Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




quarta-feira, 30 de maio de 2012

MARCELO DAYRELL A laqueadura forçada de Maria e a defensoria


Ilustração de Cesar Habert Paciornik

No caso aqui apresentado, pode-se verificar a violência ilegítima perpetrada pelo Estado brasileiro.
É um exemplo da violação sistemática aos direitos das pessoas necessitadas praticada rotineiramente na Justiça estadual por juízes, promotores, advogados e até psicólogos e assistentes sociais.
Maria (para preservá-la, uso um nome fictício), 30 anos, mora na Baixada Santista e possui alguma deficiência mental (não se sabe exatamente qual) há vários anos.
Teve três filhos na juventude, com um companheiro já falecido. Ela não cuidava deles de forma adequada, possivelmente em decorrência do seu quadro psíquico.
Assim, em 1998 foi instaurado um "pedido de providências" na Justiça da Infância e da Juventude. A guarda dos três filhos foi dada a parentes do seu finado companheiro.
Maria está hoje em um novo relacionamento, com José, que tem um transtorno mental moderado.
Tiveram dois novos filhos, que são criados pela mãe de Maria, após outra decisão judicial recente.
Em uma das suas fugas de casa, Maria manteve relações sexuais com um homem desconhecido. Engravidou novamente.
O fato de o pai ser um estranho nunca foi um problema para Maria ou mesmo para José. Na verdade, eles logo informaram a gravidez às equipes do Centro de Referência Especializado de Assistência Social (Creas), do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) e do Judiciário.
Apesar de já ser a sexta gravidez, Maria sempre se opôs a qualquer cirurgia para cessar sua fertilidade. Aliás, ela e José sempre interrompem o acompanhamento médico e psicológico ofertado, não mantendo nem a terapia medicamentosa receitada.
Em 16 de julho de 2011, houve o parto. Após ele, a equipe técnica do Poder Judiciário e do serviço social do único hospital local discutiram, com o Creas e o Caps, a possibilidade realizar uma laqueadura sem a aquiescência de Maria ou José.
Combinaram que sim. Manteve-se a internação além do tempo necessário pós-parto. Maria foi submetida a uma única consulta. A médica elaborou um laudo com o diagnóstico de retardo mental não especificado. Procuradas, as irmãs de Maria assinaram uma declaração concordando com a laqueadura.
A assistente social e a psicóloga judiciária foram levar o caso ao promotor de Justiça da Infância e da Juventude, para convencê-lo a opinar a favor à laqueadura forçada.
Mas ele afirmou que a competência para a autorização da laqueadura compulsória não era do juiz da Infância e Juventude. Salientou que Maria nunca tinha sido ouvida como parte e que ela não era interditada -suas irmãs teriam primeiro então de propor sua interdição civil.
O juiz da Infância e da Juventude estava licenciado no dia. A decisão ficou a cargo do seu substituto, que rejeitou o parecer e ordenou a laqueadura compulsória. O Ministério Público só ficou sabendo do procedimento após a sua realização.
A partir do "sucesso" desse caso, abriu-se um precedente. A rede socioassistencial do município passou a procurar outros casos de famílias em idade fértil sem histórico de cuidado com os seus filhos.
O argumento utilizado para a realização da laqueadura compulsória sempre foi a necessidade de evitar a concepção de outras crianças.
Diversas discussões caberiam sobre a violação de direitos ocorrida: direito sexuais e reprodutivos, direito ao planejamento familiar, presunção da capacidade civil das pessoas, direito à integridade corporal, direito à saúde, direito à liberdade etc.
Porém, nenhum desses temas jamais foi trazido à baila. O motivo? Não havia quem defendesse os interesses de Maria.
Maria é uma necessitada de assistência jurídica integral. Seu caso demonstra a falta da implementação plena da Defensoria Pública.
Ainda que a defesa técnica não tivesse sucesso junto àquele juízo, poderia ter acionado a Corregedoria do Poder Judiciário, o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Regional de Psicologia, o Conselho Regional de Serviço Social ou até manejar a impetração de recursos judiciais para, ao menos, evitar que novos casos ocorram no município.
Mas nada disso aconteceu -e continuarão existindo novas Marias.


sexta-feira, 25 de maio de 2012

Dia Nacional da Adoção




A Lei Federal n. 10.447, de 09 de maio de 2002, instituiu o dia 25 de maio de 2012 como o “Dia Nacional da Adoção”, para reflexão e conscientização sobre esta forma de colocação em família substituta de crianças e de adolescentes (geralmente).

A primeira reflexão diz respeito à necessidade premente de se informar sobre as consequências negativas que poderão advir da chamada “adoção à brasileira”, quando pessoas que não se encontram devidamente inscritas no cadastro de adotantes burlam a legislação e obtém a guarda de crianças de forma clandestina, sem acompanhamento da equipe multidisciplinar do Poder Judiciário. Essa decisão açodada a médio ou longo prazo poderá trazer graves prejuízos aos “adotantes” e principalmente à criança que foi inserida em um contexto familiar que pode vir de encontro aos seus interesses.

O segundo ponto a ser destacado é sobre a adoção tardia, prática ainda muito pouco enraizada na sociedade brasileira. A idéia de que a adoção de crianças e adolescentes com a idade um pouco mais avançada pode trazer problemas de adaptação ainda é disseminada de forma equivocada. Há exemplos que desmentem essa noção distorcida. Basta acessar o site da campanha Adoção – Laços de Amor (clique aqui) para se constatar que a adoção tardia pode se constituir em experiência transformadora de amor e de carinho.

Além disso, as crianças e adolescentes acolhidos institucionalmente devem ser atendidos  de forma efetiva e prioritária por toda a rede de garantia de direitos, para que essa medida protetiva efetivamente seja breve e excepcional.

Para terminar, fica se seguinte reflexão:

"Adotar é acreditar que a história é mais forte que a hereditariedade, que o amor é mais forte que o destino".
Lidia Weber
Psicóloga

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Rede de Proteção de Palhoça se fortalecendo




IC - Inquérito Civil n. 06.2012.00001883-6.
Objeto: apurar a situação do Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) de Palhoça.



