Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Serviço de Acolhimento Institucional de Palhoça - Descumprimento do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta - Execução da multa diária estipulada em favor do Fundo da Infância e Adolescência de Palhoça (FIA)




EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA VARA DA FAMÍLIA, ÓRFÃOS, SUCESSÕES, INFÂNCIA E JUVENTUDE DE PALHOÇA/SC.   

SIG n. 08.2013.00280740-0

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, por intermédio de seu Órgão de Execução, com fundamento no artigo 129, inciso II, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988; nos artigos 148, inciso IV, 209 e 211, todos da Lei n. 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente); nos artigos 475-B, 585, inciso VIII, 730, 731 e 741, todos do Código de Processo Civil; bem como com fulcro no  artigo 5º, § 6º, da Lei n. 7.347/85, vem propor a presente: 

AÇÃO DE EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA 

em desfavor do MUNICÍPIO DE PALHOÇA, pessoa jurídica de direito público, CNPJ 82.892.316/0001-08, com endereço na Avenida Hilza Terezinha Pagani, n. 289, Parque Residencial Pagani, Palhoça/SC, representado pelo Prefeito Camilo Nazareno Pagani Martins, pelas razões de fato e de direito que passa a expor:

I - DA COMPETÊNCIA DO JUÍZO:

Extrai-se da Lei n. 8.069/90 que é competente o Juízo da Infância e Juventude para julgar ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos afetos à criança e ao adolescente, conforme se depreende da leitura do artigo 148, inciso IV, do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Infere-se ainda do Estatuto da Criança e do Adolescente que as ações relacionadas à criança e ao adolescente serão propostas no foro do local onde ocorreu ou deva ocorrer a ação ou omissão, cujo Juízo terá competência absoluta para processar a causa (artigo 209 da Lei n. 8.069/90).

Ademais, a Resolução n. 23/2011-TJ, dispõe que:

Art. 5º Compete privativamente ao Juiz de Direito da Vara da Família, Infância e Juventude, Órfãos e Sucessões da comarca de Palhoça:
I - processar e julgar:
[...]
b) os feitos relativos à infância e juventude (Leis n. 5.624, de 9 de novembro de 1979, e 8.069, de 13 de julho de 1990), inclusive os procedimentos para apuração de ato infracional.

Portanto, como não há dúvida de que o assunto se insere no bojo do Estatuto da Criança e do Adolescente, que, além de outros direitos e garantias, regula as ações decorrentes de responsabilidade por ofensa aos direitos assegurados às crianças e adolescentes, a fixação da competência deve ocorrer neste Juízo da Infância e Juventude de Palhoça/SC.

II – DA LEGITIMIDADE ATIVA:

Da legislação constitucional e infraconstitucional deflui a legitimação do Ministério Público para a propositura desta ação de execução.

O  artigo 129, inciso II, da Constituição de 1988 dispõe:

Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: 
[...] 
II - zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta Constituição, promovendo as medidas necessárias a sua garantia.

Ademais, perlustrando a Lei n. 8.069/90, denota-se que o Ministério Público pode tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, o qual terá eficácia de título executivo extrajudicial (art. 211). 

Nesse passo, o art. 5º, § 6º, da Lei n. 7.347/85 prescreve que "os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial".

Fazendo uso de sua legitimidade, este Órgão de Execução do Ministério Público celebrou Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta com o Município de Palhoça, que não cumpriu cinco cláusulas de um ajuste, conforme será mencionado na sequência, no tópico "dos fatos".

Em razão desse descumprimento, a execução da multa fixada no Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta é medida que se impõe.

Assim, no escopo de executar a medida coercitiva imposta no ajuste promovido por este Órgão de Execução, legalmente legitimado, o ajuizamento deste feito é medida imperativa, a fim de que os direitos das crianças e dos adolescentes palhocenses sejam devidamente salvaguardados.

