Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Colégio Estadual Governador Ivo Silveira - Problemas sanitários e estruturais - Ação Civil Pública ajuizada contra o Estado de Santa Catarina, com pedido de cominação de multa pessoal


EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAMÍLIA, ÓRFÃOS, SUCESSÕES, INFÂNCIA E JUVENTUDE DE PALHOÇA/SC.   

URGENTE

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por intermédio de seu Órgão de Execução, com fundamento nos artigos 6º, 127, caput, 129, incisos II e III, 205, 206, inciso VII, e 227, todos da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; nos artigos 3º, 4º, 53, 148, inciso IV, 201, incisos V e VIII, 209, 210, inciso I, e 213, todos da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente); na Lei n. 9.394/96 e demais dispositivos pertinentes, vem propor a presente


AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER CUMULADA COM PEDIDO DE LIMINAR,


em desfavor do ESTADO DE SANTA CATARINA, pessoa jurídica de direito público, representado pela Procuradoria Geral do Estado, nos termos do artigo 12, inciso I, do Código de Processo Civil, com sede na Avenida Osmar Cunha, n. 220, CEP.: 88.015-100, Centro, Florianópolis/SC, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:


I - DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO:

Extrai-se da Lei n. 8.069/90 que é competente o Juízo da Infância e Juventude para julgar ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, conforme se depreende da leitura do artigo 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Infere-se ainda da lei antes mencionada que as ações relacionadas à criança e ao adolescente serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo Juízo terá competência absoluta para processar a causa (artigo 209 da Lei n. 8.069/90).

Paralelamente, o Código de Processo Civil (art. 100, inciso IV, alínea 'd'), dispõe taxativamente que é competente o foro do lugar onde a obrigação deve ser satisfeita para a ação em que se lhe exigir o cumprimento.

Portanto, como a presente Ação Civil Pública tem por escopo sanar as irregularidades constatadas em unidade de ensino estadual localizada neste Município de Palhoça/SC, a fixação da competência deve ocorrer neste foro judicial.


II – DA LEGITIMIDADE ATIVA:

Da legislação constitucional e infraconstitucional deflui a legitimação do Ministério Público para a propositura da ação civil pública na defesa dos interesses individuais indisponíveis, difusos e coletivos.

O artigo 127, caput, da Constituição Federal prescreve que: 

"O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis". 

Ademais, o artigo 129, incisos II e III, da Constituição de 1988 dispõe:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: 
[...] 
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia;
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos.

E no tocante à legitimidade do Ministério Público em ajuizar ação civil pública em defesa dos direitos individuais, coletivos ou difusos de crianças e adolescentes, claro é o artigo 201 da Lei n. 8.069/90, que enuncia:

Art. 201. Compete ao Ministério Público: 
[...]
V - promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3º inciso II, da Constituição Federal; 
[...]
VIII - zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis.

Não se olvida, ainda, que a Lei n. 7.347/85, em seu art. 5º, autoriza o Ministério Público a propor ações destinadas à tutela desses interesses em juízo. 

Acerca da legitimidade do Ministério Público, Hugo Nigro Mazzilli leciona que:

[...] Diz o art. 127, caput, da Constituição que o Ministério Público está encarregado da defesa dos interesses sociais e dos individuais indisponíveis. Daí se infere que, quanto aos interesses de caráter social, o Ministério Público os defende todos, e, quanto aos individuais, apenas se indisponíveis. À primeira vista, poderíamos ser tentados a crer que o Ministério Público não poderia defender interesses individuais homogêneos, quando disponíveis; assim, vez ou outra se vê na jurisprudência algum julgado a dizer que o Ministério Público só poderia defender interesses individuais homogêneos se indisponíveis. Essa, porém, é leitura apressada do dispositivo constitucional. Sem dúvida, há absoluta compatibilidade em que o Ministério Público defenda interesses individuais homogêneos, quando indisponíveis. Mas quanto aos interesses individuais homogêneos disponíveis, o Ministério Público também os poderá defender, quando tenham suficiente expressão ou abrangência social, o que lhes conferirá a natureza de interesse social [...] (A defesa dos interesses difusos em juízo. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 107/108).

Assim, denota-se que o Ministério Público detém legitimidade para propor esta ação.


III – DA LEGITIMIDADE PASSIVA:

Por outro lado, inegável que o Estado de Santa Catarina possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente demanda.

Extrai-se da Constituição do Estado de Santa Catarina que:

Art. 161 — A educação, direito de todos, dever do Estado e da família, será promovida e inspirada nos ideais da igualdade, da liberdade, da solidariedade humana, do bem-estar social e da democracia, visando ao pleno exercício da cidadania.
Parágrafo único. A educação prestada pelo Estado atenderá a formação humanística, cultural, técnica e científica da população catarinense.
[...]
Art. 163 — O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de: 
[...]
VI - condições físicas adequadas para o funcionamento das escolas; 

Ademais, é a dicção do artigo 67 da Lei Complementar Estadual n. 170/1998:

Art. 67. As escolas estaduais de educação básica serão instaladas em prédios que se caracterizem por:
I - suficiência das bases físicas, com salas de aula e demais ambientes adequados ao desenvolvimento do processo educativo;
II - adequação de laboratórios, oficinas e demais equipamentos indispensáveis à execução do currículo;
III - adequação das bibliotecas às necessidades de docentes e educandos nos diversos níveis e modalidades de educação e ensino, assegurando a atualização do acervo bibliográfico;
IV - existência de instalações adequadas para educandos com necessidades especiais;
V - ambientes próprios para aulas de educação física e realização de atividades desportivas e recreativas;
VI - oferta de salas de aula que comportem o número de alunos a elas destinado, correspondendo a cada aluno e ao professor áreas não inferiores a 1,30 e 2,50 metros quadrados, respectivamente, excluídas as áreas de circulação interna e as ocupadas por equipamentos didáticos.
VII – ambientes que considerem as culturas e as organizações específicas das culturas indígenas e quilombolas.”