TERMO DE AUDIÊNCIA


No dia 23 de maio de 2012, às 09:00 horas, compareceram na sala de reuniões do Ministério Público de Palhoça, Aurélio Giacomelli da Silva (Promotor de Justiça), Artur Aguiar (Psicólogo do PAEFI), Fernanda Haiming (Secretária de Gestão); Miriam Raimundo da Silva (Secretária Municipal de Assistência Social); Rosi Meri da Silva (Coordenadora do CREAS); Sandra Resende Dalmaso (Psicóloga do PAEFI); Rafael Arns Stobbe (Psicólogo do Serviço de Acolhimento do CREAS), Luciana Maria da Silva (Assistente Social do PAEFI) e Gicele Truppel (Superintendente da Secretaria Municipal de Assistência Social). Inicialmente foi esclarecido sobre os objetivos da reunião – debater sobre a atual situação do CREAS de Palhoça. A seguir, o Município de Palhoça, por meio de seus representantes, informou sobre o cumprimento das recomendações do Ministério Público, da seguinte forma: 1) REPOSIÇÃO/SUBSTITUIÇÃO - garantir a reposição/substituição de todos os profissionais que deixarem suas funções no CREAS – tal reposição foi autorizada e será realizada. Já foram chamados 4 pedagogos (pois há concurso público vigente), sendo 1 para as medidas socioeducativas e 3 para o PAEFI e eles tomarão posse efetivamente no dia 15 de junho de 2012.  Ocorrerá ainda a reposição de 4 assistentes sociais, sendo 1 para as medidas socioeducativas, 2 para o PAEFI e um para a Equipe de Acolhimento e de 2 psicólogos, sendo 1 para o PAEFI e 1 para a Equipe de Acolhimento. Com relação aos assistentes sociais e aos psicólogos, será efetuado processo seletivo simplificado, e tais profissionais iniciarão suas atividades até o dia 30 de junho de 2012.  2) encaminhar à Câmara de Vereadores legislação que autorize a reposição de servidores, para contratação temporária e emergencial  – não foi necessário o encaminhamento para o legislativo, pois se verificou que já existe lei municipal prevendo a contratação emergencial no caso de saída de servidores (Lei n. 2508/2008). 3) NOVAS CONTRATAÇÕES - efetuar um estudo sobre a viabilidade de contratação/nomeação ou relotação dos seguintes profissionais no CREAS - Serão providenciadas as contratações, por meio de processo seletivo simplificado, dos seguintes profissionais, para os seguintes serviços: a) Serviço PSC/LA – dois  assistentes sociais e dois psicólogos; b) Serviço PAEFI – dois assistentes sociais e dois psicólogos. O motorista já foi providenciado e está exercendo suas funções no CREAS; 4) Abertura de concurso público - Foi autorizada a abertura de concurso público para todos os setores da Prefeitura Municipal; 5) Escala de trabalho dos procuradores do Município no CREAS - foi apresentada a planilha/escala de trabalho  para que seja garantido o atendimento por advogados no CREAS durante todo o período de funcionamento do Serviço. A Dra. Helena Marta Goulart Martins permanecerá no CREAS no período da manhã e o Dr. André Luiz Moraes do Nascimento exercerá suas funções no período da tarde a partir do dia 01/06/2012; 6) Novos coordenadores - Foi nomeada como coordenadora do Serviço PSC/LA a assistente social Luciana Maria da Silva e foi nomeado o psicólogo Rafael Arns Stobbe como Coordenador do PAEFI, a partir de 01/06/2012. Além disso, foi nomeada a nova Superintendente da Secretaria de Assistência Social, Sra. Gicele Truppel. 7) Plano de Cargos e Salários - será iniciada a discussão sobre o Plano de Cargos e Salários da Assistência Social em reunião que será agendada e realizada na Secretaria de Assistência Social; 8) Novos computadores - serão providenciados 4 novos computadores para as equipes do CREAS, no prazo de 20 dias. Que serão providenciados mais 10 computadores a partir da liberação de verbas estaduais de incentivo para média complexidade do SUAS; 9) Fluxos e procedimentos - foi iniciada a discussão sobre a construção de protocolos, fluxos e procedimentos internos e externos, por meio de uma reunião. Será agendada uma reunião no dia 29 de maio de 2012 para continuidade das discussões sobre tal matéria. foi fixado o prazo de 11 de junho de 2012, para cada Secretaria consolidar oficialmente seus respectivos programas e fluxos, informando seus responsáveis. No dia 5 de julho de 2012, será realizado um seminário entre todas as secretarias, para troca de informações. Que estão participando dessas discussões as secretarias da Assistência Social, da Saúde, da Educação e Cultura, dos Esportes e da Habitação. 10) As coordenações do CREAS já estão discutindo o plano pedagógico e os planos individuais de atendimento tanto do PSC/LA e do PAEFI. Nada mais.

Aurélio Giacomelli da Silva
Promotor de Justiça

Fernanda Haiming
Secretária de Gestão

Miriam Raimundo da Silva
Secretária Municipal de Assistência Social

Gicele Truppel
Superintendente da Secretaria Municipal de Assistência Social

Rosi Meri da Silva
Coordenadora do CREAS

 Artur Aguiar
Psicólogo do PAEFI

Sandra Resende Dalmaso
Psicóloga do PAEFI

Luciana Maria da Silva
Assistente Social do PAEFI

Rafael Arns Stobbe
Psicólogo do Serviço de Acolhimento do CREAS

Ilustração extraída do site Childhood (confira aqui)

Diário Catarinense - Abuso sexual - É preciso apoiar e acreditar no que as crianças relatam




Ministra de Direitos Humanos, Maria do Rosário conversou por telefone com a Agência RBS sobre a importância que o depoimento da apresentadora Xuxa, veiculado domingo no quadro O Que Vi da Vida, no Fantástico.
Maria do Rosário ressaltou que estudos mostram que a violência sexual produz dores psicológicas e citou o que considera três principais pontos da revelação da apresentadora:
- Em primeiro lugar, representou o que muitas pessoas já sofreram e nunca tiveram coragem de falar. Em segundo lugar, chamou a atenção para o fato de esse problema acontecer, muitas vezes, dentro da própria família ou na comunidade na qual a criança está inserida. E, em terceiro, acredito que o que ela pediu foi que as pessoas acreditem no que as crianças dizem. Isso é fundamental. Ela disse que não contou porque achava que não iriam acreditar nela e achariam que era culpada. As crianças precisam ter certeza de que os adultos vão acreditar nelas.
A ministra se disse muito sensibilizada com a revelação.
- Xuxa e eu trabalhamos juntas há muito tempo, ela é uma das principais colaboradoras do Disque 100. Ela representou muito bem as pessoas que ainda não tiveram coragem de falar. Gosto ainda mais dela por isso.
Maria do Rosário também salientou a importância da Lei Joanna Maranhão, que entrou em vigor na sexta-feira. A lei altera as regras sobre a prescrição do crime de pedofilia e também o estupro e o atentado violento ao pudor praticados contra crianças e adolescentes. Agora, a contagem de tempo para a prescrição só começa na data em que a vítima fizer 18 anos, caso o Ministério Público não tenha, antes, aberto ação penal contra o agressor. Até então, a prescrição era calculada a partir da data do crime. O entendimento é que, alcançada a maioridade, a vítima ganha condições de agir por conta própria.
A legislação leva o nome em homenagem à nadadora Joanna Maranhão, que denunciou os abusos a que foi submetida durante a infância por um treinador.
Na terra natal, não se fala em outra coisa
Em Santa Rosa (RS), terra natal da Xuxa, a entrevista exibida no Fantástico foi um dos principais assuntos ontem. Também causou alvoroço nas redes sociais. Muita gente se manifestou no Facebook e Twitter.
Entre os taxistas, a entrevista também foi assunto.
- Acho que se isso realmente aconteceu, é uma coisa muito grave e difícil pra ela - opina o taxista João Vanderlei.
Familiares de Xuxa que moram em Santa Rosa foram procurados, mas evitaram comentar sobre o assunto. Pela manhã, foi a própria apresentadora quem usou o Facebook para falar sobre o assunto.
 XUXA MENEGHEL
Postagem de ontem no Facebook
"Eu não me sinto muito bem falando mais desse assunto. Espero que vcs entendam e aceitem minha decisão. Eu não quero mais falar. Eu queria ajudar crianças que passam ou passaram pelo que eu passei, que elas falem, denunciem, não fiquem se sentindo culpadas."

