Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Escola de Educação Básica João Silveira - Graves problemas estruturais e sanitários - Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público contra o Estado de Santa Catarina - Decisão de antecipação de tutela que determina a imediata INTERDIÇÃO do referido estabelecimento de ensino, proibindo o ingresso de pessoas em seu interior, até que o Estado de Santa Catarina cumpra com as determinações de urgência do Corpo de Bombeiros e da Vigilância Sanitária - Cominação de multa pessoal diária de R$ 1.000,00 ao Governador do Estado de Santa Catarina, ao Secretário de Estado da Educação e ao Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis.



Segue o teor da decisão judicial proferida nesta data.
Leia o teor da ação civil pública clicando aqui

Autos n° 0903050-74.2013.8.24.0045 

DECISÃO INTERLOCUTÓRIA

1. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DE SANTA CATARINA em face do ESTADO DE SANTA CATARINA, visando à reforma e adequação da Escola de Educação Básica João Silveira, localizada nesta Comarca de Palhoça, bem como sua interdição imediata, sob o argumento de que o estabelecimento educacional não apresenta condições de segurança para receber em seu interior alunos, professores e demais pessoas que lá transitam.

Alega o Ministério Público, com supedâneo no Inquérito Civil Público n.º 06.2013.00001816-2, que: a) em vistoria realizada pelo Corpo de Bombeiros, em 28/02/2013, constatou-se que a estrutura física do colégio não atende ao projeto preventivo n.º 22833, razão pela qual o atestado de "habite-se" foi indeferido  (fls. 37/39); b) o laudo de vistoria da Defesa Civil de Palhoça, datado de 08/03/2013, confirmou que existem problemas estruturais nas juntas de dilatação da escola, nos banheiros e no piso de uma sala de aula (fls. 43/44); c) em visita de acompanhamento da Diretoria de Vigilância Sanitária de Palhoça, foram detectadas diversas irregularidades na escola, sendo que o estabelecimento não apresentou alvará sanitário, alvará do Corpo de Bombeiros, certificado de desratização, desinsetização e limpeza de caixa d'água, bem como atestado de saúde dos manipuladores de alimentos (fls. 50/52); d) por meio de matéria jornalística veiculada no "Jornal do Meio-Dia", foi noticiado que a situação da escola é "vergonhosa", sendo que a fiação elétrica está exposta, o teto está desabando, não há água para beber e muitas salas estão desativadas (fl. 59).

Afirma o Parquet, ainda, que buscou incessantemente resolver a problemática enfrentada na escola, propondo ao Governo do Estado a celebração de Termo de Compromisso de Ajustamento de Condutas, que restou não assinado pelo ente governamental por questões burocráticas (fls. 88/89).

Pugna, por fim, pela concessão de liminar inaudita altera pars, obrigando o Estado a promover a reforma e adequação geral da escola, de acordo com as exigências urgentes impostas pelo Corpo de Bombeiros e Vigilância Sanitária, além da interdição do estabelecimento educacional e suspensão imediata das aulas, por segurança das crianças, adolescentes e funcionários. Da mesma forma, requereu a cominação de multa diária destinada ao Governador do Estado, ao Secretário de Estado da Educação e ao Secretário de Estado de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis, para caso de descumprimento da obrigação de fazer imposta.

É o breve relatório.

2. De partida, registro que o Ministério Público tem legitimidade para atuar no polo ativo desta ação, uma vez que o feito envolve a defesa de direitos inerentes à vida, à segurança e à educação de crianças e adolescentes, assim como dos profissionais que atuam na escola.

A propósito, assim decidiu o STF:

