio de Lima – Fiscal da Vigilância Sanitária de Palhoça (fl. 111);

3. Renata Jaqueline Martins – Presidenta do Conselho Municipal de Educação de Palhoça/SC (fl. 127);

4. Daniel Fernandes – Major do Corpo de Bombeiros de Palhoça/SC (fl. 128).

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