III – DOS FATOS:

Este Órgão de Execução do Ministério Público e o Município de Palhoça, ora executado, firmaram, no dia 24 de julho de 2013, Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta objetivando regularizar o Serviço de Acolhimento Institucional desta Comarca (fls. 257/271). 

No aludido ajuste, foram fixados prazos para o devido cumprimento das obrigações assumidas por parte da Administração Pública Municipal.

Ocorre que cinco cláusulas do Termo de Ajustamento de Conduta, com prazo de vencimento de 30 (trinta) dias, não foram adimplidas, ou seja, decorreu o prazo estabelecido no título executivo extrajudicial e o Município executado não disponibilizou a estruturação adequada aos Abrigos Institucionais (Cláusulas n. 4, 7, 10, 14 e 15).

Ressalte-se que com o propósito de frustrar o objeto do título executivo extrajudicial aludido, o executado passou a não responder os expedientes oriundos desta 1ª Promotoria de Justiça, ou seja, ficou inerte.

Dessa forma, o Município executado não cumpriu as seguintes obrigações, com prazo de 30 (trinta) dias:

"4. Providenciar (por meio de aquisição/locação ou outra forma, de acordo com a legislação vigente) local com infraestrutura adequada e espaços mínimos sugeridos pela legislação e orientações técnicas vigentes, em área residencial e central, a fim de acolher as crianças e os adolescentes abrigados neste município;

7. Proceder à contratação/nomeação/relotação, nos termos da legislação em vigor, de mais 1 (um) coordenador, 1 (um) psicólogo, 1 (um) assistente social, bem como à contratação/nomeação/relotação de educadores sociais, auxiliares de educadores, cozinheiras e auxiliares de serviços gerais, para o adequado atendimento das crianças e dos adolescentes que serão encaminhados para esta nova sede do abrigo institucional a ser instalada iminentemente neste Município, respeitando, no tocante aos educadores e aos auxiliares destes a seguinte orientação: 1 (um) educador/cuidador, com capacitação específica e experiência em atendimento a crianças e adolescentes, para até 10 (dez) usuários, por turno, devendo a quantidade de profissionais ser aumentada quando houver usuários que demandem atenção específica (1 cuidador para cada 8 usuários, quando houver 1 usuário com demandas específicas e 1 cuidador para 6 usuários, quando houver 2 ou mais usuários com demandas específicas);

10. Observar o número máximo de 20 (vinte) crianças e adolescentes por abrigo institucional);

14. Encaminhar crianças e/ou adolescentes do abrigo institucional misto e/ou do abrigo institucional masculino para o terceiro abrigo institucional que o município está providenciando nesta urbe (cláusula n. 4 deste aditamento), para que seja resolvida a problemática referente à superlotação do serviço de acolhimento, efetuando um estudo detalhado da situação das crianças e adolescentes e de seus respectivos planos individuais de atendimento, para que se verifique com certeza de que a transferência das crianças e/ou adolescentes não lhes acarretará qualquer prejuízo;

15. Nomear novos educadores sociais de acordo com o documento Orientações Técnicas – Serviços de Acolhimento Institucional".

Temos, portanto, de forma nítida, que o Município de Palhoça não prioriza o atendimento à criança e ao adolescente, afrontando diretamente os mandamentos da Constituição Federal e do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Assim, o executado não se empenhou em cumprir a obrigação firmada no Termo de Compromisso de Ajustamento de Condutas antes mencionado, no que se refere ao Serviço Especial de Alta Complexidade de Acolhimento Institucional.

Sobreleva ressaltar que ficou estabelecido no título executivo extrajudicial do vertente caso que "o não cumprimento dos itens ajustados implicará na multa pecuniária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) ao Município de Palhoça a cada dia de descumprimento, reajustado pelo INPC ou índice equivalente, a ser recolhido em favor do FUNDO MUNICIPAL DA INFÂNCIA E JUVENTUDE DE PALHOÇA (FIA), além da execução judicial das obrigações ora ajustadas".