Um crime silencioso

Como saber se uma criança foi vítima de abuso? Esta é uma pergunta que angustia os pais. De alguma forma, a criança sempre mostra, de algum modo, que passa por uma situação de abuso sexual. Isso pode ser pela fala ou por meio de sinais, como desenhos, utilização de um linguajar sexualizado impróprio para a idade, pesadelos e medos incomuns. Pode ser, também, através de sintomas físicos ou resistência para ver determinadas pessoas.
Geralmente, a criança se sente culpada e preocupa-se com as consequências da denúncia para si e para toda a família.
- Penso que toda forma de falar no assunto é importante, pois a criança e o adolescente se sentem encorajados a falar. Além da culpa que carrega, muitas vezes a vítima acaba se sentido na obrigação de "proteger" o abusador - observa Scheila Thomé, conselheira tutelar há seis anos em Florianópolis.
Além disso, recomenda, acolher a criança que sofre abuso é o primeiro passo para minimizar o impacto do problema.
Professores e profissionais de saúde também podem ajudar. Por estarem na ponta dos serviços de atendimento, médicos e enfermeiros podem identificar e notificar situações de violência sexual. Eles podem observar sinais que indiquem situação de negligência, agressões físicas ou abuso sexual e encaminhar os casos à rede de proteção local.
Da mesma forma, os professores também têm papel importante: o comportamento do aluno pode ser um indicador de que o estudante esteja sendo vítima de violência.
Outra dúvida frequente dos pais é se é possível orientar a criança sobre o que seria um abuso sexual.
Alguns especialistas consideram que aos cinco anos já é possível orientar a criança sobre a abordagem sexual imprópria por parte de adultos, colegas muito mais velhos ou pessoas próximas.



segunda-feira, 21 de maio de 2012

Novos Promotores de Justiça conhecem parte da rede de proteção de Palhoça na área da infância e da juventude

Novos promotores de justiça 

Neste mês de maio, os oito novos Promotores de Justiça do Estado de Santa Catarina (Maria Cláudia Tremel de Faria, Simão Baran Junior, Douglas Roberto Martins, Joaquim Torquato Luiz, Diana da Costa Chierighini, Ana Elisa Goulart Lorenzetti, Cristiane Weimer e Marcus Vinicius de Faria Ribeiro), recém aprovados em concurso público, estão conhecendo a estrutura e o trabalho da 1ª Promotoria de Justiça de Palhoça, bem como uma parte da rede de proteção da área da infância e  juventude desta cidade.

Por meio deste estágio orientado, organizado pela Corregedoria-Geral do Ministério Público e efetuado também em outras promotorias criminais da Grande Florianópolis, os novos membros do Ministério Público adquirem experiências práticas para quando assumirem suas respectivas  e relevantes funções nas comarcas do interior.

Além do conhecimento prático sobre as atividades da 1ª Promotoria de Justiça de Palhoça, os novos promotores de justiça estão conhecendo in loco o Serviço Social do Ministério Público, o Serviço de Acolhimento Institucional e o CREAS de Palhoça, que por meio de seus profissionais comprometidos, estão servindo de exemplo de atuação efetiva na proteção das crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. Os modelos desses serviços essenciais serão levados para disseminação em outras searas de nosso Estado.

Desejamos felicidades e sucesso na trajetória dos novos promotores de justiça.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Desde os anos 80, música“Camila, Camila”’ alerta sobre a violência sexual



“A lembrança do silêncio daquelas tardes
A vergonha no espelho naquelas marcas
Havia algo de insano naqueles olhos
Olhos insanos
Os olhos que passavam o dia a me vigiar, a me vigiar…
Eu que tenho medo até de suas mãos
Mas o ódio cega e você não percebe
Mas o ódio cega”
 (Camila, Camila)

Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes




Hoje é o Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, umas das maiores chagas da nossa sociedade.

No enfrentamento dessa triste realidade três palavras devem nos fazer refletir: informação, conscientização e ação.

Informação - a sociedade precisa ser informada devidamente sobre as consequências nefastas da exploração e do abuso sexual na vida das crianças e adolescentes que sofrem com este grande mal, para que se tenha ciência também de que todos são responsáveis para que tais práticas sejam coibidas, por meio  da realização de denúncias aos órgãos competentes.

Conscientização - a sociedade, a partir da informação que recebe, deve compreendê-la e ter a exata noção do problema, tomando consciência de que se encontra inserida neste contexto e não deve se omitir.

Ação - todos nós precisamos agir! As campanhas são importantes mas vão influenciar pouco se a sociedade não tomar atitudes positivas para que o abuso sexual de crianças e adolescentes seja combatido, como denunciar os casos às autoridades competentes e exigir que nossos governantes efetivamente invistam na prevenção e na proteção deste direito essencial, quando violado.

Então é isso: DENUNCIE!

quinta-feira, 17 de maio de 2012

AÇÃO CIVIL PÚBLICA AJUIZADA PELA 1ª PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE PALHOÇA, PARA CONCESSÃO DE VAGA EM CENTRO DE EDUCAÇÃO INFANTIL PARA CRIANÇA, SOB PENA DE BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS E COMINAÇÃO DE MULTA PESSOAL AO PREFEITO DE PALHOÇA (segue a íntegra da petição inicial)




EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAMÍLIA, ÓRFÃOS, SUCESSÕES, INFÂNCIA E JUVENTUDE DE PALHOÇA/SC.   

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por intermédio de seu Órgão de Execução, com fundamento nos artigos 1º, incisos II e III, 6º, caput, 23, inciso V, 127, caput, 129, incisos II e III, 205, 208, inciso IV, 211, § 2º, e 227, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; nos artigos 3º, 4º, 53, 54, inciso IV, 148, inciso IV, 201, incisos V e VIII, 209, 210, inciso I, e 213 e seus parágrafos, todos da Lei n. 8.069/90 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA); no artigo 25, inciso IV, da Lei n. 8.625/93; no artigo 82, inciso VI, alínea 'c' da Lei Complementar Estadual n. 197/2000; no artigo 5º, inciso I, da Lei n. 7.347/85, na Lei n. 9.394/96 e demais dispositivos pertinentes, vem propor a presente: 

AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE LIMINAR,

em desfavor do MUNICÍPIO DE PALHOÇA, pessoa jurídica de direito público, CNPJ 82.892.316/0001-08, com endereço na Avenida Hilza Terezinha Pagani, n. 289, Parque Residencial Pagani, Palhoça/SC, por seu representante legal, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:

I - DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO:

Extrai-se da Lei n. 8.069/90 que é competente o Juízo da Infância e Juventude para julgar ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, conforme se depreende da leitura do artigo 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Infere-se ainda da lei antes mencionada que as ações relacionadas à criança e ao adolescente serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo Juízo terá competência absoluta para processar a causa (artigo 209 da Lei n. 8.069/90).

Paralelamente, o Código de Processo Civil (art. 100, inciso IV, alínea 'd'), dispõe taxativamente que é competente o foro do lugar onde a obrigação deve ser satisfeita para a ação em que se lhe exigir o cumprimento.

Portanto, como a presente Ação Civil Pública tem por escopo salvaguardar o direito de criança residente neste Município de Palhoça/SC, a fixação da competência deve ocorrer neste foro judicial.

II – DA LEGITIMIDADE ATIVA:

Da legislação constitucional e infraconstitucional deflui a legitimação do Ministério Público para a propositura da ação civil pública na defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos.

