Equipe:


Aurélio Giacomelli da Silva - Promotor de Justiça

Letícia Titon Figueira - Assistente de Promotoria

Ana Paula Rodrigues Steimbach - Assistente de Promotoria

Mallu Nunes - Estagiária de Direito

Giovana Lanznaster Cajueiro - Telefonista

Mário Jacinto de Morais Neto - Estagiário de Ensino Médio




quinta-feira, 22 de agosto de 2013

Tribunal de Justiça de Santa Catarina nega provimento de recurso e mantém internação de infante, sob o custeio do Município de Palhoça

Segue a decisão:

Agravo de Instrumento n. ..., de Palhoça
Relator: Des. João Henrique Blasi


AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR. COMANDO JUDICIAL PARA MANTER O INTERNAMENTO DE INFANTE, SOB O CUSTEIO DO MUNICÍPIO AGRAVANTE. POSSIBILIDADE. DECISUM MANTIDO. RECURSO DESPROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. ..., da comarca de Palhoça (Vara da Família Órfãos, Sucessões Inf e Juventude), em que é agravante Município de Palhoça e agravado Ministério Público do Estado de Santa Catarina:

A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, à unanimidade de votos, negar provimento ao recurso. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Desembargadores Nelson Schaefer Martins, que o presidiu, e Cid Goulart.  

Florianópolis, 6 de agosto de 2013

João Henrique Blasi
RELATOR


RELATÓRIO

Município de Palhoça, representado pela Advogada Michele Gastão da Rosa Perdigão, interpôs agravo de instrumento em face de decisão proferida pelo Juiz André Augusto Messias Fonseca, que, em ação de destituição do poder familiar proposta pelo Ministério Público do Estado, representado pelo Promotor Aurélio Giacomelli da Silva, manteve a internação de .... no Centro de Internação ..., a expensas do Município de Palhoça (fl. 20).

Aduz o agravante, axialmente, a responsabilidade do Estado de Santa Catarina pelo custeio de internações psiquiátricas, bem como a falta de previsão para tal desembolso em seu orçamento, requerendo, por isso, que se atribua efeito suspensivo ao agravo e, ao final, que se reforme a decisão increpada (fls. 2 a 12).

O efeito suspensivo almejado restou indeferido pelo Desembargador Rodolfo Tridapalli (fls. 38 a 42).

Houve contrarrazões (fls. 49 a 55).

Lavrou parecer pela o Procurador de Justiça Mário Luiz de Melo, que opinou pelo desprovimento do recurso (fls. 77 a 81)   

É o relatório.

VOTO

É cediço que a Constituição Federal, em seu art. 6º, arrola a saúde como direito social inalienável, reiterando tal proclamação em seu art. 196, adiante transcrito (e reproduzido, por simetria, no art. 153, da Carta barriga-verde):

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Em complemento, o art. 198 da mesma Carta estatui:

 Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único de saúde, organizado de acordo com as seguintes diretrizes:
§ 1°. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes". 
§ 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados [...].

Na esfera infraconstitucional, a Lei Orgânica da Saúde (n. 8.080/ 90), regulamentadora do Sistema Único (SUS), preconiza em seu art. 6º, inc. I, alínea "d", a execução pelos entes federados, de ações de saúde e de assistência terapêutica integral, inclusive farmacêutica, independentemente dos serviços amparados por um ou outro ente, os quais deverão alcançar a finalidade a que se destinam, principalmente, quando a atuação de um é inexistente ou mais limitada que a do outro. 

O art. 7º da mesma Lei ainda determina:

Art. 7º As ações e serviços públicos de saúde e os serviços privados contratados ou conveniados que integram o Sistema Único de Saúde (SUS), são desenvolvidos de acordo com as diretrizes previstas no art. 198 da Constituição Federal, obedecendo ainda aos seguintes princípios:
I - universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de assistência; 
II - integralidade de assistência, entendida como um conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em todos os níveis de complexidade do sistema; 
III - preservação da autonomia das pessoas na defesa de sua integridade física e moral; 
IV - igualdade da assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios de qualquer espécie;

Avulta, então, como indisputável que a execução das ações alusivas ao Sistema Único de Saúde é dever também do Município. 

Pois bem. No caso concreto tem-se que ...., filha de ....., em desfavor de quem foi aforada a ação de destituição do poder familiar, é portadora de retardo mental severo e transtorno comportamental, necessitando, por estar em situação de sofrimento psíquico severo, de internação psiquiátrica voltada à sua proteção e preservação da saúde integral (fls. 13 a 20).

Com efeito, estando patenteada, quantum satis, a necessidade de manter-se a internação da infante no Centro de Internação ..., não há como o réu eximir-se de fazê-lo, dada a sobrelevância de que se reveste o direito à “saúde”.   

Por fim, no que atina com a invocada falta de previsão orçamentária, bem destacou o parecer do Ministério Público:

[...] a alegada ausência de previsão orçamentária não deve servir de entrave ao caso em tela, tornando-se, pois, irrelevante ante o direito à vida, à saúde e a própria dignidade da pessoa humana (art. 1º, inc. III, da CF/1988) a ser assegurado à adolescente.
Mutatis mutandis, é assente a jurisprudência do nosso Tribunal de Justiça de Santa Catarina:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO COMINATÓRIA - ANTECIPAÇÃO DE TUTELA - FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS - DIREITO À SAÚDE - OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA - LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO - PACIENTE COM HIPERTENSÃO ARTERIAL SISTÊMICA E DIABETES MELLITUS TIPO II - COMPROVAÇÃO DA ENFERMIDADE E DA IMPOSSIBILIDADE DE CUSTEAR A MEDICAÇÃO NECESSÁRIA AO SEU TRATAMENTO - AUSÊNCIA DE PREVISÃO ORÇAMENTÁRIA - IRRELEVÂNCIA - PREVALÊNCIA DO DIREITO À VIDA - RECURSO DESPROVIDO.  
"A Constituição Federal de 1988 e as leis infraconstitucionais atribuem à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a obrigação solidária de proporcionar saúde aos necessitados. E, se é solidária a obrigação, pode o autor intentar a ação contra qualquer dos obrigados ou contra alguns deles. Não há que falar, portanto, em ilegitimidade passiva do Município" (Agravo de Instrumento n. 2005.007515-0, rel. Des. Jaime Ramos, j. 2-8-2005).   
"Entre proteger a inviolabilidade do direito à vida, que se qualifica como direito subjetivo inalienável assegurado pela própria Constituição da República (art. 5, caput), ou fazer prevalecer, contra essa prerrogativa fundamental, um interesse financeiro e secundário do Estado, entendo - uma vez configurado esse dilema, que razões de ordem ético-jurídica impõem ao julgador uma só é possível opção: o respeito indeclinável à vida" (PETMC n. 1.246/SC, rel. Min. Celso de Mello, j. 31-1-1997). (Agravo de Instrumento n. 2010.073572-6, de Dionísio Cerqueira, Relator: Des. Cid Goulart, julgado em 24/03/2011).

Assim, inconteste a possibilidade de se exigir do ente público municipal que arque com as expensas decorrentes da internação da adolescente, de modo que a decisão objurgada merece ser mantida. (fls. 79 a 81)

Ante o exposto, voto pelo desprovimento do recurso.

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