O
Superior Tribunal de Justiça (STJ), por meio da Súmula n. 492, definiu que “o ato infracional análogo ao tráfico de
drogas, por si só, não conduz obrigatoriamente à imposição de medida
socioeducativa de internação do adolescente”.
A
súmula se trata em síntese de um enunciado emitido por determinado tribunal sobre ponto
divergente, com o objetivo de se unificar a jurisprudência, evitando-se a
proliferação de recursos, em homenagem à celeridade e economia processuais.
Em
várias comarcas do Brasil, promotores de justiça pedem e diversos juízes de
direito aplicam a internação a adolescentes que cometeram uma ou duas vezes o
ato infracional equiparado ao crime de tráfico ilícito de substâncias
entorpecentes.
Porém,
se for efetuado um estudo sistemático de toda a legislação que rege a matéria, chegaremos
à conclusão de que a súmula do STJ tem total cabimento e veio em boa hora.
Primeiramente,
deve-se ter em mente que a internação se trata de medida socioeducativa
privativa de liberdade de caráter extremo e temporário, que deve ser utilizada apenas nas hipóteses excepcionais previstas em lei.
O
Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 122, determina que a
internação só poderá ser aplicada quando:
I – tratar-se de ato infracional cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; II – por reiteração no cometimento de outras infrações graves; III – por descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta.
No
§ 2º do mesmo artigo, a Lei n. 8.069/1990 ainda ressalva que, mesmo presentes as
hipóteses acima previstas, se outra medida mais branda (semiliberdade,
liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade) for mais adequada
para a correta ressocialização do adolescente, esta deve ser aplicada.
Portanto,
de acordo com os dispositivos antes mencionados e com toda a finalidade legal de
ressocialização (com responsabilização) dos adolescentes em conflito com a lei,
que se tratam de pessoas em pleno desenvolvimento, é que se conclui que a prática da conduta do tráfico ilícito de substâncias entorpecentes por si só não justifica
a internação, a não ser que cometido de forma reiterada com pelo menos mais
duas condutas, devendo ser uma delas efetivamente grave. A este respeito, a gravidade
abstrata do comércio de drogas não deve ser levada em conta.
E
neste cenário, muitos vão alegar acerca da impunidade e sobre a facilidade que
os traficantes terão para “contratar” os adolescentes para o comércio ilegal de
drogas.
Porém,
quando há investimento efetivo nas áreas da saúde (CAPS, NASF, etc), educação
(vagas nas creches e pré-escolas, ensino de qualidade) e assistência social
(estruturação dos CRAS e dos CREAS), a médio e longo prazo o trabalho
multidisciplinar e multisetorial preventivo e ressocializador auxiliará os
adolescentes que tiveram seus direitos violados desde a infância e vieram a se
envolver com o tráfico.
Especialmente
com relação ao CREAS, onde o adolescente em regra cumpre as medidas
socioeducativas em meio aberto (liberdade assistida e prestação de serviços à
comunidade) o investimento deve ser alto, prioritário e permanente, para criação
de equipes multidisciplinares aptas à execução e fiscalização dessas medidas,
sob a égide da Lei n. 12.594/2012 e ao fomento de toda a sociedade sobre a
obrigação de acolhimento desses jovens em conflito com a legislação, que serão sim responsabilizados, mas principalmente orientados.
O
caminho mais fácil e equivocado é o encarceramento, a diminuição da idade
penal, o isolamento e a discriminação.
Ocorre
que esse atalho não edifica o jovem cidadão, mas apenas afasta definitivamente da
sociedade aqueles que dela mais precisam.
Aurélio Giacomelli da Silva
Promotor de Justiça
1ª Promotoria de Justiça de Palhoça
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