O artigo 127, caput, da Constituição Federal prescreve que: 

"O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis". 

Ademais, o artigo 129, incisos II e III, da Constituição de 1988 dispõe:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: 
[...] 
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;

III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

E no tocante à legitimidade do Ministério Público em ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais, coletivos ou difusos de crianças e adolescentes, claro é o artigo 201 da Lei n. 8.069/90, que enuncia:

Art. 201. Compete ao Ministério Público: 
[...]
V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal; 
[...]
VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis.

Tal legitimação decorre também do art. 25 da Lei n. 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público).

No mesmo norte, prevê o art. 82, inciso VI, alínea 'c', da Lei Complementar Estadual n. 197/2000:

Art. 82. São funções institucionais do Ministério Público, nos termos da legislação aplicável:
[...]
VI - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da lei, para:
[...]
c) a proteção dos interesses individuais indisponíveis, individuais homogêneos, difusos e coletivos relativos à família, à criança, ao adolescente, ao idoso e às minorias étnicas.

Não se olvida, ainda, que a Lei n. 7.347/85, em seu art. 5º, autoriza o Ministério Público a propor ações destinadas à tutela desses interesses em juízo. 

Acerca da legitimidade do Ministério Público, Hugo Nigro Mazzilli leciona que:

[...] Diz o art. 127, caput, da Constituição que o Ministério Público está encarregado da defesa dos interesses sociais e dos individuais indisponíveis. Daí se infere que, quanto aos interesses de caráter social, o Ministério Público os defende todos, e, quanto aos individuais, apenas se indisponíveis. À primeira vista, poderíamos ser tentados a crer que o Ministério Público não poderia defender interesses individuais homogêneos, quando disponíveis; assim, vez ou outra se vê na jurisprudência algum julgado a dizer que o Ministério Público só poderia defender interesses individuais homogêneos se indisponíveis. Essa, porém, é leitura apressada do dispositivo constitucional. Sem dúvida, há absoluta compatibilidade em que o Ministério Público defenda interesses individuais homogêneos, quando indisponíveis. Mas quanto aos interesses individuais homogêneos disponíveis, o Ministério Público também os poderá defender, quando tenham suficiente expressão ou abrangência social, o que lhes conferirá a natureza de interesse social  [...] (A defesa dos interesses difusos em juízo. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 107/108) (grifei)

De mais a mais, sobre o tema, já se decidiu:

AÇÃO CIVL PÚBLICA - MATRÍCULA DE CRIANÇAS EM CRECHE E PRÉ-ESCOLA - AGRAVO RETIDO - LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO EM DEFESA DE DIREITO INDIVIDUAL INDISPONÍVEL - CONCESSÃO DE LIMINAR SEM A OITIVA DO REPRESENTANTE DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO - ART 2º, DA LEI 8.437/92 - URGÊNCIA DA TUTELA - AUSÊNCIA DE NULIDADE - IMPROVIMENTO DO AGRAVO RETIDO.
De acordo com os arts. 127 e 129, da Constituição Federal, e arts. 201, V e VIII, 208, III, e 210, I, do Estatuto da Criança e do Adolescente, resta nítida a legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública em defesa de direito individual indisponível, consistente no direito das crianças ao atendimento em creche e pré-escola [...] (TJSC - Processo: 2009.037559-5. (Acórdão). Relator: Sérgio Roberto Baasch Luz. Data: 24/09/2009) (sem grifo no original).

Assim, denota-se que o Ministério Público detém legitimidade para propor esta ação.

III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA:

Por outro lado, inegável que o Município de Palhoça possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda.

Extrai-se do § 2º do artigo 211 da Constituição Federal que:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. 
[...]
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

Ademais, a Lei n. 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) dispõe que:

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. 

Logo, conclui-se que o Município aludido possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente Ação Civil Pública. 

IV - DOS FATOS:

Este Órgão de Execução do Ministério Público instaurou o Procedimento Preparatório n. 06.2011.006275-4, a fim de apurar eventual situação de risco de criança residente neste Município de Palhoça/SC, após o recebimento de cópia de Ação Penal oriunda da 1ª Vara Criminal desta Comarca (fls. 2/13).

Na sequência, o referido Procedimento foi encaminhado ao Serviço Social do Ministério Público, que efetuou visita na residência da família de Marina Emília Soares, ocasião em que se verificou que o referido núcleo familiar não estava sendo atendido por programa de assistência desta municipalidade e que as crianças Karolaine Soares Nunes, nascida em 06/04/2007, e Wellington Soares Nunes, nascido em 11/05/2009, estavam na fila de espera por vaga, em período integral, no estabelecimento de ensino denominado CEI Ulisses Guimarães.

 Nesta oportunidade, a assistente social verificou também que a genitora de Wellington trabalha como auxiliar de limpeza e recebe o salário de R$ 685,00 (seiscentos e oitenta e cinco reais) (Relatório de Informação n. 243/2011 – fls. 14/16).

Após, este Órgão de Execução adotou as providências necessárias objetivando a inclusão da aludida entidade familiar no Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos – PAEFI, e expediu ofícios à Secretaria de Educação e Cultura de Palhoça, requisitando que fossem disponibilizadas vagas em creche aos infantes acima mencionados.

Ressalte-se que o Ministério Público expediu à referida Secretaria da Educação os Ofícios n. 1940/2011/01PJ/PAL (fl. 18), 0123/2012/01PJ/PAL (fls. 19 e 21), 0345/2012/01PJ/PAL (fls. 22/23) no escopo de viabilizar o fornecimento das vagas em creche.

Empós, aportou nesta Promotoria de Justiça o ofício proveniente da Secretaria Municipal de Educação e Cultura de Palhoça informando que foi concedida vaga à criança Karoline Soares Nunes, sem se manifestar no tocante ao infante Wellington Soares Nunes (fls. 24/25).   

Diante disso, expediu-se novo ofício à Secretaria de Educação e Cultura do Município de Palhoça, requisitando vaga em creche a Wellington Soares Nunes (fls. 26/27).

Em resposta, o Superintendente Municipal de Educação e Cultura de Palhoça informou, em resumo, que "esta Secretaria não conseguiu vaga ao infante WELLINGTON SOARES NUNES no CEI Ulisses Guimarães – Frei Damião, pois as vagas foram preenchidas em fevereiro com o plano de matrículas" (fl. 28).

Assim, diante do descaso do Município de Palhoça para com a educação de criança residente nesta Comarca, este Órgão de Execução do Ministério Público extraiu cópia do Procedimento Preparatório n. 06.2011.00006275-4 para salvaguardar o direito do mesmo.

De todo o relatado, denota-se que o Município de Palhoça está negligenciando a oferta de educação infantil, quer seja de rede própria ou conveniada, ao infante Wellington Soares Nunes.

Nesse contexto, diante da constatação de que o Município detém numerário para financiar inúmeras obras e eventos de grande porte, conforme se pode verificar em todos os pontos de nossa cidade e nas manchetes de todas as formas de mídia, não há dúvidas de que também possui numerário para fins de contemplar os interesses da infância e juventude, que são de prioridade absoluta, por força de comando constitucional. 

Portanto, imprescindível que haja previsão orçamentária específica e suficiente para o atendimento das crianças em creches e pré-escolas sendo, em último caso, ajustada a destinação dos valores eventualmente previstos para outros serviços ou obras para a criação dessas vagas, tudo em reverência ao princípio da prioridade absoluta.