“DIREITO ADMINISTRATIVO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO - INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO DE ENSINO - LEGITIMIDADE DA AÇÃO DO ‘PARQUET’ EM PROL DA SEGURANÇA DE PRÉDIO ESCOLAR - ATUAÇÃO AUTORIZADA PELO ECA. - O Ministério Público é parte legítima para o ajuizamento de ação civil pública destinada à defesa de direitos referentes à vida, à segurança e à educação de crianças e adolescentes, bem como das demais pessoas envolvidas no processo de educação. - Provado que o Estado de Minas Gerais não observou as disposições legais relativas à prevenção de incêndios e à segurança necessária à preservação da vida de todos aqueles que se utilizam de prédio escolar, ou seja, dos alunos, professores e demais servidores que ali trabalham, em flagrante ofensa aos princípios da razoabilidade, a ação ministerial não afronta a necessidade de preservação da conveniência e oportunidade administrativas. - Comprovadas inúmeras irregularidades em prédio escolar, através de relatório elaborado pelo Corpo de Bombeiros Militar do Estado de Minas Gerais, deve o réu apresentar ‘Processo de Segurança Contra Incêndio e Pânico para fins de análise pelo Corpo de Bombeiros e a necessária vistoria final para liberação definitiva do estabelecimento’, tão logo a reforma do prédio escolar seja concluída. (eDOC 2, p. 77)" (STF, Recurso Extraordinário com Agravo n.º 725.968/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, j. em 07/12/2012) grifei

3. Da mesma forma, entendo plenamente viável o pedido de obrigação de fazer formulado em face do Estado de Santa Catarina, para fins de obriga-lo a promover a reforma e adequação geral da Escola de Educação Básica João Silveira, localizada nesta Comarca de Palhoça.

E nem há que se falar em eventual afronta ao princípio da separação dos poderes, por intervenção judicial em ações de políticas públicas governamentais, uma vez que o direito à educação é um dever constitucional do Estado, inerente à própria condição do ser humano, merecendo, por isso, plena e irrestrita atuação do Judiciário frente à omissão do Poder Público. Nestes casos, portanto, torna-se imprescindível a intervenção do Judiciário para compelir o Administrador a implementar as necessárias políticas públicas previstas constitucionalmente. 

No mesmo sentido, colho da jurisprudência:

"É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucionalmente previstas, sem que haja ingerência em questão que envolve o poder discricionário do Poder Executivo" (STF, RE 464143 AgR, rel. Min. Ellen Gracie, Segunda Turma, j. em 15-12-2009)

"ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA MOVIDA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA OBRIGAR O ESTADO A REALIZAR OBRAS EMERGENCIAIS DE REFORMA EM PRÉDIO DE ESCOLA PARA REFORÇAR A SEGURANÇA E ELIMINAR RISCOS PARA OS ALUNOS E DEMAIS USUÁRIOS A SEREM ABRIGADOS PROVISORIAMENTE EM OUTRO LOCAL - OBRIGAÇÃO CONSTITUCIONAL - PRECARIEDADE DAS INSTALAÇÕES E URGÊNCIA NA REPARAÇÃO - POSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO - AUSÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - MULTA EM VALOR ADEQUADO - CONSTRUÇÃO DE ÁREA COBERTA PARA EDUCAÇÃO FÍSICA - UTILIDADE NÃO EMERGENCIAL - DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO - IMPOSSIBILIDADE DE INTERVENÇÃO JUDICIAL NESSA PARTE - RECURSO E REMESSA OFICIAL PARCIALMENTE PROVIDOS. Não ofende o princípio da separação dos poderes a intervenção judicial para compelir os órgãos da administração a cumprir a obrigação constitucional e legal de realizar obras de reforma em prédio de escola estadual, em razão da precariedade das instalações, para reforçar a segurança, eliminar os riscos para alunos e demais usuários e propiciar adequado espaço físico para o desenvolvimento do ensino público de qualidade. O mesmo não se pode dizer em relação ao pleito ministerial para que o Estado construa área coberta para educação física, se a obra é útil mas não emergencial, devendo-se respeitar a discricionariedade da administração quanto à conveniência e à oportunidade. O valor da multa aplicada para o caso de não cumprimento da decisão deve ser fixado de maneira a que "o devedor deve sentir ser preferível cumprir a obrigação na forma específica a pagar o alto valor da multa fixado pelo juiz" (Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery), sem todavia servir como instrumento de enriquecimento desarrazoado da parte contrária." (TJSC, Apelação Cível n. 2013.005627-2, de Sombrio, rel. Des. Jaime Ramos, j. em 31/05/2013) grifei

"APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À EDUCAÇÃO. CENTRO EDUCACIONAL EM CONDIÇÕES PRECÁRIAS. PARECER DA DEFESA CIVIL E CORPO DE BOMBEIROS MILITAR DE BRASÍLIA. DIREITO À EDUCAÇÃO. MÍNIMO EXISTENCIAL. DEVER CONSTITUCIONAL DO ESTADO. INOPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL. O ESTADO POSSUI A OBRIGAÇÃO E O DEVER DE IMPLEMENTAR POLÍTICAS PÚBLICAS QUE ASSEGUREM O AMPLO EXERCÍCIO DO DIREITO À EDUCAÇÃO PORQUANTO, ENQUANTO DIREITO FUNDAMENTAL DE SEGUNDA GERAÇÃO, É INERENTE À PRÓPRIA CONDIÇÃO DE SER HUMANO. A DIGNIDADE HUMANA É UM DOS OBJETIVOS PRINCIPAIS DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, NÃO PODENDO OPOR O PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. HAVENDO OMISSÃO DO ADMINISTRADOR NO ATENDIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PREVISTAS CONSTITUCIONALMENTE A EVENTUAL INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO NÃO VIOLA O PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. APELO CONHECIDO E NÃO PROVIDO." (TJDF, Apelação Cível n. 544220420108070001/DF, 6.ª Turma Cível, rel. Des. Ana Maria Duarte Amarante Brito, j. em 27/02/2012) grifei

Feitas estas ponderações de ordem processual, ingresso no exame do pleito liminar.

4. A petição inicial traz em seu bojo pedido de antecipação de tutela.

O instituto da antecipação de tutela tem plena aplicabilidade no âmbito da ação civil pública, em face do que estabelecem os arts. 12 e 19 da Lei 7.347/85; arts. 84, § 4.º e 90 da Lei 8.078/90; e art. 273 do CPC.

Para que um pedido de antecipação de tutela tenha sucesso, deve haver prova inequívoca da verossimilhança das alegações feitas na inicial. Além disso, há que se verificar a existência de receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou caracterização do abuso do direito de defesa.

Examinando os autos, vejo que as alegações feitas na inicial são verossímeis.

É que a situação relatada no Inquérito Civil Público n. 06.2013.00001816-2 (fls. 15/20) é contundente e retrata bem a condição de risco por que vêm passando os alunos e professores daquele estabelecimento educacional.

Assim, conforme denúncia registrada na Ouvidoria do Ministério Público  sob n.º 05.2013.00003331-9, que deu azo à instauração do referido Inquérito Civil:

"A EEB João Silveira – Aririú/Palhoça, funciona em prédio novo desde 2010 sem habite-se. Esteve, inclusive, interditada no ano de 2010, alguns reparos foram feitos, mas ainda está irregular. A escola tem um grande número de alunos, e não sabemos se eles correm risco de vida ou não." (fl. 30)

Após isso, a fim de elucidar o caso em tela, o Parquet requisitou informações à Direção da Escola, à Vigilância Sanitária, ao Corpo de Bombeiros de Palhoça/SC, ao Conselho Municipal de Educação e à Defesa Civil de Palhoça (fls. 31/35).

Em seguida, foi acostado aos autos de Inquérito Civil o Ofício n.º 23-2.ª/10.º BBM, datado de 04/03/2013, oriundo do Corpo de Bombeiros Militar de Palhoça (fl. 35), relatando que:

"Em vistoria realizada em 28 de fevereiro de 2013, na edificação Escola de Educação Básica João Silveira, situada a Avenida Bom Jesus de Nazaré, s/nº, Aririú, Palhoça-SC, pode-se constatar as mesmas alterações elencadas no Relatório de Indeferimento de Vistoria de HABITE-SE, com protocolo nº 8006, realizada no dia 23 de julho de 2010, anexo. Informo, ainda, que o atual Diretor do Colégio, Oleg Muller, no dia da vistoria, 28 de fevereiro de 2013, relatou que somente agora está tendo conhecimento da situação e afirma que nada foi feito até então. Possuem o projeto preventivo contra incêndio aprovado no Corpo de Bombeiros Militar de Santa Catarina, porém, o que se apresenta na estrutura física do Colégio não condiz com o previsto no projeto preventivo de nº 22883, desta forma o Atestado de Habite-se encontra-se indeferido."