Logo, conclui-se que o Estado demandado possui legitimidade para figurar no polo passivo da presente Ação Civil Pública, porque o Colégio Governador Ivo Silveira, objeto desta demanda, é estadual.

IV - DOS FATOS:

Este Órgão de Execução do Ministério Público instaurou o Inquérito Civil Público n. 06.2013.00004274-0, a fim de apurar eventuais irregularidades no Colégio Estadual Governador Ivo Silveira, localizado neste Município de Palhoça/SC (Portaria - fls. 2/3).

No escopo de elucidar os fatos, foram requisitadas vistorias ao Corpo de Bombeiros Militar de Palhoça e à Vigilância Sanitária (fls. 7/12).

Em seguida, juntou-se neste feito o Ofício n. 78-2ª/10ºBBM, oriundo do Corpo de Bombeiros Militar de Palhoça, informando, em síntese, que a unidade de ensino do vertente caso encontra-se em situação irregular por não atender as Normas de Segurança contra Incêndio (fls. 13/15).

Na sequência, aportou neste procedimento o Ofício n. 058/2013/GVS/SMS de fls. 16/19 e o Relatório Fiscal de fls. 30/31, provenientes da Vigilância Sanitária de Palhoça, noticiando, resumidamente, que o Colégio Estadual Governador Ivo Silveira, que atende aproximadamente 2.000 (dois mil) alunos, apresenta várias irregularidades e não possui alvará sanitário.

Logo, dos laudos e relatórios técnicos denota-se que o colégio do caso em tela apresenta-se em situação irregular, haja vista possuir estrutura física precária, necessitando de uma reforma geral no objetivo de se adequar às normas do Corpo de Bombeiros Militar e da Vigilância Sanitária, garantindo-se, assim, salubridade e segurança às crianças, adolescentes e aos profissionais de tal estabelecimento educacional.

Neste ínterim, foi juntado neste procedimento cópia do Termo de Audiência realizado em Inquérito Civil que tratava de situação irregular de outra escola estadual, no qual o Estado de Santa Catarina, por meio de seus representantes legais, apresentaram questões burocráticas internas para a não celebração de termo de compromisso de ajustamento de conduta proposto pelo Ministério Público, ou seja, não celebraram acordo extrajudicial (fls. 20/22).

E como essas questões administrativas e procrastinatórias não devem se sobrepor à prioridade absoluta e à proteção integral previstas constitucionalmente em prol das crianças e dos adolescentes, bem como diante de que deve ser garantida, com urgência, educação de qualidade em ambiente seguro aos infantes palhocenses, o Ministério Público designou audiência no escopo de averiguar a atual situação do Colégio Estadual Governador Ivo Silveira, notificando para esse ato representantes do Corpo de Bombeiros e da Vigilância Sanitária (fls. 23/29).

Na data aprazada, os representantes do Corpo de Bombeiros Militar e da Vigilância Sanitária de Palhoça, no tocante às inspeções realizadas recentemente na aludida escola, elencaram as seguintes irregularidades:

"SITUAÇÃO DO COLÉGIO ESTADUAL GOVERNADOR IVO SILVEIRA: A seguir, passou-se a verificar a situação da Escola aludida, de acordo com os órgãos técnicos presentes.  A) Corpo de Bombeiros: o Corpo de Bombeiros, por meio de seu representante presente no ato, no tocante ao Relatório de Vistoria de fls. 13/15 e à inspeção realizada recentemente, elencou as seguintes irregularidades, que deverão ser sanadas nos seguintes prazos: 1. Providenciar aprovação de projeto preventivo contra incêndio e atestado de habite-se (prazo – 180 dias); 2. Instalar sistema de proteção contra descarga atmosférica (prazo – 180 dias); 3. Instalar aberturas de ventilação permanente nas cozinhas (prazo – 48 horas); 4. Instalar sistema hidráulico preventivo (prazo – 180 dias); 5. Instalar sistema de iluminação de emergência nos corredores e nas salas de aula (prazo – 48 horas); 6. Instalar sistema preventivo por extintores (prazo – 48 horas);  7. Instalar sistema de abandono de local (placas de saída de emergência (prazo – 48 horas); 8. Instalar sistema de alarme (prazo – 180 dias); 9. Instalar corrimão nas escadas (prazo – 10 dias); 10. Substituir o forro de madeira deteriorado do bloco 03 (prazo – 30 dias); 11. Eliminar as fiações expostas (prazo – 48 horas). Além disso, o representante do Corpo de Bombeiros informou que as cláusulas de n. 3, 5, 6, 7 e 11 são graves e devem ser regularizadas no prazo de 48 horas, sob pena de suspensão das aulas, para segurança das crianças, adolescentes e funcionários. B) Vigilância Sanitária: a Vigilância Sanitária, por meio de seu representante presente no ato, no que se refere ao Relatório de Vistoria de fls. 16/19 e à inspeção realizada recentemente, apontou as seguintes irregularidades, que deverão ser cumpridas nos seguintes prazos: 1. Providenciar a limpeza  e desinfeccção do reservatório d'água, por meio de empresa especializada, com emissão do certificado respectivo (prazo – 10 dias) ; 2. Providenciar a desratização e a desinsetização, através do controle de pragas e vetores urbanos, por meio de empresa especializada, emitindo-se o certificado respectivo (prazo – 10 dias); 3. Manter em perfeitas condições de funcionamento e limpeza todos os vasos sanitários e pias dos sanitários feminino e masculino dos alunos em cumprimento ao número mínimo necessário na relação aluno/pia e aluno/vaso (prazo – 10 dias); 4. Colocar assentos nos vasos sanitários, saco coletor nas lixeiras, sabonete líquido, papel toalha individual nos sanitários masculino e feminino dos alunos (prazo – 10 dias); 5. Retirar e/ou substituir mesas e bancadas que apresentem ferrugem na estrutura da cozinha (prazo – 48 horas); 6. Reparar as luminárias danificadas da cozinha (prazo – 48 horas); 7. Consertar o acionamento por pedal da lixeira da cozinha. 8.  Instalar tela milimétrica fixa nas janelas e móvel tipo "vai e vem" nas portas da cozinha (prazo – 10 dias);  9. Instalar ou substituir todas luminárias com dispositivo de proteção anti-queda de todo o complexo educacional (prazo – 180 dias). 10. Garantir a acessibilidade total na escola (prazo – 90 dias).   11. Providenciar laudo de análise de água (prazo – 90 dias); 12. Providenciar local adequado para guardar os pertences dos funcionários (prazo – 90 dias); 13. Providenciar tampas protetoras para as tomadas (prazo – 48 horas);  14. Reativar o banheiro adaptado para deficientes (prazo – 48 horas); 15. Reformar ou trocar os equipamentos de práticas esportivas que apresentam ferrugem, risco de quebra e desabamento do pátio de recreação e esportes (prazo – 90 dias);  16. Eliminar as infiltrações dos banheiros; 17. Reparar os pisos das salas de aula e dos corredores (prazo – 90 dias); 18. Reformar o laboratório de química e a sala de jogos (prazo – 90 dias); 19. Pintar o teto da biblioteca (prazo – 90 dias); 20.  Providenciar o alvará sanitário (prazo – 180 dias)" (Termo de Audiência – fls. 32/33).

Destarte, das várias irregularidades apontadas acima, percebe-se o evidente descaso do Estado demandado no que se refere à educação das crianças e dos adolescentes residentes nesta Comarca, haja vista estar fornecendo educação em prédio com estrutura que não atende as normas técnicas do Corpo de Bombeiros Militar e da Vigilância Sanitária, cuja regularização precisa ocorrer em prazo exíguo, sob pena de se suspender as aulas e de prejudicar ainda mais o ano letivo das crianças e dos adolescentes desta urbe, que dia a dia estão expostos a situação de risco em instalação sucateada e irregular.

Sobreleva ressaltar que o Estado de Santa Catarina, ao não fornecer estrutura adequada no Centro Educacional acima mencionado, está prejudicando a vida dessas pessoas em desenvolvimento.

Dessa forma, em razão da urgente necessidade de se fazer cessar a violação do direito fundamental à educação, este Órgão de Execução não tem outra alternativa senão a de buscar a tutela jurisdicional para salvaguardar os interesses dos estudantes residentes em Palhoça e que necessitam de educação de qualidade em ambiente adequado e seguro.

Atente-se que aproximadamente 2.000 (dois mil) alunos, sem contar os professores e demais funcionários, estão diariamente expostos a situações de risco devida a falta de estrutura e de segurança no estabelecimento de ensino ora em análise.

Frise-se também que o Corpo de Bombeiros Militar manifestou-se pela suspensão das aulas por segurança das crianças, adolescentes e funcionários caso algumas irregularidades não sejam sanadas com urgência.

Dessa forma, muitos estudantes e funcionários estão correndo risco de morte, o que obviamente vem de encontro aos ditames da legislação de garantias em vigência.

É oportuno destacar que são estas crianças e adolescentes que a própria Constituição Federal denomina "sujeito de direitos". São eles a "prioridade absoluta constitucional", que estão sendo vítimas da omissão do Estado demandado.

Assim sendo, é irrefutável que o Estado de Santa Catarina deve reformar o estabelecimento educacional deste caso, a fim de promover um ambiente propício de educação apto a amparar estas pessoas que são o futuro da nação.

Por tais razões, para que a desídia e a omissão não prosperem, não restam alternativas senão a de buscar a tutela jurisdicional, com o intuito de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais, obrigando o Estado de Santa Catarina a prestar ensino de qualidade aos estudantes palhocenses que frequentam o Colégio Estadual Governador Ivo Silveira.

V - DO DIREITO:

A Constituição da República Federativa de 1988 estabelece em seu art. 6º que:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Ademais, a fim de promover a educação, a Lei Maior assevera que:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. 

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
VII - garantia de padrão de qualidade.

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

Nesse sentido, o Estatuto da Criança e do Adolescente afirma:

Art. 3º A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade. 

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária. 
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:
[...]
c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas; 
d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude.