Atente-se, por exemplo, que as quantias que são direcionadas para a realização de diversos eventos de grande porte nesta cidade seriam mais do que suficientes para a criação desta e de diversas outras vagas pleiteadas, bem como na contratação do pessoal para a regular a oferta desse serviço, reputado essencial.

Registre-se ainda que com políticas públicas que não priorizam o ensino infantil não estamos comprometendo tão somente o desenvolvimento de nossas crianças e futuros cidadãos, o que já seria suficiente para ensejar medidas urgentes nesse campo, mas podendo atingir toda uma estrutura familiar, contribuindo para o aumento da pobreza e dificultando cada vez mais a pretendida erradicação do trabalho e da mendicância infantil, entre outros efeitos nocivos. Tais constatações, aliás, não demandam muitos esforços para serem percebidas dia a dia nesse Juízo da Infância e Juventude, diante do crescente número de processos envolvendo tais situações de vulnerabilidade de crianças e adolescentes.

Ressalte-se, também, que a criança que tem direito a vaga em creche é pessoa em desenvolvimento que a própria Constituição Federal denomina “sujeito de direitos”. É ela a “prioridade absoluta constitucional”, que está sendo vítima da omissão do Estado.

A omissão, portanto, é cristalina e não deve prosperar.

Frise-se que a presente Ação Civil Pública pretende compelir o Município de Palhoça a conceder vaga no estabelecimento de ensino CEI Ulisses Guimarães ou em outra entidade particular às expensas da municipalidade, à criança Wellington Soares Nunes, nascido em 11 de maio de 2009, residente na Rua Beira Rio, s/n., Bairro Frei Damião, Palhoça/SC, sem prejuízo da necessidade de dar o mesmo atendimento às crianças que vieram a necessitar da vaga.

Diante disso, este Órgão de Execução do Ministério Público, com o intuito de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais que amparam a criança, propõe a presente Ação Civil Pública no escopo de salvaguardar seus direitos e interesses.

V  DO DIREITO:

A Constituição da República Federativa de 1988 estabelece em seu art. 1º, incisos II e III, que:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
[...]
II – a cidadania;
III - a dignidade da pessoa humana.

Adiante, a lei fundamental, em seu art. 6º, dispõe:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Ademais, extrai-se da dicção do art. 23, inciso V, da Magna Carta que:

Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
[...]
V - proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência;

Ainda, a fim de promover a educação, a Lei Maior assevera que:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. 

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

De mais a mais, a redação do art. 211, § 2º, da Constituição Federal é clara ao dispor que:

Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime de colaboração seus sistemas de ensino. 
[...]
§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente afirma:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
[...]
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; 
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho [...].

Art. 54. É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: 
[...]
IV - atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade; 

Aliás, a Lei n. 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) dispõe que:

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:
I - organizar, manter e desenvolver os órgãos e instituições oficiais dos seus sistemas de ensino, integrando-os às políticas e planos educacionais da União e dos Estados;
II - exercer ação redistributiva em relação às suas escolas;
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;
IV - autorizar, credenciar e supervisionar os estabelecimentos do seu sistema de ensino;
V - oferecer a educação infantil em creches e pré-escolas, e, com prioridade, o ensino fundamental, permitida a atuação em outros níveis de ensino somente quando estiverem atendidas plenamente as necessidades de sua área de competência e com recursos acima dos percentuais mínimos vinculados pela Constituição Federal à manutenção e desenvolvimento do ensino.
VI - assumir o transporte escolar dos alunos da rede municipal. 

Logo, denota-se que o Brasil possui uma avançada legislação relacionada aos infantes e à educação, pois existem os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta, mas que, em situações como a do vertente caso é lamentavelmente menosprezada.

E, acerca da legislação acima citada, insta transcrever o entendimento de Válter Kenji Ishida:

"Pode-se falar conforme acima aludido na existência da doutrina da proteção integral. Para assegurar a mesma, formularam-se princípios menoristas, destacando-se o da prioridade absoluta, e o do melhor interesse [...] o princípio da prioridade absoluta possui o status constitucional, com a previsão no art. 227 da Carta Magna. A prioridade absoluta significa primazia, destaque em todas as esferas de interesse, incluindo a esfera judicial, extrajudicial ou administrativa". (Estatuto da Criança e do Adolescente. 12. Ed. São Paulo: Atlas, 2010. págs. 6/7)

Nesse diapasão, necessário se faz também mencionar as lições de Munir Cury, et al, acerca dos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente:

"Não se trata, neste caso, de palavras inúteis, como às vezes se diz das solenes declarações constitucionais. As regras ali enunciadas colocam também algumas normas de caráter imediatamente preceptivo, isto é, às quais todos devem imediata obediência, pois são suficientemente precisas; mas têm importância decisiva também por seu aspecto programático, isto é, aquele que se refere às normas concretas para implementação do programa". (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 10. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. pág. 35) 

Ademais, no que se refere ao direito à educação, previsto na Magna Carta e no Estatuto da Criança e do Adolescente, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, et al, aduz:

Conceitua-se a educação como sendo o processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social. 
O processo educacional visa a integral formação da criança e do adolescente, buscando seu desenvolvimento, seu preparo para o pleno exercício da cidadania e para ingresso no mercado de trabalho (art. 205, CF).
É direito fundamental que permite a instrumentalização dos demais, pois sem conhecimento não há o implemento universal dos direitos fundamentais. A ignorância leva a uma passividade generalizada que impede questionamentos, assegura a manutenção de velhos sistemas violadores das normas que valorizam o ser humano e impede o crescimento do ser humano e o consequente amadurecimento da nação.  (Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 49). (sem grifo no original).

Dessa forma, verifica-se que no sistema legal brasileiro estabeleceu-se a primazia em favor das crianças e adolescentes em todas as esferas de interesses.

E como a previsão de absoluta prioridade decorre da Constituição e da Lei Infraconstitucional, não há espaço para ponderações, devendo ser assegurados aos infantes todos os seus direitos elencados na legislação pátria, levando-se em consideração a condição de pessoas em desenvolvimento.

Torna-se claro, assim, o caráter preventivo da doutrina da proteção integral, a qual deve ser efetivada para salvaguardar as crianças. Do contrário, o texto legal será letra morta.

Consequentemente, caso o Município não observe esses direitos fundamentais, como ocorre no presente caso, pois está negando vaga em creche,  torna-se violador dos direitos preconizados tanto na Carta Maior, como no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Cabe destacar que direitos fundamentais são direitos para os quais não se pode admitir desculpas, como dificuldades financeiras. Eles devem ser resguardados independente de qualquer situação.

Deste modo, é dever e obrigação do Município de Palhoça cumprir os direitos fundamentais das crianças palhocenses. 

E não se alegue falta de recursos financeiros, humanos ou materiais no escopo de se eximir de seu dever estabelecido, pois não cabem escusas ou justificativas para o descumprimento de direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente. Até porque investir na criança e no adolescente é investir no futuro.