Portanto, embora o Corpo de Bombeiros já tivesse determinado, em data de 23/07/2010, uma série de alterações necessárias para a adequação do estabelecimento educacional, verificou-se, em nova vistoria realizada na referida escola, no dia 28/02/2013, que nenhuma das pendências havia sido equacionada, a saber: a) em relação à caixa d'água = concluir a canalização de limpeza metálica até o registro de corte; instalar extintor na caixa d'água; pintar a canalização metálica na cor vermelha; b) em relação ao pavimento térreo = instalar os extintores conforme previsto em projeto; setorizar a central de alarmes; os corrimãos não podem acabar em gancho; realizar a manutenção de corrimãos (soltos); falta viseira nos abrigos de mangueiras; falta de iluminação de emergência nas salas, conforme prevê projeto preventivo; foi observado que vários cabos de descida do para-raio estão soltos (frouxos) e desconectados das hastes; proteger as emendas e conexões do para-raio com silicone; sinalizar os abrigos de corte e medidores de GLP; instalar as placas de sinalização luminosa de "SAÍDA" junto às rotas de fuga, conforme prevê em projeto; alterar no projeto, em caneta vermelha, a localização da cozinha; instalar as AVPs na cozinha, conforme prevê o projeto; c)  em relação à cobertura: falta de captores na cobertura dos para-raios, conforme projeto aprovado; interligar toda massa metálica; d) em relação à central de gás canalizado: instalar as telas de proteção; instalar proteção em concreto abaixo do registro de corte junto à central; instalar estrado de madeira sob os cilindros P-45; substituir a mangueira preta do gás; e) documentos a serem apresentados: laudo do piso das rotas de fugas; laudo de estanqueidade; laudo de iluminação de emergência; laudo de resistência ohmega do para-raio; f) no local foi observado que as paredes e colunas da edificação apresentam várias rachaduras, que devem ser avaliadas por um engenheiro, para veracidade da construção.

Já nos termos do Laudo de Vistoria da Defesa Civil de Palhoça, realizado por Engenheiro da Secretaria Municipal de Planejamento, Habitação e Projetos de Palhoça, datado de 08/03/2013, foi constatado que:

"Existem problemas principalmente nas juntas de dilatações da escola, banheiros e piso de uma sala. Nas juntas de dilatações observa-se que não foi deixado espaço suficiente para a estrutura absorver as tensões de dilatação e compressão. É visível que os pisos das salas foram encostados na juntas sem deixar uma junta diametral ocasionando o deslocamento dos pisos que fazem extrema com a parede onde está a junta. Em outras juntas é possível ver que a mesma foi rebocada toda e está soltando o reboco pela falta de espaço para absorver os esforços e ou o reboco ficou muito próximo e quando a estrutura trabalha soltam-se pedaços do reboco. Em uma das salas o piso dilatado na direção da parede acabou cortando um eletroduto onde passa fiação energizada e solicitei que protegessem imediatamente a mesma. Em dois banheiros o azulejo caiu descolando da base, e as portas das privadas estão com os azulejos soltos e a própria sustentação das portas está caindo, sendo necessário fazerem bases de concreto sem emenda, que possam suportar as portas e receber a colocação dos azulejos com a quantidade adequada de massa para assentamento e o espaçamento correto de rejunte para que os azulejos não voltem a cair. Faz-se necessário a revisão de todas as juntas de dilatação da escola e a reconstituição das juntas que não estiverem exercendo a sua função adequadamente sem interferir no reboco, pisos ou estrutura. No depósito ao lado da sala de vídeo no térreo, o piso interno cedeu soltando-se das laterais. É necessário a quebra, remoção, compactação do solo, revisão das fundações próximas e posterior reconstrução do contrapiso com acabamento de piso na sala. Na entrada da escola existe um prédio antigo que está interditado, estrutura do telhado comprometida, telhas cerâmicas quebradas e com água infiltrando em quantidade na laje, comprometendo a ferragem  consequentemente a estrutura." (fls. 43/44)