Art. 53. A criança e o adolescente têm direito à educação, visando ao pleno desenvolvimento de sua pessoa, preparo para o exercício da cidadania e qualificação para o trabalho [...].

Aliás, a Lei n. 9.394/96 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional) dispõe que:

Art. 3º O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
[...]
IX - garantia de padrão de qualidade;

Art. 4º O dever do Estado com educação escolar pública será efetivado mediante a garantia de:
[...]
IX - padrões mínimos de qualidade de ensino, definidos como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos indispensáveis ao desenvolvimento do processo de ensino-aprendizagem.

Logo, denota-se que o Brasil possui uma avançada legislação relacionada às crianças, aos adolescentes e à educação, pois existem os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta, mas que, em situações como a do vertente caso são lamentavelmente menosprezados.

E, acerca da legislação acima citada, insta transcrever o entendimento de Válter Kenji Ishida:

"Pode-se falar conforme acima aludido na existência da doutrina da proteção integral. Para assegurar a mesma, formularam-se princípios menoristas, destacando-se o da prioridade absoluta, o do melhor interesse [...] o princípio da prioridade absoluta possui o status constitucional, com a previsão no art. 227 da Carta Magna. A prioridade absoluta significa primazia, destaque em todas as esferas de interesse, incluindo a esfera judicial, extrajudicial ou administrativa". (Estatuto da Criança e do Adolescente. 12. Ed. São Paulo: Atlas, 2010. págs. 6/7) (grifo nosso).

Nesse diapasão, necessário se faz também mencionar as lições de Munir Cury, et al, acerca dos princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente:

"Não se trata, neste caso, de palavras inúteis, como às vezes se diz das solenes declarações constitucionais. As regras ali enunciadas colocam também algumas normas de caráter imediatamente preceptivo, isto é, às quais todos devem imediata obediência, pois são suficientemente precisas; mas têm importância decisiva também por seu aspecto programático, isto é, aquele que se refere às normas concretas para implementação do programa". (Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado. 10. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. pág. 35). 

Ademais, no que se refere ao direito à educação, previsto na Magna Carta e no Estatuto da Criança e do Adolescente, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, et al, aduz:

"Conceitua-se a educação como sendo o processo de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social. 
O processo educacional visa a integral formação da criança e do adolescente, buscando seu desenvolvimento, seu preparo para o pleno exercício da cidadania e para ingresso no mercado de trabalho (art. 205, CF).
É direito fundamental que permite a instrumentalização dos demais, pois sem conhecimento não há o implemento universal dos direitos fundamentais. A ignorância leva a uma passividade generalizada que impede questionamentos, assegura a manutenção de velhos sistemas violadores das normas que valorizam o ser humano e impede o crescimento do ser humano e o consequente amadurecimento da nação".  (Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 49) (grifou-se). 

Dessa forma, verifica-se que no sistema legal brasileiro estabeleceu-se a primazia em favor das crianças e adolescentes em todas as esferas de interesses.

E como a previsão de absoluta prioridade decorre da Constituição e da Lei Infraconstitucional, não há espaço para ponderações, devendo serem assegurados aos infantes todos os seus direitos elencados na legislação pátria, levando-se em consideração a condição de pessoas em desenvolvimento.

Torna-se claro, assim, o caráter preventivo da doutrina da proteção integral, a qual deve ser efetivada para salvaguardar as crianças e os adolescentes. Do contrário, o texto legal será letra morta.

Consequentemente, caso o réu não observe esses direitos fundamentais, como ocorre no presente caso, torna-se violador das garantias preconizadas tanto na Constituição, como no Estatuto da Criança e do Adolescente.

Cabe destacar que direitos fundamentais são direitos para os quais não se pode admitir desculpas, como dificuldades financeiras. Eles devem ser resguardados independente de qualquer situação.

Deste modo, é dever e obrigação do Estado de Santa Catarina cumprir os direitos fundamentais dos estudantes palhocenses. 

E não se alegue que o estabelecimento de políticas sociais derivadas de normas programáticas situa-se no âmbito do poder discricionário do administrador público, sendo vedado ao Poder Judiciário interferir nos critérios de conveniência e oportunidade.

A autuação do Poder Judiciário nestes casos não interfere de modo algum na independência dos poderes, levando-se em conta a questão dos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente.

Ademais, sabe-se que, na ocorrência de omissão por parte do Poder Público no cumprimento de norma constitucional elevada à categoria de norma fundamental, compete sim ao Poder Judiciário aplicar o direito ao caso concreto.

Diante desse contexto, não há que se falar em desrespeito à autonomia do Poder Executivo por parte do Judiciário. Comungar de tal raciocínio significa simplesmente negar a existência de uma função estatal em face da outra, o que é de todo descabido.

Muito pelo contrário, a espécie em análise não consagra qualquer tipo de desrespeito às autonomias, mas afirma a função jurisdicional em relação a função executiva mal exercida ou não exercida, o que é absolutamente corriqueiro em um Estado Democrático de Direito.

E, conforme afirmado alhures, é possível deduzir do caso em tela que não deve a omissão do administrador prosperar, devendo o Estado cumprir a legislação protetiva, no intuito de evitar prejuízo aos sujeitos do futuro do nosso país.