Quanto a isso, já se decidiu:

[...] Ausência de previsão orçamentária a cargo do ente federativo demonstrada. Omissão, em afronta ao Estatuto da Criança e do Adolescente. Recurso desprovido.
A proteção e a assistência a CRIANÇAS e ADOLESCENTES constitui despesa inadiável, imprescindível, constitucional e legalmente exigível, a qual não pode se furtar o Poder Público. A falta de previsão orçamentária pode ser facilmente contornada com créditos adicionais, inexistindo óbice à pretensão executiva. (TJSC - Apelação Cível n. 2008.077703-3, de Criciúma. Relator: Pedro Manoel Abreu. Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público. Data: 11/03/2010) (sem grifo no original)

Não se alegue também que o estabelecimento de políticas sociais derivadas de normas programáticas situa-se no âmbito do poder discricionário do administrador público, sendo vedado ao Poder Judiciário interferir nos critérios de conveniência e oportunidade.

A autuação do Poder Judiciário nestes casos não interfere de modo algum na independência dos poderes, levando-se em conta a questão dos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente.

Ademais, sabe-se que, na ocorrência de omissão por parte do Poder Público no cumprimento de norma constitucional elevada à categoria de norma fundamental, compete sim ao Poder Judiciário aplicar o direito ao caso concreto.

Diante desse contexto, não há que se falar em desrespeito à autonomia do Poder Executivo por parte do Judiciário. Comungar de tal raciocínio significa simplesmente negar a existência de uma função estatal em face da outra, o que é de todo descabido.

Muito pelo contrário, a espécie em análise não consagra qualquer tipo de desrespeito às autonomias, mas afirma a função jurisdicional em relação a função executiva mal exercida ou não exercida, o que é absolutamente corriqueiro em um Estado Democrático de Direito.

Sobre isso, o Supremo Tribunal Federal decidiu:

[...] DEVER DE PROTEÇÃO INTEGRAL À INFÂNCIA E À JUVENTUDE. OBRIGAÇÃO  CONSTITUCIONAL QUE SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO [...] CONFIGURAÇÃO, NO CASO, DE TÍPICA HIPÓTESE DE OMISSÃO INCONSTITUCIONAL IMPUTÁVEL AO MUNICÍPIO. DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO PROVOCADO POR INÉRCIA ESTATAL (RTJ 183/818-819). COMPORTAMENTO QUE TRANSGRIDE A AUTORIDADE DA LEI FUNDAMENTAL (RTJ 185/794-796). IMPOSSIBILIDADE DE INVOCAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DA CLÁUSULA DA RESERVA DO POSSÍVEL SEMPRE QUE PUDER RESULTAR, DE SUA APLICAÇÃO, COMPROMETIMENTO DO NÚCLEO BÁSICO QUE QUALIFICA O MÍNIMO EXISTENCIAL (RTJ 200/191- -197). CARÁTER COGENTE E VINCULANTE DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS, INCLUSIVE DAQUELAS DE CONTEÚDO PROGRAMÁTICO, QUE VEICULAM DIRETRIZES DE POLÍTICAS PÚBLICAS. PLENA LEGITIMIDADE JURÍDICA DO CONTROLE DAS OMISSÕES ESTATAIS PELO PODER JUDICIÁRIO. A COLMATAÇÃO DE OMISSÕES INCONSTITUCIONAIS COMO NECESSIDADE INSTITUCIONAL FUNDADA EM COMPORTAMENTO AFIRMATIVO DOS JUÍZES E TRIBUNAIS E DE QUE RESULTA UMA POSITIVA CRIAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO DIREITO. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DELINEADAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (RTJ 174/687 – RTJ  175/1212-1213 – RTJ 199/1219- -1220). RECURSO EXTRAORDINÁRIO DO MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL CONHECIDO E PROVIDO. (STF - RE 482611 / SC - SANTA CATARINA. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. Relator(a):  Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 23/03/2010) (sem grifo no original)

E, conforme afirmado alhures, é possível deduzir do caso em tela que não deve a omissão do administrador prosperar, no tocante ao não fornecimento de vaga em creche ou pré-escola, devendo o Município cumprir a legislação protetiva, no intuito de evitar prejuízo aos sujeitos do futuro do nosso país.

Logo, não deve Wellington Soares Nunes ser vítima da omissão do ente municipal, porque o nosso ordenamento e o princípio basilar da dignidade da pessoa humana refutam referida prática desprezível. 

Assim, conclui-se que caso o gestor público seja relapso e atue com descaso no que se refere aos direitos fundamentais relacionados à criança, não só permite-se, como também impõe-se a pronta atuação deste Órgão do Ministério Público, assim como do Poder Judiciário, no objetivo de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais.

VI – DA NECESSIDADE DA LIMINAR:

A omissão no fornecimento de creche ao infante Wellington Soares Nunes deve cessar imediatamente, exigindo que esta pretensão seja deferida desde o recebimento da presente inicial.

De outro modo, a postergação do problema vilipendia diariamente os seus direitos.

Atente-se que não só a Lei n. 7.347/85, em seu artigo 12, caput, como também o artigo 213, § 1º, da Lei n. 8.069/90, autorizam, mediante a relevância do fundamento da demanda e do justificado receio da ineficácia do provimento final, a concessão de liminar para conceder previamente o direito que se pretende resguardar, senão veja-se:

Do artigo 12, caput, da Lei n. 7.347/85, tem-se que "poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo."

E, do artigo 213, §1º, insculpido na Lei n. 8.069/90:

Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. 

§ 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citando o réu. 

§ 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito. 

Registre-se que a verossimilhança, requisito necessário à outorga da decisão liminar, encontra respaldo fático nos próprios fundamentos já narrados, vez que o direito pátrio impõe o direito à educação como fundamental e necessário para a instrumentalização dos demais direitos.

De mais a mais, é por meio da educação que a criança é preparada para o pleno exercício da cidadania.

Ressalte-se que a permanência de crianças fora de unidades de ensino contra a vontade de seus pais tem o condão de comprometer não só a efetiva aquisição do desenvolvimento almejado pelo ensino, prejudicando-a futuramente nos atos de sua vida, mas também da própria família, se um dos seus membros eventualmente tiver que abandonar ou recusar emprego porque a situação não permite que deixe o lar e seus filhos sem os cuidados necessários de um adulto.

Além disso, este Órgão Ministerial está pleiteando apenas o que o  Município tem obrigação de fazer.

Ademais, extrai-se da documentação juntada nesta exordial que o Ministério Público tentou exaustivamente a concessão da vaga sem recorrer ao judiciário, haja vista ter expedido vários ofícios para tal finalidade.

Fica assim demonstrada a plausibilidade do direito invocado e o fundado receio de ineficácia do provimento final, motivo pelo qual a concessão da liminar é medida que se impõe.

E, como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que seja cominada multa diária para o caso do Município não providenciar a vaga em creche em favor do infante.

VII – DO "CONTEMPT OF COURT" E O BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS:

Sabe-se que o agente do Estado atua em nome do ente público e é diretamente responsável pela administração.

É sabido também que o ente estatal em si não possui vida, uma vez que é dirigido por gestores.

Assim, o Município possui comandante que assume a responsabilidade, no período do mandato, de administrar nos termos das leis e de respeitar eventual decisão judicial prolatada em desfavor do ente público. 

Todavia, não raras vezes aquele que ocupa o cargo público, mesmo conhecedor da existência de multa fixada contra o ente público para o caso de descumprimento de decisão judicial, age com irresponsável descaso frente à liminar concedida, pois sabe que os valores sairão dos cofres públicos, ou seja, recai sobre os cidadãos, já que o administrador público não se sensibiliza com o prejuízo e continua a agir ilegalmente.