Além disso, nos termos do relatório de visita de acompanhamento da Diretoria de Vigilância Sanitária de Palhoça (fls. 50/52), verificou-se que: a) em relação à cozinha = não havia proteção de telas nas aberturas; o lavatório exclusivo para manipuladores de alimentos não estava em uso, pois não havia sabonete líquido e papel toalha; as cozinheiras estavam paramentadas inadequadamente, pois não faziam uso de calçados fechados e não apresentaram atestado de saúde; os equipamentos e utensílios não estavam em bom estado de conservação, já que havia ferrugem nas geladeiras e freezers; no depósito não havia revestimento nas prateleiras, estrados para os produtos e a janela não tinha proteção de tela contra insetos. Não havia local restrito para guarda de utensílios e produtos de limpeza; b) em relação aos banheiros = os banheiros estão separados por sexo e só estão em funcionamento os do piso térreo. Em relação aos demais itens, ou seja, vasos sanitários, não atende a proporção de 1/15 alunos (todos estão sem tampa), alguns estão com as descargas sem funcionar, não existe papel higiênico e as lixeiras não têm saco coletor. Os lavatórios não correspondem a proporção de 1/30 alunos e não havia sabonete líquido e papel toalha. As portas dos boxes estão todas quebradas sem tranca; c) em relação às salas de aula = nas salas de aula foi observado que havia algumas lâmpadas queimadas, portas sem fechadura, fiação elétrica exposta, foi notado também falta de cortina em algumas janelas e tomadas desprotegidas; d) em relação à área de recreação coberta = os corrimãos das rampas de acesso ao piso superior estão soltos; o telhado da área coberta apresenta falha, pois nos dias de chuva escorre água pela parede; na área antiga, que está sendo usada para atividades destinadas às aulas de educação física, fo observado que há muitas falhas no telhado, infiltrações, descascamentos, entulho (material de construção e móveis danificados); e) em relação à área de recreação descoberta = o pátio que é pavimentado estava com uma parte alagada e onde não há pavimentação foi constada falta de limpeza, pois a vegetação está alta; f) o estabelecimento não apresentou Alvará Sanitário, Alvará de Bombeiro, certificado de desratização, desinsetização e limpeza de caixa d'água, bem como atestado de saúde dos manipuladores de alimentos.

Registre-se que, diante do descaso do Poder Público para com o estabelecimento educacional, foi veiculada matéria jornalística no "Jornal do Meio-Dia", noticiando que a situação da escola era "vergonhosa", uma vez que a fiação elétrica estava exposta, o teto desabando, não havia água para beber e muitas salas estariam desativadas (fl. 59).

Outrossim, vejo que por meio do termo de audiência de fls. 88/90, promovida nos autos de Inquérito Civil n. 06.2013.00001816-2, que contou com a presença do Sr. Promotor de Justiça, Sr. Procurador do Estado, Sra. Consultora Jurídica da Secretaria de Estado da Educação, representante do Corpo de Bombeiros e fiscais da Vigilância Sanitária do Município de Palhoça, foi consignado que o Governo do Estado não assinaria o TAC destinado a equacionar os problemas detectados na escola, por conta da inobservância de normas regulamentares internas, conforme disposto no Ofício Gab/PGE n.º 1.635/13 de fls. 81.

Na oportunidade, foi confirmado pelo representante do Corpo de Bombeiros que algumas das irregularidades constatadas por meio dos relatórios de vistoria realizados na escola são graves e devem ser sanadas imediatamente. São elas: "1) Redimensionar e instalar o sistema de proteção por extintores; 2) Adequar o corrimão da rampa de acesso ao segundo pavimento; 3) Efetuar a manutenção e a instalação do sistema de iluminação de emergência, conforme projeto; 4) Instalar sistema de abandono de local, conforme projeto; 5) Instalar as Aberturas de Ventilação Permanentes na cozinha; 6) Substituir a mangueira do gás; 7) Fazer a manutenção do telhado das salas que são utilizadas como depósitos." O representante do Corpo de Bombeiros informou, ainda, "que as aulas da Escola deverão ser suspensas por segurança das crianças, adolescentes e funcionários, até que as cláusulas antes citadas (1 a 7) sejam cumpridas." (fl. 89)