Nesse diapasão, no tocante à educação, é a judiciosa jurisprudência:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA OBRIGAR O ESTADO A REALIZAR OBRAS EMERGENCIAIS DE REFORMA EM PRÉDIO DE ESCOLA PARA REFORÇAR A SEGURANÇA E ELIMINAR RISCOS PARA OS ALUNOS E DEMAIS USUÁRIOS A SEREM ABRIGADOS PROVISORIAMENTE EM OUTRO LOCAL - OBRIGAÇÃO CONSTITUCIONAL - PRECARIEDADE DAS INSTALAÇÕES E URGÊNCIA NA REPARAÇÃO - POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO - AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - MULTA EM VALOR ADEQUADO - CONSTRUÇÃO DE ÁREA COBERTA PARA EDUCAÇÃO FÍSICA - UTILIDADE NÃO EMERGENCIAL - DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO JUDICIAL NESSA PARTE - RECURSO E REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDOS.
Não ofende o princípio da separação dos poderes a intervenção judicial para compelir os órgãos da administração a cumprir a obrigação constitucional e legal de realizar obras de reforma em prédio de escola estadual, em razão da precariedade das instalações, para reforçar a segurança, eliminar os riscos para alunos e demais usuários e propiciar adequado espaço físico para o desenvolvimento do ensino público de qualidade [...] (TJSC - Processo: 2013.005627-2 (Acórdão). Relator: Jaime Ramos. Origem: Sombrio. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. 
Julgado em: 23/05/2013. Classe: Apelação Cível) (sem grifo no original).

Corrobora:

[...] O direito à educação é um dos mais sagrados direitos sociais, porquanto a própria Constituição lhe confere o "status" de direito público subjetivo, impondo à Administração Pública o encargo de propiciar, com políticas sociais concretas e efetivas, entre outros aspectos, uma estrutura física de qualidade.
Os direitos fundamentais caracterizados por inalienabilidade, irrenunciabilidade e indisponibilidade, não podem ser reduzidos ou obstaculizados por questões de ordem financeira do Poder Público (TJSC - Processo: 2012.017518-4 (Acórdão). Relator: Jaime Ramos. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. Julgado em: 12/07/2012. Classe: Agravo de Instrumento) (grifou-se).

Para arrematar:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. EDUCAÇÃO. REFORMA DE ESCOLA ESTADUAL EM SITUAÇÃO PRECÁRIA. RISCO À SAÚDE E À INCOLUMIDADE FÍSICA DO CORPO DOCENTE E DISCENTE. DEVER DO ESTADO. INOCORRÊNCIA DE MALFERIMENTO AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. CONCESSÃO DE TUTELA ANTECIPADA NA SENTENÇA, POSSIBILIDADE. FLEXIBILIZAÇÃO DO PRAZO PARA CUMPRIMENTO DA DETERMINAÇÃO JUDICIAL COM OPÇÃO PARA A DEMOLIÇÃO DO PRÉDIO, RECOMENDADO POR PARECER TÉCNICO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 
1. Assim como a saúde e a segurança pública (arts. 196 e 144, da CF), a educação é direito de todos e dever do Estado (art. 205 da CF), devendo, pela essencialidade do seu objeto, ser prestada, acima de tudo, de forma eficiente.
Se o Estado não proporciona as condições físicas básicas ao adequado funcionamento das suas escolas, está em falta com seu dever constitucional. 
2. Não há falar em afronta ao princípio da separação dos poderes quando o Judiciário limita-se a determinar ao Estado o cumprimento de mandamento constitucional, impregnado de autônoma força normativa. (TJSC - Processo: 2009.018940-6 (Acórdão). Relator: Newton Janke. Origem: São Francisco do Sul. Órgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Público. Julgado em: 04/10/2011. Classe: Apelação Cível) (grifo nosso).

Assim, conclui-se que caso o gestor público seja relapso e atue com descaso no que se refere aos direitos fundamentais relacionados à criança e ao adolescente, não só permite-se, como também impõe-se a pronta atuação deste Órgão do Ministério Público, assim como do Poder Judiciário, no objetivo de fazer valer os ditames constitucionais e infraconstitucionais.

VI – DA NECESSIDADE DA LIMINAR:

A omissão do Estado de Santa Catarina no que tange às condições do Colégio Estadual Governador Ivo Silveira deve cessar imediatamente, exigindo que esta pretensão seja deferida desde o recebimento da presente inicial.

De outro modo, a postergação do problema vilipendia os direitos de 2.000 (dois mil) estudantes desta Comarca, mais os futuros estudantes que pleitearão suas matrículas para o ano letivo de 2014, sem falar nos professores e demais funcionários que correm risco de morte pela ausência de segurança na escola.

Atente-se que não só a Lei n. 7.347/85, em seu artigo 12, caput, como também o artigo 213, § 1º, da Lei n. 8.069/90, autorizam, mediante a relevância do fundamento da demanda e do justificado receio da ineficácia do provimento final, a concessão de liminar para conceder previamente o direito que se pretende resguardar, senão veja-se:

Do artigo 12, caput, da Lei n. 7.347/85, tem-se que "poderá o juiz conceder mandado liminar, com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo."

E do artigo 213, insculpido na Lei n. 8.069/90, retira-se que:

Art. 213. Na ação que tenha por objeto o cumprimento de obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento. 
§ 1º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citando o réu. 
§ 2º O juiz poderá, na hipótese do parágrafo anterior ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito. 