A imposição de multa para pagamento ao Município é medida legal, que visa ao cumprimento da decisão. Contudo, como o valor da multa não é suportado pelo agente público, mas sim pelo ente municipal, esta circunstância tem gerado o desrespeito das decisões judiciais, além de duplo prejuízo para a população: primeiro porque o agente público não cumpre com suas obrigações; segundo porque o pagamento da multa é feito com dinheiro público.

Diante do descaso referido, o legislador pretendendo dar plena efetividade aos provimentos judiciais relativos às obrigações de fazer, fez constar no § 5º do artigo 461 do Código de Processo Civil que:

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

A partir daí novo entendimento doutrinário e jurisprudencial tem sido aplicado e tem permitido melhores resultados, com maior respeito às decisões proferidas.

Inúmeras decisões continuam a fixar a multa, com a diferença de que a mesma deve ser suportada pelo próprio agente público, pois é totalmente descabido ver a multa recair sobre a pessoa jurídica, quando esta depende da manifestação de vontade da pessoa física que exerce a função pública.

Nesse sentido, necessário se faz mencionar o entendimento de Luiz Guilherme Marioni, que leciona:

“Se a pessoa jurídica exterioriza a sua vontade por meio da autoridade pública, é lógico que a multa somente pode lograr o seu objetivo se for imposta diretamente a agente capaz de dar atendimento à decisão jurisdicional”.
"Não há procedência no argumento de que a autoridade pública não pode ser obrigada a pagar a multa derivada de ação em que foi parte apenas a pessoa jurídica. É que essa multa somente poderá ser imposta se a autoridade pública, que exterioriza a vontade da pessoa jurídica, não der atendimento à decisão. Note-se que a multa somente pode ser exigida da própria autoridade que tinha capacidade para atender à decisão – e não a cumpriu. A tese que sustenta que a multa não pode recair sobre a autoridade somente poderia ser aceita se partisse da premissa – completamente absurda – de que o Poder Público pode descumprir decisão jurisdicional em nome do interesse público." (Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: RT, 2004, p. 661-662)

Ademais, no dizer de Ada Pelegrini Grinover, “Contempt of Court” significa:

 “a prática de qualquer ato que tenda a ofender um juiz ou tribunal na administração da justiça, ou a diminuir sua autoridade ou dignidade, incluindo a desobediência a uma ordem” (GRINOVER, Ada Pelegrini, Abuso do processo e resistência às ordens judiciárias: o contempt of court, Marcha, pp 62/69, especialmente, p. 68, ano 2000).

Portanto, objetivando a credibilidade do Poder Judiciário, este instituto deve ser aplicado sempre que decisões judiciais forem desrespeitadas.

Acerca da aplicação da multa em desfavor do gestor, o egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em decisão recente, assim decidiu:

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR - CENTRO DE INTERNAÇÃO PROVISÓRIA DE TUBARÃO - PRECARIEDADE DAS INSTALAÇÕES - MORA DO PODER ESTATAL CARACTERIZADA - VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - INOCORRÊNCIA - CUMPRIMENTO DE DIREITO ASSEGURADO CONSTITUCIONALMENTE - INVOCAÇÃO DO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL – DESCABIMENTO. 
1 Em se tratando de violação a direitos assegurados constitucionalmente - dentre eles, o da proteção integral ao adolescente, inclusive do infrator (CF, art. 227) -, o Poder Judiciário não só pode como deve intervir e determinar a sua observância pelo Poder Executivo.
2 "A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada pelo Poder Público, com a propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. (...) A noção de 'mínimo existencial', que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança" (AgRg-ARE n. 639337/SP, Min. Celso de Mello, j. 23.8.2011). (TJSC - Agravo de Instrumento n. 2011.006614-3, de Tubarão. Relator: Luiz Cézar Medeiros. Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público. Data: 18/01/2012) (sem grifo no original) 

E extrai-se do acórdão:

[...] entendo ser plenamente cabível a fixação de astreinte contra o agente público responsável pela tomada das providências necessárias ao cumprimento da decisão. Ora, nada impede que a autoridade pública venha posteriormente aos autos comunicar ao Juízo a existência de situação excepcional impeditiva da obediência do comando judicial, no interregno nele fixado, sem afrontar, por conseguinte, o seu direito ao contraditório e à ampla defesa [...]

No mesmo sentido, em decisão oriunda de Ação Civil Pública desta Comarca:

[...] é válido ressaltar que a aplicação de multa no caso de descumprimento da determinação judicial é cabível, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público:
[...]
MULTA DIÁRIA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO FIXADA NA SENTENÇA - FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. As astreintes podem ser fixadas pelo juiz de ofício, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público (Fazenda Estadual), que ficará obrigada a suportá-las casos não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado (Resp. n. 201.378, Min. Fernando Gonçalves). (TJSC - AP n. 2006.000886-0, de Mafra, Rel.
Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. em 11/09/2007).
AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – FORNECIMENTO DE REMÉDIO – TUTELA ANTECIPADA – PRESENÇA DOS REQUISITOS INDISPENSÁVEIS" (ART. 273 DO CPC) – DIREITO CONSTITUCIONAL SOCIAL E FUNDAMENTAL – EXEGESE DOS ARTS. 196 DA CF/88 E 153 DA CE –AUSÊNCIA DE VERBA ORÇAMENTÁRIA – IRRELEVÂNCIA – COMINAÇÃO DE MULTA AO ENTE PÚBLICO EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DA
OBRIGAÇÃO – POSSIBILIDADE – RECURSO DESPROVIDO. (TJSC - AI n. 2007.002607-4, de Itapema, Rel. Des. Rui Fortes, j. em 21/08/2007).
Com efeito, considerando a gravidade que pode gerar o descumprimento da decisão agravada, a multa fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), sendo R$ 500,00 (quinhentos reais) para cada secretário é razoável. (TJSC - 2012.015293-5   Agravo de Instrumento. Órgão Julgador CÂMARA CIVIL ESPECIAL) (grifo nosso).  

É essencial aqui a responsabilização pessoal do gestor, pela omissão, porque o problema relacionado à falta de vaga em creche ou pré-escola fere direito fundamental.

Assim, como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que ao ser cominada multa diária ao Município de Palhoça, seja a mesma cobrada pessoalmente do Prefeito Municipal de Palhoça, Ronério Heiderscheidt, diretamente de sua folha de pagamento, para o caso de descumprimento da liminar.

Ademais, o Ministério Público requer ainda, no caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas públicas necessárias e pertencentes ao Município de Palhoça, por meio do Bacenjud, para garantia da educação infantil da criança mencionada, mesmo que em estabelecimento conveniado ou particular.  