Portanto, como o executado deveria, até o dia 23 de agosto de 2013, providenciar o cumprimento das cláusulas n. 4, 7, 10, 14 e 15, e não o fez, evidencia-se a inadimplência.

Diante de tamanha desídia, verificamos que o Município de Palhoça fechou as portas para a solução consensual, uma vez que o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta é título executivo extrajudicial e impõe ao infrator a obrigação de ajustar a sua conduta às exigências legais, mediante cominações, conforme previsão do artigo 5º, § 6º, da Lei n. 7347/85.

E, como está configurada a inadimplência, fica autorizada a incidência das sanções pertinentes fixadas no título executivo extrajudicial.


IV – MEMÓRIA DISCRIMINADA E ATUALIZADA DO CÁLCULO:

Constata-se que o Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta foi firmado em 24 de julho de 2013.

Ademais, denota-se que foi conferido o prazo de 30 (trinta) dias para cumprir as cláusulas n. 4, 7, 10, 14 e 15, o que não foi feito.

Logo, o prazo expirou no dia 23 de agosto de 2013, devendo ser considerado o termo inicial para o cômputo da multa diária de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), estabelecida no referido ajuste, o dia 24 de agosto de 2013, totalizando, até o momento, 6 (seis) dias de descumprimento.

A seguir, é apresentada memória discriminada, dia a dia, e atualizada do cálculo, nos moldes do art. 475-B do Código de Processo Civil:

Dia 24/08/20135.000,00 (cinco mil reais)Dia 25/08/20135.000,00 (cinco mil reais)Dia 26/08/20135.000,00 (cinco mil reais)Dia 27/08/20135.000,00 (cinco mil reais)Dia 28/08/20135.000,00 (cinco mil reais)Dia 29/08/20135.000,00 (cinco mil reais)
Portanto, a quantia devida pelo executado, até o dia 29 de agosto de 2013, é de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).


V – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS:

Infere-se da literalidade do artigo 585, inciso VIII, do Código de Processo Civil que:

Art. 585.  São títulos executivos extrajudiciais: (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
[...]
VIII - todos os demais títulos a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.

Nesse diapasão, a Lei n. 7.347/1985, que disciplina a ação civil pública, estabelece que os compromissos de ajustamento de condutas possuem eficácia de título executivo extrajudicial, senão veja-se:

Art. 5º  Têm legitimidade para propor a ação principal e a ação cautelar: (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
I - o Ministério Público; (Redação dada pela Lei nº 11.448, de 2007).
[...]
§ 6° Os órgãos públicos legitimados poderão tomar dos interessados compromisso de ajustamento de sua conduta às exigências legais, mediante cominações, que terá eficácia de título executivo extrajudicial.

 Acerca da natureza jurídica do compromisso de ajustamento de conduta, Hugo Nigro Mazzilli leciona que:

"O compromisso de ajustamento de conduta é um título executivo extrajudicial, por meio do qual um órgão público legitimado toma do causador do dano o compromisso de adequar sua conduta às exigências da lei [...] o compromisso de ajustamento de conduta gera um título executivo em favor do grupo lesado, e não em favor do órgão público que o toma. Assim, se necessário, poderá ser executado por qualquer colegitimado à ação civil pública ou coletiva". (A defesa dos interesses difusos em juízo. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 422/423) (sem grifo no original).  

Assim, uma vez verificada a inadimplência, haja vista o não cumprimento, no prazo estipulado, das cláusulas n. 4, 7, 10, 14 e 15 do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta promovido, o Ministério Público pode requerer a execução da multa pecuniária aplicada para o caso de descumprimento.

