Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




segunda-feira, 7 de janeiro de 2013

Gratuidade no Ensino Público - Expedidas recomendações a todos os estabelecimentos de ensino de Palhoça



Essas recomendações se tratam de orientações extrajudiciais e administrativas que o Ministério Público deve expedir para que os direitos fundamentais previstos na Constituição Federal sejam garantidos.

Assim, nesses documentos, todos os responsáveis pelos estabelecimentos de ensino de Palhoça (públicos e conveniados com o Poder Público) foram orientados que:

1. não exijam, não solicitem e não recebam mensalidades e taxas de matrícula dos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes;

2. não exijam e não solicitem o pagamento de prestações em favor da Associação dos Pais e Professores (APP's) ou de Centro Comunitário como condição para a efetivação da matrícula e como condição para frequentar o estabelecimento mantido pelo Poder Público; 

3. não exijam e não solicitem comprovantes de renda dos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes que estão pleiteando vagas, como condição para a efetivação da matrícula e como condição para frequentar o estabelecimento mantido pelo Poder Público;

4. Não efetuem qualquer restrição pedagógica às crianças e aos adolescentes que frequentam os estabelecimentos de ensino e não pagam "mensalidades" ou "taxas de matrícula";

5. Observem, respeitem e cumpram o direito da gratuidade do ensino público;

6. Fixem as Recomendações em locais visíveis das instituições de ensino, a fim de que seja dada ampla publicidade aos itens aqui recomendados.

Segue o texto integral de uma das 83 recomendações expedidas:





IC - Inquérito Civil n. 06.2012.00011407-0

RECOMENDAÇÃO

Objeto: recomendação no que se refere à cobrança de mensalidades e taxas de matrículas, bem como ao pagamento de prestações às Associações dos Pais e Professores (APP's) e/ou aos Centros Comunitários e à apresentação de comprovante de renda como condição para que crianças e adolescentes tenham acesso ao ensino público gratuito.

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por meio deste Órgão de Execução, no uso de suas atribuições, com fulcro no art. 201, inciso VIII, da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente), que confere ao Ministério Público a função institucional de zelar pelo efetivo respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, podendo, para tanto, expedir recomendações visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública afetos à criança e ao adolescente (art. 201, § 5º, alínea “c”, do mesmo Diploma Legal), e; 

CONSIDERANDO que é dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (art. 227, caput, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO que a criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade (art. 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente);

CONSIDERANDO que é dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária (art. 4º, caput, da Lei n. 8.069/90);

CONSIDERANDO que a educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho (art. 205 da Lei Maior);

CONSIDERANDO que o ensino será ministrado com base no princípio da gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (art. 206, inciso IV, da Constituição Federal);

CONSIDERANDO que é dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente ensino fundamental, obrigatório e gratuito, inclusive para os que a ele não tiveram acesso na idade própria (art. 54, inciso I, da Lei n. 8.069/90);

CONSIDERANDO que a Constituição do Estado de Santa Catarina prevê que o ensino será ministrado com base no princípio da gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (art. 162, inciso V); 

CONSIDERANDO que, no mesmo sentido, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional dispõe que o ensino será ministrado com base no princípio da gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais (art. 3º, inciso VI, da Lei n. 9.394/96);

CONSIDERANDO que o direito à educação "é direito fundamental que permite a instrumentalização dos demais, pois sem conhecimento não há o implemento universal dos direitos fundamentais. A ignorância leva a uma passividade generalizada que impede questionamentos, assegura a manutenção de velhos sistemas violadores das normas que valorizam o ser humano e impede o crescimento do ser humano e o consequente amadurecimento da nação".  (Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade Maciel, et al. Curso de Direito da Criança e do Adolescente. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2010. p. 49); 

CONSIDERANDO que "o texto constitucional, além de proclamar a universalidade do direito à educação, consagra a opção pelo ensino fundamental, que deverá ser obrigatório e gratuito" (MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 28. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 869) (grifou-se);

CONSIDERANDO  que "o princípio da gratuidade do ensino público, insculpido no art. 206, VI, da CF, não possui aplicação restrita ao nível fundamental ou médio, irradiando sua força normativa por todos os graus de ensino, inclusive o superior (graduação)" (STJ - AREsp 258166. Relator Ministro CASTRO MEIRA. Data da Publicação 21/11/2012) (sem grifo no original);

CONSIDERANDO que "a cobrança de mensalidades escolares, por instituição de ensino de direito público, afronta o princípio da gratuidade previsto na Constituição Federal (art. 206, IV), reeditado pela Constituição Estadual (art. 162, V) e pela Lei n. 9.394/96 (art. 3º, VI), alcançando não somente os cursos presenciais, como também os ministrados à distância" (TJSC - Processo: 2010.068174-6 (Acórdão). Relator: Sônia Maria Schmitz. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. Julgado em: 22/11/2012) (grifo nosso); 

CONSIDERANDO ainda o seguinte julgado do Tribunal de Justiça de Santa Catarina: 