O bloqueio de valores é perfeitamente cabível se o Ente Público se opõe a cumprir determinação judicial, ainda que não transitada em julgado, como meio de suprir necessidade urgente.
Neste sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. VIABILIDADE DE CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA CONTRA A FAZENDA PÚBLICA. Existem situações em que os requisitos legais para antecipação de tutela são tão presentes, que o fumus boni juris e o periculum in mora, e até o interesse público, não só recomenda como impõe a concessão de liminar para cumprimento pelo poder público, mesmo sem a sua manifestação prévia. Assim ocorre quando há preponderância de princípios constitucionais, no caso presente o direito à educação. EDUCAÇÃO INFANTIL. VAGA EM CRECHE MUNICIPAL. DIREITO SOCIAL CONSTITUICIONALMENTE GARANTIDO. INTERESSE DOS MENORES. A educação é um direito social, previsto constitucionalmente, que deve ser assegurado com absoluta prioridade em relação às crianças e adolescentes, incumbindo ao poder público a responsabilidade de garantir seus ingressos nas escolas ou creches, independentemente das regras administrativas. IMPOSIÇÃO DE MULTA DIÁRIA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DA ORDEM JUDICIAL. SUBSTITUIÇÃO POR BLOQUEIO DE VALORES PARA ASSEGURAR O CUMPRIMENTO DA DECISÃO. POSSIBILIDADE. O bloqueio de valores apresenta-se como medida menos onerosa do que a imposição da multa diária. Agravo de instrumento provido parcialmente, de plano. (Agravo de Instrumento Nº 70039959424, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luís Dall\'Agnol, Julgado em 22/11/2010) 

APELAÇÃO CÍVEL. AGRAVO RETIDO. ECA. EDUCAÇÃO. VAGA EM ESTABELECIMENTO DE EDUCAÇÃO INFANTIL. DIREITO FUNDAMENTAL DA CRIANÇA À EDUCAÇÃO. A Constituição Federal, em seu art. 208, IV, garante ao infante de até cinco anos o direito à educação, assegurando-lhe o atendimento em creche ou pré-escola. A Lei 9394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação, em seu art. 11, V, atribuiu aos Municípios a competência para garantir a educação infantil. Uma vez negado ou dificultado o acesso à educação infantil, violando, assim direito fundamental subjetivo ao ensino, cabível a intervenção jurisdicional, a fim de garantir a efetividade dos preceitos legais e constitucionais. Alegação de superlotação nas creches e pré-escolas e de incapacidade orçamentária que não restaram comprovadas nos autos. Descabe condenar o Município a pagar honorários ao FADEP, já que o custeio do serviço público prestado pela Defensoria Pública é ônus do Estado. Possível o bloqueio de verbas públicas, ao fim de dar efetividade à ordem judicial de atendimento de vagas na educação infantil. Medida que não se mostra gravosa à sociedade e que garante aos menores o direito fundamental à educação. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70040907354, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/03/2011)

RECURSO DE APELAÇÃO. ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. MUNICÍPIO DE CAXIAS DO SUL. VAGA PARA EDUCAÇÃO INFANTIL - CRECHE. DIREITO À EDUCAÇÃO. GARANTIA FUNDAMENTAL. DIREITO SOCIAL. OBRIGAÇÃO DO MUNICÍPIO EM SENTIDO AMPLO. ARTS. 6º E 208 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 54 DO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. HIPOSSUFICIENCIA COMPROVADA. BLOQUEIO DE VALORES NAS CONTAS DOS ENTES PÚBLICOS. POSSIBILIDADE. CONDENAÇÃO DO ENTE PÚBLICO MUNICIPAL AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS À DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO (FADEP). DESCABIMENTO. 1 - O acesso ao ensino obrigatório e gratuito é um direito público subjetivo (art. 208, § 1º, da CF), sendo que os Municípios devem garantir atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade (art. 208, IV, da CF e art. 54, IV, do ECA, e arts. 4º, IV, e 11, ambos da Lei nº 9.394/96). APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70043032028, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roberto Carvalho Fraga, Julgado em 30/06/2011) 

ECA. APELAÇÃO. PEDIDO DE VAGA EM CRECHE E EM ESTABELECIMENTO PÚBLICO DE ENSINO. DIREITO À EDUCAÇÃO. DEVER DO MUNICÍPIO. BLOQUEIO DE VALORES. CABIMENTO. 1. O Município tem a obrigação de assegurar o acesso das crianças à educação, cumprindo-lhe garantir vagas na rede pública de ensino, próxima da residência dos infantes e, na falta destas, deve proporcionar esse direito na rede privada, às suas expensas . 2. É cabível o bloqueio de valores quando permanece situação de inadimplência imotivada do ente público, pois o objetivo é garantir o célere cumprimento da obrigação de fazer estabelecida na decisão judicial. Recurso desprovido. (SEGREDO DE JUSTIÇA) (Agravo de Instrumento Nº 70043742972, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Sérgio Fernando de Vasconcellos Chaves, Julgado em 24/08/2011) 

Desta forma, as medidas postuladas anteriormente (multa pessoal ao Prefeito Municipal e bloqueio de verbas municipais) têm o condão de garantir a efetividade do provimento jurisdicional.

Saliente-se ser plenamente viável que o Município atenda a aludida determinação no prazo referido, bastando que, acaso não consiga adaptar sua estrutura física no Centro Educacional referido, que conceda a vaga para o infante em creche particular, responsabilizando-se pelas suas mensalidades e outras despesas. 

Registre-se que o Município já deveria há muito ter providenciado tal vaga, pois este Órgão de Execução do Ministério Público está requisitando a mesma desde o mês de novembro de 2011, afigurando-se insustentável que não tenha meios para o seu oferecimento regular.

Por fim, cabe destacar que caso haja descumprimento do preceito judicial, eventual multa aplicada deverá ser destinada ao Fundo Municipal da Infância e Adolescência (FIA).

VIII – DOS REQUERIMENTOS:

Ante todo o exposto, o Ministério Público requer:

1. O recebimento da inicial; 

2. A concessão de liminar inaudita altera pars consistente em ordem judicial de obrigação de fazer, ou seja, que o Município de Palhoça conceda, no prazo de 10 (dez) dias, vaga em período integral no estabelecimento de ensino CEI Ulisses Guimarães à criança Wellington Soares Nunes, nascido em 11 de maio de 2009, residente na Rua Beira Rio, s/n., Bairro Frei Damião, Palhoça/SC, garantindo-se de forma permanente sua educação infantil;

3. Caso não haja possibilidade de concessão de vaga no CEI Ulisses Guimarães, que seja efetuada a matrícula do infante citado em creche particular mais próxima de sua residência, mesmo que não conveniada, às expensas do Município de Palhoça, no prazo de 10 (dez) dias;   

4. A fixação, em caso de não cumprimento da liminar, de multa diária equivalente a R$ 500 (quinhentos reais), a ser descontada diretamente da folha de pagamento do Prefeito Municipal, Ronério Heiderscheidt, revertendo a mesma em favor do Fundo da Infância e Juventude de Palhoça, independentemente das sanções cíveis e penais correspondentes;

5. No caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas públicas, nos valores necessários e pertencentes ao Município de Palhoça (a serem aferidos no momento oportuno), por meio do Bacenjud, para garantia da educação infantil do infante mencionado, mesmo que em estabelecimentos conveniados ou particulares.   

6. A citação do requerido para que, querendo, conteste a ação, na pessoa de seu representante legal; 

7. A produção de todas as provas em direito admitidas, documental, pericial e testemunhal, por intermédio da inquirição das pessoas adiante arroladas;

8. Seja julgado procedente o pedido ao final, mantendo-se a liminar concedida. 

Dá-se à causa, para efeitos fiscais, o valor de R$ 500,00 (quinhentos reais).

Palhoça, 17 de maio de 2012.

AURÉLIO GIACOMELLI DA SILVA
PROMOTOR DE JUSTIÇA

Testemunha:

1. Gizelly Rodrigues – Assistente Social do Ministério Público de Palhoça/SC.