Sobreleva ressaltar que a verossimilhança, requisito necessário à outorga da decisão liminar, encontra respaldo fático nos próprios fundamentos já narrados, vez que o direito pátrio impõe o direito à educação como fundamental e necessário para a instrumentalização dos demais direitos.

De mais a mais, é por meio da educação que a criança e o adolescente são preparados para o pleno exercício da cidadania.

Ademais, extrai-se da documentação juntada nesta exordial que o estabelecimento de ensino deste caso necessita de uma reforma geral, pois não promove segurança e não possui condições de salubridade aos seus usuários. Frise-se que as providências necessárias relacionadas às exigências do Corpo de Bombeiros e da Vigilância Sanitária devem ser tomadas com urgência.

Registre-se que o justificado receio de ineficácia do provimento final é decorrente não só das perdas irreparáveis acarretadas pela má qualidade do ensino ministrado, haja vista a ausência de estrutura adequada, mas, também, da possibilidade de que os alunos tenham comprometida a integridade física, uma vez que a instituição de ensino encontra-se irregular perante o Corpo de Bombeiros e Vigilância Sanitária, e pelo fato de que a escola pode incendiar e não ter como controlar o fogo por não possuir no estabelecimento os equipamentos preventivos de incêndio necessários para eliminar eventual sinistro, ou, ainda, eventual estudante pode adquirir moléstia em razão do contato com alimentos ou diante do uso de materiais que são manipulados em desacordo com as normas da vigilância sanitária.

Atente-se também que na Audiência de fls. 32/33 o Corpo de Bombeiros Militar manifestou-se pela suspensão das aulas, por segurança das crianças, adolescentes e funcionários, caso algumas irregularidades não sejam sanadas com urgência.

Fica assim demonstrada a plausibilidade do direito invocado e o fundado receio de ineficácia do provimento final, motivo pelo qual a concessão da liminar é medida que se impõe.

E como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que seja cominada multa diária para o caso do Estado não providenciar a reforma geral do Colégio Estadual Governador Ivo Silveira, bem como que sejam bloqueadas verbas públicas.

VII – DO "CONTEMPT OF COURT" E O BLOQUEIO DE VERBAS PÚBLICAS:

Sabe-se que o agente do Estado atua em nome do ente público e é diretamente responsável pela administração.

É sabido também que o ente estatal em si não possui vida, uma vez que é dirigido por gestores.

Assim, o Estado possui comandante que assume a responsabilidade, no período do mandato, de administrar nos termos das leis e de respeitar eventual decisão judicial prolatada em desfavor do ente público. 

Todavia, não raras vezes aquele que ocupa o cargo público, mesmo conhecedor da existência de multa fixada contra o ente público para o caso de descumprimento de decisão judicial, age com irresponsável descaso frente à liminar concedida, pois sabe que os valores sairão dos cofres públicos, ou seja, recai sobre os cidadãos, já que o administrador público não se sensibiliza com o prejuízo e continua a agir ilegalmente.

A imposição de multa para pagamento ao Estado é medida legal, que visa ao cumprimento da decisão. Contudo, como o valor da multa não é suportado pelo agente público, mas sim pelo ente municipal, esta circunstância tem gerado o desrespeito das decisões judiciais, além de duplo prejuízo para a população: primeiro porque o agente público não cumpre com suas obrigações; segundo porque o pagamento da multa é feito com dinheiro público.

Diante do descaso referido, o legislador pretendendo dar plena efetividade aos provimentos judiciais relativos às obrigações de fazer, fez constar no § 5º do artigo 461 do Código de Processo Civil que:

§ 5º Para a efetivação da tutela específica ou obtenção do resultado prático equivalente, poderá o juiz, de ofício ou a requerimento, determinar as medidas necessárias, tais como imposição de multa por tempo de atraso, busca e apreensão, remoção de pessoas e coisas, desfazimento de obras e impedimento de atividade nociva, se necessário com requisição de força policial.

A partir daí novo entendimento doutrinário e jurisprudencial tem sido aplicado e tem permitido melhores resultados, com maior respeito às decisões proferidas.

Inúmeras decisões continuam a fixar a multa, com a diferença de que a mesma deve ser suportada pelo próprio agente público, pois é totalmente descabido ver a multa recair sobre a pessoa jurídica, quando esta depende da manifestação de vontade da pessoa física que exerce a função pública.

Nesse sentido, necessário se faz mencionar o entendimento de Luiz Guilherme Marioni, que leciona:

“Se a pessoa jurídica exterioriza a sua vontade por meio da autoridade pública, é lógico que a multa somente pode lograr o seu objetivo se for imposta diretamente a agente capaz de dar atendimento à decisão jurisdicional”.
"Não há procedência no argumento de que a autoridade pública não pode ser obrigada a pagar a multa derivada de ação em que foi parte apenas a pessoa jurídica. É que essa multa somente poderá ser imposta se a autoridade pública, que exterioriza a vontade da pessoa jurídica, não der atendimento à decisão. Note-se que a multa somente pode ser exigida da própria autoridade que tinha capacidade para atender à decisão – e não a cumpriu. A tese que sustenta que a multa não pode recair sobre a autoridade somente poderia ser aceita se partisse da premissa – completamente absurda – de que o Poder Público pode descumprir decisão jurisdicional em nome do interesse público." (Técnica Processual e Tutela dos Direitos, São Paulo: RT, 2004, p. 661-662)

Ademais, no dizer de Ada Pelegrini Grinover, “Contempt of Court” significa:

“a prática de qualquer ato que tenda a ofender um juiz ou tribunal na administração da justiça, ou a diminuir sua autoridade ou dignidade, incluindo a desobediência a uma ordem” (GRINOVER, Ada Pelegrini, Abuso do processo e resistência às ordens judiciárias: o contempt of court, Marcha, pp 62/69, especialmente, p. 68, ano 2000).