"INSTITUIÇÃO EDUCACIONAL DE DIREITO PÚBLICO. CONVÊNIO COM MUNICÍPIO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA.
Celebrado convênio entre Instituição Pública de Ensino e Município para a execução de curso de graduação à distância, respondem estes solidariamente em casos de questionamento acerca da legitimidade da exigência de pagamento de mensalidade escolar, consoante enunciado da Súmula n. 20 deste Tribunal de Justiça.
FUNDAÇÃO EDUCACIONAL DE DIREITO PÚBLICO. COBRANÇA DE MENSALIDADES. ENSINO SUPERIOR À DISTÂNCIA.
A cobrança de mensalidades escolares, por instituição de ensino de direito público, afronta o princípio da gratuidade previsto na Constituição Federal (art. 206, IV), reeditado pela Constituição Estadual (art. 162, V) e pela Lei n. 9.394/96 (art. 3º, VI), alcançando não somente os cursos presenciais, como também os ministrados à distância" (TJSC - Processo: 2012.014251-8 (Acórdão). Relatora: Sônia Maria Schmitz. Órgão Julgador: Quarta Câmara de Direito Público. Julgado em: 19/04/2012) (sem grifo no original).

CONSIDERANDO que aportaram nesta Promotoria de Justiça informações de que escolas públicas e centros educacionais infantis localizados nesta Comarca, que são conveniados com o Município de Palhoça, ou seja, recebem verbas públicas municipais para o pagamento das despesas com a educação, estão solicitando, recebendo e até exigindo mensalidades, taxas de matrículas, bem como estão exigindo o pagamento de prestações em favor da Associação de Pais e Professores (APP's) e do Centro Comunitário e a apresentação de comprovante de renda familiar como condição para a efetivação da matrícula e para frequentar o estabelecimento de ensino mantido pelo Poder Público; 

CONSIDERANDO que o Código Penal prevê como crime contra a administração pública:

Concussão: Art. 316 - Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida:
Pena - reclusão, de dois a oito anos, e multa.

Corrupção passiva: Art. 317 - Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.

CONSIDERANDO ainda que o Código Penal conceitua funcionário público:

Funcionário público: Art. 327 - Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública.
§ 1º - Equipara-se a funcionário público quem exerce cargo, emprego ou função em entidade paraestatal, e quem trabalha para empresa prestadora de serviço contratada ou conveniada para a execução de atividade típica da Administração Pública.      
§ 2º - A pena será aumentada da terça parte quando os autores dos crimes previstos neste Capítulo forem ocupantes de cargos em comissão ou de função de direção ou assessoramento de órgão da administração direta, sociedade de economia mista, empresa pública ou fundação instituída pelo poder público.

CONSIDERANDO que em razão das irregularidades acima mencionadas este Órgão de Execução do Ministério Público instaurou Inquérito Civil, individualmente para cada estabelecimento de ensino localizado neste Município de Palhoça/SC, no escopo de salvaguardar o direito à educação gratuita, em estabelecimento público ou conveniado, dos infantes palhocenses; 

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por seu Promotor de Justiça da Infância e Juventude, adiante assinado, RESOLVE

RECOMENDAR ao Sr.(a) responsável pelo CENTRO EDUCACIONAL INFANTIL PROFESSORA INÊS MARTA DA SILVA, localizado neste Município e Comarca de Palhoça, que:

1. Não exija, não solicite e não receba mensalidades e taxas de matrícula dos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes;

2. Não exija e não solicite o pagamento de prestações em favor da Associação dos Pais e Professores (APP's) ou de Centro Comunitário como condição para a efetivação da matrícula e como condição para frequentar o aludido estabelecimento mantido pelo Poder Público; 

3. Não exija e não solicite comprovante de renda dos pais ou responsáveis pelas crianças e adolescentes que estão pleiteando vaga, como condição para a efetivação da matrícula e como condição para frequentar o aludido estabelecimento mantido pelo Poder Público;

4. Não efetue qualquer restrição pedagógica às crianças e aos adolescentes que frequentam o estabelecimento de ensino;

5. Observe, respeite e cumpra o direito da gratuidade do ensino público;

6. Fixe a presente Recomendação em locais visíveis da instituição de ensino, a fim de que seja dada ampla publicidade aos itens aqui recomendados.

FICA AINDA ESTABELECIDO:

a) O prazo de 10 (dez) dias para o aguardo de resposta quanto ao cumprimento das recomendações empreendidas no presente expediente;

b) A publicação da presente no mural do Ministério Público de Palhoça.

O não cumprimento desta Recomendação acarretará na adoção das medidas judiciais cabíveis, nas esferas administrativa, cível e criminal.

Palhoça, 18 de dezembro de 2012.



AURÉLIO GIACOMELLI DA SILVA
PROMOTOR DE JUSTIÇA




3 comentários:

  1. Excelente essa recomendação feita pelo Promotor. Sendo uma instituição declarada de Utilidade Pública , o próprio título já está lhe conferindo esta obrigação.Sendo assim, os direitos sociais que deveriam ser garantidos pelo poder público, mas que são executados por uma instituição por meio de convênios, não podem e não devem ser cobrados de espécie alguma.Se os recursos do convênio não são suficientes para a instituição prestar o atendimento público e gratuito às crianças em creches e pré-escolas,existem outras ferramentas que poderão ser utilizadas para garantia deste atendimento.

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  2. Haverá alguma fiscalização as Entidades conveniadas ( conselhos comunitários) ? Importante a inclusão dessas Entidades no documento , pois cobram das famílias e este fato é considerado uma "prática normal" realizado por todas.

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  3. Para esclarecimento: foram expedidas recomendações também para as entidades conveniadas e gerenciadas pelos conselhos comunitários de Palhoça.

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