Da mesma forma, os fiscais da Vigilância Sanitária certificaram que algumas das irregularidades constatadas por meio dos relatórios de vistoria realizados na escola são graves e devem ser sanadas imediatamente. São elas: "1) Providenciar sabonete líquido e papel toalha para que seja utilizado o lavatório exclusivo para os manipuladores de alimentos; 2) Providenciar que as cozinheiras apresentem atestado de saúde; 3) Providenciar que todos os banheiros estejam aptos para utilização; 4) Providenciar tampas para todos os vasos sanitários; 5) Reparar as descargas dos banheiros; 6) Providenciar papel higiênico para os banheiros; 7) Providenciar saco coletor para as lixeiras dos banheiros; 8) Providenciar sabonete líquido e papel toalha para os lavatórios dos banheiros; 9) Providenciar a substituição das portas quebradas, bem como a colocação de trancas nos banheiros; 10) Eliminar a fiação elétrica exposta; 11) Providenciar protetores para as tomadas; 12) Providenciar acesso a uma das caixas d'água para que se possibilite a sua limpeza." Os fiscais da Vigilância Sanitária também informaram "que as aulas da Escola deverão ser suspensas até que sejam sanadas as irregularidades constantes dos itens de n. 3 a 9, referentes à situação dos banheiros da escola." (fl. 89)

Diante deste cenário, e em virtude da gravidade do caso, entendo que meras questões burocráticas da Administração Pública não podem servir de obstáculo para a efetivação do direito fundamental à educação das cerca de 1.245 crianças e adolescentes que estudam naquela instituição (fl. 50) e que encontram-se em situação de iminente perigo.

Não fosse isso, impende destacar que, nos termos do art. 163, VI, da Constituição do Estado de Santa Catarina, "o dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de condições físicas adequadas para o funcionamento das escolas."

Da mesma forma, nos termos do art. 67 da Lei Complementar Estadual n.º 170/1998, que dispõe sobre o sistema estadual de educação:

"Art. 67. As escolas estaduais de educação básica serão instaladas em prédios que se caracterizem por:
I - suficiência das bases físicas, com salas de aula e demais ambientes adequados ao desenvolvimento do processo educativo;
II - adequação de laboratórios, oficinas e demais equipamentos indispensáveis à execução do currículo;
III - adequação das bibliotecas às necessidades de docentes e educandos nos diversos níveis e modalidades de educação e ensino, assegurando a atualização do acervo bibliográfico;
IV - existência de instalações adequadas para educandos com necessidades especiais;
V - ambientes próprios para aulas de educação física e realização de atividades desportivas e recreativas;
VI - oferta de salas de aula que comportem o número de alunos a elas destinado, correspondendo a cada aluno e ao professor áreas não inferiores a 1,30 e 2,50 metros quadrados, respectivamente, excluídas as áreas de circulação interna e as ocupadas por equipamentos didáticos.

Por isso, caberia ao Estado promover as reformas e adequações necessárias, garantindo aos alunos e profissionais daquela instituição um ambiente propício para as atividades educacionais, ou, no mínimo, diante da urgência do caso (cujas pendências foram constatadas já no ano de 2010), ter procurado outras alternativas para equacionar momentaneamente a situação, até o término das reformas e adequações, o que, de fato, não ocorreu.

Justo, portanto, que o pleito de antecipação de tutela articulado pelo Ministério Público seja acolhido. 

5. Além disso, estou deferindo o pedido de antecipação de tutela, sem a prévia oitiva do Estado de Santa Catarina, porque entendo que o caso sob exame é excepcional. A omissão  de  que  trato  aqui é gravíssima, pois  vem  acarretando a  violação de direito fundamental e indisponível de cerca de 1.245 de crianças e jovens matriculados naquela instituição.

Sobre a possibilidade de deferimento de liminar em ação civil pública, sem prévia oitiva do ente público, vale conferir o seguinte precedente:

"ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CONCESSÃO DE LIMINAR SEM OITIVA DO PODER PÚBLICO. ART. 2° DA LEI 8.437/1992. AUSÊNCIA DE NULIDADE. 1. O STJ, em casos excepcionais, tem mitigado a regra esboçada no art. 2.º da Lei 8437/1992, aceitando a concessão da Antecipação de Tutela sem a oitiva do poder público quando presentes os requisitos legais para conceder medida liminar em Ação Civil Pública. 2. No caso dos autos, não ficou comprovado qualquer prejuízo ao agravante advindo do fato de não ter sido ouvido previamente quando da concessão da medida liminar. 3. Agravo Regimental não provido." (STJ, AgRg no AI 1.314.453/RS, rel. Min. Herman Benjamin, j. em 21.09.2010) 