Nesse diapasão, é a judiciosa jurisprudência:

ADMINISTRATIVO - TERMO DE COMPROMISSO DE AJUSTAMENTO DE CONDUTA - DESCUMPRIMENTO - MINISTÉRIO PÚBLICO - AJUIZAMENTO DE EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - POSSIBILIDADE - EXEGESE DO § 6º DO ART. 5º DA LEI N. 7.347/85
O compromisso de ajustamento de conduta possui eficácia executiva, a teor do disposto no § 6º do art. 5º da Lei n. 7.347/85 e no inc. VIII do art. 585 do Código de Processo Civil. Logo, o descumprimento da obrigação nele contida enseja a propositura de execução por quantia certa no tocante à multa cominatória, não descartada a execução específica da obrigação de fazer ou não fazer. (TJSC - Processo: 2010.012856-7 (Acórdão). Órgão Julgador: Terceira Câmara de Direito Público. Data: 03/08/2010) (grifou-se).

De mais a mais, na presente execução a regra a incidir é a do artigo 730 do Código de Processo Civil que trata da execução por quantia certa para cobrança de crédito quando o devedor é a Fazenda Pública, posto que o termo de compromisso de ajustamento de conduta estipula multa diária pelo descumprimento das responsabilidades assumidas.

Nesse sentido, Fredie Didier Jr., et al, explica que:

"Independentemente de o título ser judicial ou extrajudicial, o procedimento é o mesmo: a Fazenda Pública é, nos termos do art. 730 do CPC, citada para opor embargos. Ao final de todo o procedimento, expede-se o precatório, em atendimento à regra inscrita no art. 100 da Constituição Federal de 1988.
Em outras palavras, não se aplica o regime do cumprimento da sentença na execução contra a Fazenda Pública. Esta não tem o prazo de quinze dias para pagar, sob pena de sujeitar-se a uma multa de 10% sobre o valor devido. Não se aplica, em suma, o disposto no art. 475-J do CPC para a execução proposta em face da Fazenda Pública. O procedimento, não custa repetir, está previsto nos arts. 730 e 731 do CPC.
Embora não se aplique o art. 475-J do CPC à execução proposta em face da Fazenda Pública, as regras da liquidação de sentença - previstas nos arts. 475-A ao 475-H do CPC- são integralmente aplicáveis ao processo em que a Fazenda Pública figure como ré.
Não há qualquer peculiaridade no regime jurídico da Fazenda Pública que afaste a aplicação de tais regras". (Curso de direito processual civil – Execução. vol. 5. Salvador: JusPodivm, 2009. p. 708).  

Aliás, registre-se que é plenamente possível a execução por título extrajudicial em face da Fazenda Pública (Súmula n. 279 do Superior Tribunal de Justiça - "É cabível execução por título extrajudicial contra a Fazenda Pública"). 

Destarte, fica clarividente que diante da patente inadimplência do Município de Palhoça, outra solução não resta se não a presente ação civil executiva por quantia certa.


VI – DOS PEDIDOS:

Ante todo o exposto, este Órgão de Execução do Ministério Público requer:

1. O recebimento e a procedência desta ação;

2. Diante da multa diária estipulada quando do firmamento do termo de compromisso de ajustamento de conduta e levando-se em consideração que o executado encontra-se inadimplente quanto ao cumprimento do assumido (cláusulas n. 4, 7, 10, 14 e 15), incorrendo na sanção pecuniária de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), a citação do Município de Palhoça, por meio de seu representante legal, para opor embargos, revertendo-se, após a procedência da presente pretensão executiva, o mencionado montante em benefício do Fundo Municipal da Infância e da Adolescência (FIA de Palhoça);

3. Que este feito siga na forma do artigo 730 e seguintes do Código de Processo Civil.

4. que sejam determinadas as medidas judiciais necessárias, para a efetiva obtenção do resultado prático da presente execução, nos moldes do § 5º do artigo 461 do Código de Processo Civil; 

Dá-se à causa o valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais).

Palhoça, 29 de agosto de 2013.


Aurélio Giacomelli da Silva
Promotor de Justiça

Um comentário:

  1. Parabéns Sr. Promotor! Continue agindo assim. Ao menos um pouco do dinheiro arrecadado em Palhoça vai para quem realmente precisa: as crianças/adolescentes.

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