Portanto, objetivando a credibilidade do Poder Judiciário, este instituto deve ser aplicado sempre que decisões judiciais forem desrespeitadas.

Acerca da aplicação da multa em desfavor do gestor, o egrégio Tribunal de Justiça de Santa Catarina, em decisão recente, assim decidiu:

[...] é válido ressaltar que a aplicação de multa no caso de descumprimento da determinação judicial é cabível, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público:
[...]
MULTA DIÁRIA PARA O CASO DE DESCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO FIXADA NA SENTENÇA - FAZENDA PÚBLICA - POSSIBILIDADE. As astreintes podem ser fixadas pelo juiz de ofício, mesmo sendo contra pessoa jurídica de direito público (Fazenda Estadual), que ficará obrigada a suportá-las casos não cumpra a obrigação de fazer no prazo estipulado (Resp. n. 201.378, Min. Fernando Gonçalves). (TJSC - AP n. 2006.000886-0, de Mafra, Rel.Des. Sérgio Roberto Baasch Luz, j. em 11/09/2007). 
Com efeito, considerando a gravidade que pode gerar o descumprimento da decisão agravada, a multa fixada em R$ 1.000,00 (mil reais), sendo R$ 500,00 (quinhentos reais) para cada secretário é razoável. (TJSC - 2012.015293-5   Agravo de Instrumento. Órgão Julgador CÂMARA CIVIL ESPECIAL) (grifo nosso).  

É essencial aqui a responsabilização pessoal do gestor, pela omissão, porque o problema relacionado à falta de estrutura de escola fere direito fundamental.

Assim, como forma de evitar o descumprimento da liminar eventualmente concedida, bem como para dar efetividade ao provimento jurisdicional, requer o Ministério Público que ao ser cominada multa diária ao Estado de Santa Catarina, seja a mesma cobrada pessoalmente do Governador do Estado, Raimundo Colombo, do Secretário de Estado da Educação, Eduardo Deschamps, e do Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis, Clonny Capistrano, diretamente de suas folhas de pagamento, para o caso de descumprimento da liminar.

Ademais, o Ministério Público requer ainda, no caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas públicas do Estado de Santa Catarina no valor necessário à reforma do colégio, por meio do Bacenjud, para garantia da educação.  

O bloqueio de valores é perfeitamente cabível se o ente público se opõe a cumprir determinação judicial, ainda que não transitada em julgado, como meio de suprir necessidade urgente.

Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AGRAVO RETIDO. ECA. EDUCAÇÃO. VAGA EM ESTABELECIMENTO DE EDUCAÇÃO INFANTIL. DIREITO FUNDAMENTAL DA CRIANÇA À EDUCAÇÃO. A Constituição Federal, em seu art. 208, IV, garante ao infante de até cinco anos o direito à educação, assegurando-lhe o atendimento em creche ou pré-escola. A Lei 9394/96, que estabelece as diretrizes e bases da educação, em seu art. 11, V, atribuiu aos Municípios a competência para garantir a educação infantil. Uma vez negado ou dificultado o acesso à educação infantil, violando, assim direito fundamental subjetivo ao ensino, cabível a intervenção jurisdicional, a fim de garantir a efetividade dos preceitos legais e constitucionais. Alegação de superlotação nas creches e pré-escolas e de incapacidade orçamentária que não restaram comprovadas nos autos. Descabe condenar o Município a pagar honorários ao FADEP, já que o custeio do serviço público prestado pela Defensoria Pública é ônus do Estado. Possível o bloqueio de verbas públicas, ao fim de dar efetividade à ordem judicial de atendimento de vagas na educação infantil. Medida que não se mostra gravosa à sociedade e que garante aos menores o direito fundamental à educação. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível Nº 70040907354, Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: André Luiz Planella Villarinho, Julgado em 23/03/2011) (grifou-se).

Desta forma, as medidas postuladas anteriormente (multa pessoal ao Governador e aos Secretários Estaduais de Educação e de Desenvolvimento Regional, bem como o bloqueio de verbas estaduais) têm o condão de garantir a efetividade do provimento jurisdicional.

Por fim, cabe destacar que caso haja descumprimento do preceito judicial, eventual multa aplicada deverá ser destinada ao Fundo Municipal da Infância e Adolescência (FIA de Palhoça).