O argumento da irreversibilidade também não pode obstar o deferimento da antecipação de tutela buscada pelo Ministério Público. Como bem destacou o Desembargador Jaime Ramos, membro do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, por ocasião do julgamento do Agravo de Instrumento n. 2011.039816-7, "a legislação que rege a matéria deve ser interpretada sob a ótica da proporcionalidade no sentido da possibilidade da concessão da tutela antecipada, ainda que irreversível a medida, quando for absolutamente necessário obrigar o Poder Público a satisfazer, de modo excepcional, obrigação de proporcionar à população os direitos básicos assegurados na Carta Magna". 

6. Com estas considerações, sendo verossímeis as alegações feitas pelo Ministério Público e estando em risco a vida e a saúde dos frequentadores da Escola de Educação Básica João Silveira, estou em antecipar os efeitos da tutela (art. 273 do CPC), para DETERMINAR a imediata INTERDIÇÃO do referido estabelecimento de ensino, proibindo o ingresso de pessoas em seu interior, até que o Estado de Santa Catarina cumpra com as determinações de urgência do Corpos de Bombeiros e da Vigilância Sanitária descritas nos itens "2.1" à "2.7" e "2.10" à "2.21" de fls. 23/25.

Em consequência disso, ORDENO a suspensão das aulas que seriam ministradas lá, pelo prazo de 15 dias, a contar da data de 31 de outubro de 2013.

Dentro desta quinzena, DETERMINO que o réu providencie o remanejamento dos alunos da Escola de Educação Básica João Silveira para outras escolas próximas, ou disponibilize novo espaço para acomodá-los, a fim de que possam ter seu direito à educação devidamente atendido, conforme assegurado pela Constituição Federal de 1988 e pelo ECA.

CUMPRA-SE esta decisão, procedendo-se à INTERDIÇÃO da escola, antes do início das aulas do período matutino, na data de 31 de outubro de 2013.

Fica o Sr. Meirinho autorizado a valer-se de força policial, se entender necessário, para cumprir esta decisão.

7. Da mesma forma, DEFIRO o pedido de antecipação de tutela descrito nos itens "2.9" de fl. 24 e "2.23" de fl. 25, devendo o Estado de Santa Catarina providenciar atestado de habite-se da escola, no prazo de 60 (sessenta) dias, e alvará sanitário, no prazo de 15 dias.

8. Considerando que esta decisão estabelece para o réu obrigação de fazer, nada impede que seja fixada multa cominatória para coagir o Governo do Estado a cumpri-la. Tal multa encontra respaldo nos arts. 287 e 461 do CPC, bem como no art. 11 da Lei 7.347/85.

Definindo o alcance do art. 11 da Lei 7.347/85, o Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que a multa "(...) pode ser direcionada não apenas ao ente estatal, mas também pessoalmente às autoridades e aos agentes responsáveis pelo cumprimento das determinações judiciais" (STJ, REsp 1111562/RN, rel. Min. Castro Meira, j. em 25.08.2009). A única exigência que se faz, para que a multa seja destinada às autoridades responsáveis pelo adimplemento da obrigação de fazer, é que as mesmas sejam notificadas, de alguma forma, para se manifestarem nos autos, de maneira que possam exercer os direitos ao contraditório e à ampla defesa. 

No bojo do acórdão lavrado nos Edcl no REsp 1111562/RN, o Ministro Castro Meira deixou consignado que essa notificação da autoridade deve ser realizada antes da tomada da decisão liminar. Neste ponto, peço vênia para discordar. Se o próprio STJ entende que em casos excepcionais a liminar na ação civil pública pode ser deferida sem a oitiva da parte contrária, não vejo problema em estabelecer a multa cominatória destinada à autoridade pública inaudita altera pars. Como bem ponderado pelo Desembargador do TJSC, Luiz Cézar Medeiros, no voto proferido no Agravo de Instrumento n. 2011.006614-3, "nada impede que a autoridade pública venha posteriormente aos autos comunicar ao Juízo a existência de situação excepcional impeditiva da obediência do comando judicial, no interregno nele fixado, sem afrontar, por conseguinte, os seu direito ao contraditório e à ampla defesa".