VIII – DOS REQUERIMENTOS:

Ante todo o exposto, o Ministério Público requer:

1. O recebimento da inicial; 

2. A concessão de liminar inaudita altera pars consistente em ordem judicial de obrigação de fazer, ou seja, que o Estado de Santa Catarina efetue a reforma e a adequação geral do Colégio Estadual Governador Ivo Silveira, localizado nesta Comarca de Palhoça, atendendo às seguintes exigências do Corpo de Bombeiros Militar e da Vigilância Sanitária, sempre de acordo com a legislação vigente (prazos estabelecidos pelos órgãos técnicos):

* No que se refere ao Corpo de Bombeiros Militar: 
2.1. Providenciar aprovação de projeto preventivo contra incêndio e atestado de habite-se (prazo – 180 dias); 

2.2. Instalar sistema de proteção contra descarga atmosférica (prazo – 180 dias); 

2.3. Instalar aberturas de ventilação permanente nas cozinhas (prazo – 48 horas); 

2.4. Instalar sistema hidráulico preventivo (prazo – 180 dias); 

2.5. Instalar sistema de iluminação de emergência nos corredores e nas salas de aula (prazo – 48 horas); 

2.6. Instalar sistema preventivo por extintores (prazo – 48 horas);  

2.7. Instalar sistema de abandono de local (placas de saída de emergência (prazo – 48 horas); 

2.8. Instalar sistema de alarme (prazo – 180 dias); 

2.9. Instalar corrimão nas escadas (prazo – 10 dias); 

2.10. Substituir o forro de madeira deteriorado do bloco 03 (prazo – 30 dias); 

2.11. Eliminar as fiações expostas (prazo – 48 horas);

2.12. Suspender imediatamente as aulas caso as cláusulas de n. 2.3, 2.5, 2.6, 2.7 e 2.11 não sejam regularizadas no prazo de 48 horas, para segurança das crianças, adolescentes e funcionários;

* No tocante à Vigilância Sanitária: 
2.13. Providenciar a limpeza  e desinfeccção do reservatório d'água, por meio de empresa especializada, com emissão do certificado respectivo (prazo – 10 dias); 

2.14. Providenciar a desratização e a desinsetização, através do controle de pragas e vetores urbanos, por meio de empresa especializada, emitindo-se o certificado respectivo (prazo – 10 dias); 

2.15. Manter em perfeitas condições de funcionamento e limpeza todos os vasos sanitários e pias dos sanitários feminino e masculino dos alunos em cumprimento ao número mínimo necessário na relação aluno/pia e aluno/vaso (prazo – 10 dias); 

2.16. Colocar assentos nos vasos sanitários, saco coletor nas lixeiras, sabonete líquido, papel toalha individual nos sanitários masculino e feminino dos alunos (prazo – 10 dias); 

2.17. Retirar e/ou substituir mesas e bancadas que apresentem ferrugem na estrutura da cozinha (prazo – 48 horas); 

2.18. Reparar as luminárias danificadas da cozinha (prazo – 48 horas); 

2.19. Consertar o acionamento por pedal da lixeira da cozinha (prazo – 48 horas); 

2.20.  Instalar tela milimétrica fixa nas janelas e móvel tipo "vai e vem" nas portas da cozinha (prazo – 10 dias);  

2.21. Instalar ou substituir todas luminárias com dispositivo de proteção anti-queda de todo o complexo educacional (prazo – 180 dias);

2.22. Garantir a acessibilidade total na escola (prazo – 90 dias);

2.23. Providenciar laudo de análise de água (prazo – 90 dias); 

2.24. Providenciar local adequado para guardar os pertences dos funcionários (prazo – 90 dias); 

2.25. Providenciar tampas protetoras para as tomadas (prazo – 48 horas);  

2.26. Reativar o banheiro adaptado para deficientes (prazo – 48 horas); 

2.27. Reformar ou trocar os equipamentos de práticas esportivas que apresentam ferrugem, risco de quebra e desabamento do pátio de recreação e esportes (prazo – 90 dias);  

2.28. Eliminar as infiltrações dos banheiros (prazo – 90 dias);   

2.29. Reparar os pisos das salas de aula e dos corredores (prazo – 90 dias); 

2.30. Reformar o laboratório de química e a sala de jogos (prazo – 90 dias); 

2.31. Pintar o teto da biblioteca (prazo – 90 dias); 

2.32.  Providenciar o alvará sanitário (prazo – 180 dias);

3. A fixação, em caso de não cumprimento da liminar, de multa diária equivalente a R$ 3.000,00 (três mil reais), descontando-se R$ 1.000,00 (mil  reais) diretamente da folha de pagamento do Governador do Estado, Raimundo Colombo, R$ 1.000,00 (mil reais) diretamente da folha de pagamento do Secretário de Estado da Educação, Eduardo Deschamps, e R$ 1.000,00 (mil reais) diretamente da folha de pagamento do Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis, Clonny Capistrano, revertendo a quantia total em favor do Fundo da Infância e Juventude de Palhoça, independentemente das sanções cíveis e penais correspondentes;

4. No caso de descumprimento da liminar, o bloqueio das verbas do Estado de Santa Catarina no valor total da reforma a ser executada,  por meio do Bacenjud, para garantia do direito à educação;

5. A citação do requerido para que conteste a ação, na pessoa de seu representante legal; 

6. A notificação do Governador do Estado, do Secretário de Estado da Educação e do Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis;

7. A produção de todas as provas em direito admitidas, documental, pericial e testemunhal, por intermédio da inquirição das pessoas adiante arroladas;

8. Seja julgado procedente o pedido ao final, mantendo-se a liminar concedida. 

Dá-se à causa, para efeitos fiscais, o valor de R$ 1.000,00 (mil reais).

Palhoça, 18 de novembro de 2013.

AURÉLIO GIACOMELLI DA SILVA
PROMOTOR DE JUSTIÇA

ROL DE TESTEMUNHAS:

1. Fernando Ireno Vieira – Tenente do Corpo de Bombeiros Militar de Palhoça;

2. Rodrigo Tenfen Legat – Fiscal da Vigilância Sanitária de Palhoça.

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