Ressalto que, em casos de obrigação de fazer semelhantes a este, o TJSC tem autorizado a aplicação da multa cominatória destinada ao agente público responsável pelo cumprimento da obrigação:

"APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - REFORMA DE ESCOLA ESTADUAL - PRECARIEDADE VERIFICADA - RISCO À SAÚDE E À INCOLUMIDADE FÍSICA DOS ALUNOS E PROFESSORES - DEVER DO ESTADO - INOCORRÊNCIA DE OFENSA AOS PRINCÍPIOS DA SEPARAÇÃO DOS PODERES - PEDIDO JURIDICAMENTE POSSÍVEL - DILAÇÃO DO PRAZO PARA A CONCLUSÃO DAS OBRAS - FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA EM CASO DE DESCUMPRIMENTO DO COMANDO JUDICIAL - POSSIBILIDADE AINDA QUE EM FACE DE ENTE PÚBLICO - MATÉRIA PACIFICADA NO STJ - VALOR EXCESSIVO - DESPROPORCIONALIDADE VERIFICADA - POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO - ART. 461, § 6º, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
'Assim como a saúde e a segurança pública (arts. 196 e 144, da CF), a educação é direito de todos e dever do Estado (art. 205 da CF), devendo, pela essencialidade do seu objeto, ser prestada, acima de tudo, de forma eficiente. Se o Estado não proporciona as condições físicas básicas ao adequado funcionamento das suas escolas, está em falta com seu dever constitucional. Não há falar em afronta ao princípio da separação dos poderes quando o Judiciário limita-se a determinar ao Estado o cumprimento de mandamento constitucional, impregnado de autônoma força normativa'. (TJSC - AC n. 2009.018940-6 - Rel. Des. Newton Janke)
'O entendimento do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de ser possível ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, fixar multa diária cominatória - astreintes -, ainda que seja contra a Fazenda Pública, em caso de descumprimento de obrigação de fazer. Agravo regimental improvido'. (STJ - 2ª T. - AgRg no AREsp 7869 / RS - Rel. Min. Humberto Martins) 
'A ratio essendi da norma é desestimular a inércia injustificada do sujeito passivo em cumprir a determinação do juízo, mas sem se converter em fonte de enriquecimento do autor/exequente. Por isso que a aplicação das astreintes deve nortear-se pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade.' (STJ - REsp 1112862/GO - rel. Min. Humberto Martins, j. 13-4-2011, DJe 4-5-2011)." (TJSC, Apelação Cível n. 2009.047084-0, de São Francisco do Sul, rel. Des. Cid Goulart, j. em 30/11/2011) grifei

Isto posto, FIXO multa cominatória no patamar de R$ 3.000,00 (três mil reais), por cada dia de atraso (R$ 1.000,00 para cada uma das autoridades), destinada ao Governador do Estado de Santa Catarina, Sr. Raimundo Colombo, ao Secretário de Estado da Educação, Sr. Eduardo Deschamps e ao Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis, Sr. Clonny Capistrano, a fim de persuadi-los  a  tomar as providências  necessárias no sentido de cumprir os itens "6" e "7" desta decisão.

9. CITE-SE o réu, na pessoa do Procurador Geral do Estado de Santa Catarina (art. 12, I, do CPC), para, se desejar, ofertar defesa, no prazo legal (art. 297 c/c art. 188 do CPC).

10. NOTIFIQUE-SE, pessoalmente, o Governador do Estado, Sr. Raimundo Colombo, o Secretário de Estado da Educação, Sr. Eduardo Deschamps e o Secretário de Desenvolvimento Regional da Grande Florianópolis, Sr. Clonny Capistrano para, se desejarem, apresentar defesa, na condição de terceiros interessados, no mesmo prazo estabelecido no item "9" acima.

Cumpra-se e intimem-se, COM URGÊNCIA.

Palhoça/SC, 30 de outubro de 2013.

Cíntia Ranzi Arnt
Juíza Substituta

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